O limite de mandatos de meia centena de autarcas do PS, o maior número entre todos os partidos, é uma oportunidade para o PSD, considera Pedro Alves, em entrevista ao ECO/Local Online.
O PS é o maior partido autárquico. O PSD tem vindo a recuperar da derrocada de 2017, quando caiu para 98 câmaras, ao passo que o PS tinha 160. Há quatro anos já aumentaram para 114 câmaras. Qual é a expectativa para 12 de outubro?
A expectativa é ganhar a associação nacional de municípios e a Associação Nacional de Freguesias. Não é só um lugar-comum, é também a oportunidade que temos hoje. Do mesmo modo que o Partido Socialista cresceu desde o período da “troika” até 2017, ou seja, a conjuntura política nacional foi-lhes favorável – vinha de uma maioria de autarquias do PSD. Neste momento, fruto também da limitação de mandatos, haverá um maior número de câmaras a fazer transição e, nesse sentido, haverá também por parte do PSD maiores oportunidades de ganhar câmaras.
O PS saiu fragilizado das legislativas de maio. Se perder a liderança autárquica vai haver uma travessia do deserto?
Não sou analista nem comentador, somos atores políticos, mas não deixo de fazer uma avaliação também daquilo que foi o processo que o PSD passou com todo este período recente do Partido Socialista no poder, com uma maioria autárquica, maioria absoluta e, na altura, também poder na Região Autónoma dos Açores.
O trabalho do PSD foi, primeiro, colocar-se no papel de oposição e perceber que oposição quer ser, que alternativa se quer constituir ao que estava instalado. Desde logo, com a liderança de Luís Montenegro, definiu como prioridade as eleições autárquicas, e pelo meio ainda havia eleições europeias e legislativas. Por isso, o objetivo foi claro, procurar reorganizar o partido ao nível das bases, da proximidade, de forma a poder ter capacidade de uma maior capilaridade em representatividade e também em rede de ação política. Foi esse trabalho que começámos a fazer com o Sentir Portugal, uma semana por mês em cada um dos distritos, visitar todos os concelhos, estar próximo dos autarcas, dos nossos dirigentes e ouvir as pessoas para nos conseguirmos também organizar ao nível da mensagem. O PS estava habituado a ter poder e tem agora de saber fazer e estar na oposição. Em democracia, o papel da oposição é tão relevante como o de quem exerce poder, para se poder constituir como alternativa. O PS, com a rapidez com que quis chegar ao Governo, achava que quanto mais depressa, melhor, quanto mais tempo se cá está, pior é para quem está na oposição… nem sempre é assim.
Se [o PS] voltar a perder espaço e algumas câmaras, tem que fazer esta reflexão e perceber porque é que os portugueses se estão a divorciar da mensagem do Partido Socialista
Está a falar da “geringonça” em 2015, quando o PS não foi o partido mais votado nas legislativas, mas formou Governo?
Sim. Por isso julgo que, neste momento, o Partido Socialista vai estar focado, porque já estava também a preparar as eleições autárquicas. Vai fazer a avaliação do processo eleitoral com a frieza com que tem de o fazer, mas tem que avaliar este passado recente, em que perdeu o poder autónomo dos Açores, perdeu o poder na Câmara de Lisboa, que é a maior autarquia do país. Perdeu poder a nível nacional, é o terceiro partido no Parlamento. Se voltar a perder espaço e algumas câmaras, tem que fazer esta reflexão e perceber porque é que os portugueses se estão a divorciar da mensagem do Partido Socialista. Creio que há capacidade de regeneração por parte do Partido Socialista. É preciso um trabalho mais intenso, mais minucioso, se querem voltar a ser a alternativa que o país possa vir a desejar.
Para o PSD será mais fácil, à partida, com a alavanca governamental? Como o complemento para idosos ou benesses no IRS.
O objetivo não é esse. São propostas que estão no programa eleitoral. Não se suspende a governação porque há eleições. A nossa proposta do IRS já foi chumbada antes deste Governo por parte do Partido Socialista. Hoje, há condições de voltar a colocar em cima da mesa e de ser aprovada. Recuperou-se uma coisa que foi chumbada, mas que foi um compromisso validado pelos portugueses no programa eleitoral. O mesmo acontece com a justiça social, que tem que ser com os pensionistas.
