Tribunal de Contas quer mais “clareza” no financiamento da descentralização de competências

Tribunal de Contas aponta "insuficiências de planeamento, ausência de estudos atualizados que identificassem os domínios a descentralizar ou os critérios de de apuramento do respetivo financiamento".

Clarificar as fórmulas de cálculo das verbas transferidas para os municípios, garantir a estabilidade do financiamento e “evitar sobreposições ou situações de sub ou sobrefinanciamento“. Assim como implementar procedimentos para o mapeamento dos investimentos e evitar ainda mais atrasos em todo o processo de descentralização de competências da Administração Central para as autarquias. Estas são algumas da recomendações do Tribunal de Contas (TdC) ao Governo, divulgadas esta quarta-feira, e que aponta ainda “insuficiências de planeamento” e a ausência de “mecanismos estáveis e transparentes de financiamento das competências a descentralizar” entre 1 janeiro de 2019 e setembro de 2022.

Entre os reparos do relatório do TdC ao processo de descentralização, durante esse período de tempo, constam a “ausência de estudos atualizados que identificassem os domínios a descentralizar, a estimativa dos ganhos de eficiência ou os critérios de apuramento do respetivo financiamento“.

No relatório, o TdC recomenda que o formato do financiamento do processo de descentralização “contribua para a convergência dos territórios e potencie a existência de finanças municipais saudáveis, atentos os princípios da estabilidade de financiamento, da coesão territorial e da garantia da universalidade e da igualdade de oportunidades no acesso ao serviço público”.

O Tribunal de Contas caracteriza ainda de “insuficiente e inconsistente” a informação relacionada com a evolução da implementação do processo de descentralização, durante aquele mesmo período de tempo em que o processo foi avaliado. O que acabou por ter “impacto na qualidade do acompanhamento e monitorização, que revelou muitas fragilidades”.

Mais, assinala, “a Comissão de Acompanhamento da Descentralização não procedeu à avaliação da adequabilidade dos recursos financeiros de cada área de competências e constata-se a ausência de uma visão estruturada e a nível nacional da evolução do processo”.

O processo de descentralização de competências sofreu, contudo, um atraso em parte devido à pandemia da Covid-19, que acabou por adiar o período de aceitação de competências pelas autarquias, a “dificuldade em obter o acordo ou promover a iniciativa dos municípios e a não implementação atempada do Fundo de Financiamento para a Descentralização [FFD]”.

Segundo o tribunal, as competências deveriam ter sido transferidas até 1 de janeiro de 2021 e a alocação de recursos financeiros através do FFD até dezembro de 2021. Contudo, sublinha o Tribunal de Contas, o “processo de transferência de competências ainda está em curso e a afetação de recursos àquele fundo apenas foi aprovada a partir de 2022 nas LOE [Lei do Orçamento do Estado]”.

Além da pandemia, o TdC imputa também os consequentes atrasos à “elevada complexidade” inerente à implementação da descentralização de competências, “designadamente devido à inexistência de adequados estudos prévios, da não aprovação do FFD no período de 2019-2021, e de, em determinados domínios, a transferência continuar dependente da iniciativa/acordo dos municípios e de a monitorização não ter sido eficaz”.

Recorde-se que o acordo da descentralização de competências foi celebrado entre a ANMP e o Governo, a 22 de julho de 2022. E depois de várias rondas de negociação em torno da transferência de competências, que se prolongaram durante meses, com reparos políticos pelo meio.

A Comissão de Acompanhamento da Descentralização não procedeu à avaliação da adequabilidade dos recursos financeiros de cada área de competências e constata-se a ausência de uma visão estruturada e a nível nacional da evolução do processo.

Tribunal de Contas

Mais, o tribunal entende que “os ajustamentos introduzidos no processo, com base em acordos com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), visaram satisfazer alegadas insuficiências no financiamento e na operacionalização das transferências ou na partilha de responsabilidades, não se encontrando consolidados mecanismos estáveis e transparentes de financiamento das competências a descentralizar”.

No âmbito da avaliação do decurso deste processo, o TdC ouviu os ministros da Presidência do Conselho de Ministros, das Finanças e da Coesão Territorial, Mariana Vieira da Silva, Fernando Medina e Ana Abrunhosa, respetivamente. O Governo manifestou a intenção de, genericamente, acolher as recomendações formulada pelo Tribunal.

Apesar deste relatório se reportar ao período entre 1 de janeiro de 2019 e 30 de setembro de 2022, contextualiza com dados mais recentes esta avaliação da forma como a descentralização de competências tem vindo a ser implementada. O Tribunal de Contas assinala que “no âmbito da operacionalização da transferência de competências nos domínios de grande complexidade em termos de recursos humanos e financeiros (educação e saúde), os prazos de transferência de competências foram prorrogados até 31 de março de 2022 e quanto à ação social, cujo diploma setorial apenas foi publicado em 12 de agosto de 2020, a aceitação de competências ocorreu até 3 de abril de 2023“.

E refere que só com a celebração do acordo com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) a 22 de julho de 2022, “já após a data limite para a aceitação daquelas competências (31 de março 2022), foram definidas alterações nas normas estabelecidas nos diplomas setoriais e nos montantes de financiamento que proporcionaram condições para a plena execução das competências pelos municípios” nas áreas da educação e da saúde.

Por tudo isto, o TdC vem ainda sugerir ao Governo a introdução de ajustamentos ao processo de descentralização de modo a serem cumpridos os novos prazos estabelecidos e que delimite as responsabilidades nas situações em que se mantém a gestão partilhada. Assim como garanta o funcionamento de uma estrutura integrada de acompanhamento, monitorização e avaliação, capacitada para municiar o apoio à decisão.

Entre as recomendações constam ainda a necessidade de “orientar e uniformizar o reporte, pelos municípios, dos dados, nomeadamente financeiros relacionados com a assunção de competências. Assim como “publicitar informação atualizada, consistente e completa, por município e domínio, das competências efetivamente transferidas e do financiamento que lhe está associado”.

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