Remuneração média esconde problemas estruturais

  • Pedro Pinheiro
  • 12:00

Sem políticas salariais que reflitam o valor real dos profissionais, Portugal corre o risco de perder capital humano essencial para o seu desenvolvimento económico e inovação.

Tendo em conta a recente publicação pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) das estimativas referentes à remuneração bruta total mensal média por posto de trabalho, já tendo em conta o efeito da inflação, verificou-se que, em termos nominais e sem considerar a variação do Índice de Preços no Consumidor (IPC), a remuneração bruta total mensal média por trabalhador em Portugal subiu 6%, atingindo 1741 euros no segundo trimestre de 2025, face ao mesmo período de 2024.

No entanto, este valor médio deve ser analisado com cautela, pois esconde disparidades significativas entre regiões e setores, evidenciando a necessidade urgente de diferenciação profissional para atrair e reter talento qualificado. Enquanto regiões como Lisboa e Porto apresentam remunerações acima da média nacional, outras regiões, sobretudo no interior do país, registam valores substancialmente inferiores. Esta desigualdade geográfica não só afeta a qualidade de vida dos profissionais, como também dificulta o desenvolvimento económico equilibrado e sustentável em todo o território, com impactos sociais e económicos profundos.

Além disso, setores como a tecnologia e a saúde registam remunerações médias mais elevadas, enquanto setores como comércio, turismo e agricultura apresentam valores significativamente inferiores. Esta disparidade salarial entre setores evidencia uma valorização desigual das competências profissionais, podendo conduzir a uma escassez de talento em áreas estratégicas para o crescimento económico do país.

Portugal enfrenta atualmente um desafio demográfico e competitivo: muitos jovens qualificados procuram oportunidades no estrangeiro, atraídos por salários mais elevados e melhores condições de trabalho. Sem políticas salariais que reflitam o valor real destes profissionais, o país corre o risco de perder capital humano essencial para o seu desenvolvimento económico e inovação.

O investimento em remuneração diferenciada deve ser acompanhado por programas de formação contínua e desenvolvimento de competências. Só assim se garante que os profissionais evoluem ao ritmo das necessidades do mercado, tornando as empresas mais competitivas e resilientes. A retenção de talento não se limita a um aumento salarial isolado: envolve uma visão estratégica que integra remuneração justa, valorização das competências, oportunidades de progressão na carreira e políticas públicas adequadas para suportar estes objetivos.

A relação entre remuneração adequada e desenvolvimento económico é clara: países e regiões que conseguem atrair e manter profissionais qualificados tendem a ter empresas mais inovadoras, maior capacidade de investimento e melhores resultados económicos. Portugal, com o seu potencial humano e tecnológico, não pode desperdiçar esta oportunidade. O desafio não é apenas pagar mais, mas pagar melhor, criando estruturas salariais que valorizem competências críticas e promovam o crescimento sustentável.

Em suma, o aumento da remuneração média em Portugal não deve ser interpretado isoladamente como um indicador de progresso económico. Embora apresente um valor nominal crescente, apenas uma abordagem estratégica, que considere desigualdades regionais e setoriais e que aposte na atração e retenção de talento qualificado, permitirá transformar a remuneração em um verdadeiro motor de inovação, competitividade e desenvolvimento económico sustentável.

  • Pedro Pinheiro
  • Presidente do ISCAL

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