Não há, da parte do Governo, nenhuma responsabilidade no calendário. Quem ditou que houvesse eleições antecipadas foi o Chega e o Partido Socialista. Não se podem queixar. Se se recordar, no PS, com António Costa, havia sempre um aumento extraordinário de pensões em todos os [meses de] Agosto. Todos, todos, todos. Queixam-se do que faziam, só que se calhar agora a situação é mais alargada, é também para pensões médias. Mas o objetivo não é eleitoral nem ninguém vai escolher candidatos à Câmara em função desse reconhecimento que lhes é dado por parte do Governo. Isso não é condição suficiente para se fazer uma escolha. É passar um atestado de incompetência ao eleitor.
O crescimento do Chega não será automaticamente transposto para os resultados autárquicos. As vitórias que teve nos círculos eleitorais, nomeadamente a Sul do Tejo, não serão repercutidas nas eleições autárquicas.
A perda de poder a nível nacional que aponta ao PS é fruto do crescimento do Chega. Estão preparados para perdas a favor do Chega?
Dificilmente iremos perder para o Chega, porque o Chega não tem nada.
O PSD no Algarve não está assim tão certo. Vitória em Albufeira, quase vitória em Faro e Tavira. Só para falar de câmaras PSD. E Faro até tem o presidente em limite de mandatos.
Em primeiro lugar, são eleições diferentes, havia uma mensagem nacional e uma liderança só em escolha. Na prática, é isto que acontece quando estamos em eleições legislativas. E havia uma sensação de insatisfação a nível nacional que se corporizou, parte dela, através de protesto e populismo. Quando um cidadão escolhe quem governa a sua terra, aí a escolha já é diferente. Conta muito também o protagonista ou os protagonistas, os candidatos. Não creio que o que esteja neste momento em apreciação seja uma escolha meramente partidária. O crescimento do Chega não será automaticamente transposto para os resultados autárquicos. As vitórias que teve nos círculos eleitorais, nomeadamente a Sul do Tejo, não serão repercutidas nas eleições autárquicas.
Os movimentos independentes talvez sejam mais capazes de protagonizar alguma insatisfação ou algum cansaço em relação aos partidos tradicionais que outro partido não consegue. Não creio que seja líquido esse crescimento do Chega em função do resultado que tem no Parlamento, mas, naturalmente, é um sinal de que tem, hoje, a sua representatividade. É o segundo maior partido no Parlamento em termos de deputados. Isso não podemos ignorar, mas volto a referir, foi a escolha mais em função da liderança do André Ventura, do que propriamente das propostas em si mesmo em relação à vida de cada uma das comunidades.
Um dos braços direitos de Ventura, Pedro Pinto, é a escolha para Faro, capital da região e onde Rogério Bacalhau atinge limite de mandatos. O candidato promete tornar Faro grande outra vez. E se os farenses aderem?
É esse o lema?!
Sim. “Tornar Faro grande outra vez”…
(risos)
O Cristóvão Norte é um rosto de Faro. Nós [eleitores] vamos escolher pessoas que se identifiquem com o nosso território, não que se aproveitem do nosso território. Ali, penso que é clara a escolha. E se é para tornar Faro grande outra vez, nós temos a certeza de que um dos grandes presidentes de Câmara foi Macário Correia, que está novamente de regresso, neste caso como candidato à Assembleia Municipal, mas com um papel também decisivo e determinante na elaboração do projeto político e na mobilização das pessoas. Creio que fizemos ali uma escolha muito, muito, muito feliz.
Cristóvão Norte é uma pessoa extremamente dinâmica, com uma capacidade de mobilização muito grande, que sente Faro, porque é de Faro, vive Faro como quem lá vive. A escolha e os resultados eleitorais para as legislativas são muito diferentes do que vamos ter para as autárquicas. As pessoas vão saber escolher de forma inteligente aqueles que melhores condições têm.
É das câmaras que mais facilmente tem mudado de presidentes de Câmara. Curiosamente, a estabilidade tem vindo através do PSD, e é porque há uma avaliação positiva do trabalho político dos nossos autarcas e dos projetos políticos do PSD. Por isso, estou certo de que vão querer dar continuidade ao projeto político do PSD, que também foi bom, do Rogério Bacalhau, e que já vinha de Macário Correia e que certamente será continuado por Cristóvão Norte.
Mas quanto a Macário Correia, tal como com Santana Lopes, Isaltino Morais, Fernando Seara, Luís Filipe Menezes, não pode dar ares de um PSD da velha guarda?
Não. Isto é mesclado com uma grande renovação dos quadros, das equipas. Uma coisa é conseguir ter a capacidade de trazer referências como autarcas destas comunidades para poderem continuar a emprestar a sua credibilidade e as suas ideias aos projetos políticos. Para a Assembleia Municipal, Fernando Seara e Macário Correia, pessoas que deixaram marcas positivas na comunidade. Aqueles que ainda conseguem iniciar ciclos com visões inovadoras – como são os casos de Viseu com Fernando Ruas, ou de Santana Lopes, na Figueira da Foz, ou mesmo de Luís Filipe Menezes em Gaia, homens de ação, fazedores -, as comunidades gostam. Não há incapacidade de renovação. Escolhemos aqueles que têm melhores condições para o ato eleitoral e o mandato que vão exercer. A idade não pode ser fator de avaliação de competência, ou de sentido de responsabilidade. Como o género não tem que ser fator. Temos que nos deixar de fazer esta segregação em função da idade, do género, porque acaba por trazer avaliações distorcidas.
Há uma desconfiança muito grande por parte de quem está na sua vida, de dar um contributo na vida pública. […] As pessoas têm receio de ver vasculhada na praça pública a sua vida privada.
Gaia é um caso especial, com um presidente do PS que saiu a meses do limite do mandato porque “usou o carro da Câmara para ir às compras”. Não houve capacidade do PSD para apresentar um rosto novo?
Em Gaia, o processo parte em primeiro lugar de analisar a conjuntura da degradação da gestão em termos autárquicos, que aconteceu neste último mandato do Partido Socialista. Não foi só o presidente da Câmara que perdeu mandato, o vice-presidente da Câmara foi preso. E há atos de pouca transparência, para não dizer outra coisa, que mancham a gestão municipal do Partido Socialista.
Perante uma situação destas, era preciso encontrar alternativas. O que assusta muito depois no processo de renovação, depois do que aconteceu aos autarcas, é entender que foi por “conduzir o carro para ir às compras”. Há uma dificuldade maior perante todo o mediatismo em torno de alguns processos na gestão municipal, há uma desconfiança muito grande por parte de quem está na sua vida, de dar um contributo na vida pública. Não é que não houvesse capacidade de convocatória de pessoas disponíveis, mas há muito receio para virem da vida privada, seja empresarial, seja da sua vida académica para a vida política em função do que é hoje o estado da arte. As pessoas têm receio de ver vasculhada na praça pública a sua vida privada.
Referi, desta forma prosaica, “ir às compras”, como forma de acentuar o que a muitos parece desproporcionado. Não haveria outro tipo de penalização, seja uma multa pecuniária, reter vencimento, serviço cívico? Numa imagem futebolística, expulsa-se à primeira falta.
É com cartão vermelho… é uma coisa que não faz sentido. E isso leva a que algumas pessoas que pudessem gostar de fazer e tivessem competência para fazer, não se mostrem disponíveis para avançar. Mas mesmo assim, não foi esse o caso em particular. Percebeu-se desde o início que os mandatos de Luís Filipe Menezes à frente da Câmara de Gaia foram de grande transformação do concelho. O concelho mudou completamente a sua face, foram anos de grande crescimento, de transformação de Gaia.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
“PS estava habituado a ter poder e tem agora de saber fazer e estar na oposição”, aponta responsável do PSD nas autárquicas
{{ noCommentsLabel }}