Execução do PRR divide Montenegro e Vieira da Silva. Há ou não atrasos?
Execução do PRR pode ser medida de várias formas. Portugal está bem, mas há "áreas mais difíceis, nas quais Portugal vai ter de pedalar muito", diz Pedro Dominguinhos ao ECO.
Luís Montenegro quer “recuperar atrasos” na execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Mariana Vieira da Silva garante que não há atrasos e que Portugal é líder a nível europeu “um dos dois países que já pediram o desembolso do quarto cheque do PRR”. Mas afinal quem tem razão? Portugal está ou não atrasado na execução da bazuca?
A resposta é fácil. Depende do prisma de análise.
A execução do PRR pode ser medida tendo em conta as metas e marcos cumpridos, o número de pedidos de desembolso ou pelo nível de pagamento aos beneficiários finais.
Portugal é, de facto, um dos países na pole position em termos europeus. Só Itália já avançou com o quinto pedido de desembolso e apenas Portugal e Itália já receberam o pagamento do quarto cheque do PRR – 16,5 mil milhões de euros e 2,46 mil milhões de euros, respetivamente.
Este pedido foi possível porque Portugal já cumpriu 102 metas e marcos acordados com Bruxelas, ou seja, 22% do total. Já a Itália cumpriu 29%.
Portugal tem mais três medidas que aguardam o pedido de verificação de cumprimento, porque, aquando do pagamento do terceiro e quarto cheques (feito em simultâneo, já que o pedido também o foi, porque Portugal preferiu aguardar luz verde da Comissão relativamente ao exercício de reprogramação da bazuca) Bruxelas decidiu suspender o pagamento de 710 milhões de euros por considerar que estas medidas não estavam cumpridas.
Faltava criar os centros de responsabilidade integrados nos hospitais, uma medida que entrou em vigor a 1 de janeiro. A lei relativa às profissões reguladas também não entrou em vigor atempadamente, porque o Presidente vetou alguns estatutos e os deputados tiveram de voltar a analisar estes diplomas a 3 de janeiro. Acabaram por ser publicadas em Diário da República a 19 de janeiro, sem qualquer alteração.
Mas ainda falta cumprir uma das medidas: o processo de descentralização de competências da saúde para os municípios. O último balanço que o Ministério da Saúde avançou ao ECO revela que faltam duas câmaras que ainda não aceitaram transferência de competências. Portugal tem seis meses para responder à suspensão do pagamento, mas deverá fazê-lo antes de o prazo terminar, como avançou ao ECO fonte oficial da Estrutura de Missão Recuperar Portugal. “Estamos em fase de recolha de evidências e validações sendo expectável responder à Comissão antes de o prazo terminar”, disse em fevereiro.
Ou seja, Mariana Vieira da Silva estava correta quando disse na conferência de imprensa do último Conselho de Ministros regular deste Executivo — segunda-feira haverá mais um, mas será extraordinário — que “Portugal é um dos dois países que já solicitou o quarto pedido de pagamento”. “Estou certa que, ao longo dos próximos anos, continuaremos a poder dizer que Portugal está na linha da frente da execução, como normalmente, nos fundos comunitários”, acrescentou, em jeito de recado, apesar de se reconhecer que, “a nível europeu, há questões em torno da execução do PRR”. “Não foi desenhado numa altura de guerra e de dificuldades de acesso a mão-de-obra e inflação”, justificou.
Os números falam por si. A Alemanha só recebeu o seu primeiro desembolso, de quatro mil milhões de euros, a 28 de dezembro. A Finlândia a 1 de março deste ano (202 milhões de euros). Mas, há países, como a Hungria, que não submeteram ainda qualquer pedido de pagamento. Por outro lado, tanto Espanha com Itália só submeteram este mês os seus projetos de reprogramação da bazuca.
Mas, o cronómetro continua a contar. E todos os países tem de ter a execução financeira dos seus investimentos concluída até ao final junho de 2016. Pode haver alguma exceção mas terá de ser alvo de um contrato assinado com a Comissão Europeia.
Mas, isto não significa que Luís Montenegro não tenha razão quando diz estar preocupado com a execução do PRR. Portugal apenas pagou 18% anos beneficiários finais, ou seja, 4,07 mil milhões de euros, sendo que as empresas (se forem tidos em conta os pagamentos às entidades não empresariais no sistema de I&I – ENESII) foram as principais beneficiárias com pagamentos na ordem dos 1,49 mil milhões de euros. Em segundo lugar surgem as entidades públicas com 995 milhões de euros pagos, de acordo com os dados de 20 de março.
Portugal tem 22,21 mil milhões de euros para investir, um aumento face aos 16,64 mil milhões iniciais e que decorreram da reprogramação da bazuca. Este aumento de 33,7% foi justificado por um aumento das subvenções, face ao recálculo da distribuição das subvenções do PRR, que dependiam da variação do PIB em 2020 e 2021 (1,6 mil milhões de euros), dos 785 milhões referentes à iniciativa REPowerEU, mas também da decisão do Executivo de recorrer a uma fatia maior de empréstimos (mais 3,2 mil milhões). Mas isto também significou um aumento do número de metas e marcos a cumprir 501, contra as anteriores 341.
Portanto, Portugal tem mais dinheiro, mais investimentos e reformas a fazer, mas o mesmo horizonte temporal para as executar, o que alimenta as preocupações já que grandes projetos como a criação de habitação digna para 26 mil famílias até 2026. As estatísticas da Estrutura de Missão revelam que apenas foram pagos 13% dos 3,24 mil milhões do PRR destinados à política de habitação em Portugal.
“A construção de casas e centros de saúde é uma das áreas que precisamos de acelerar, tal como as grandes obras públicas“, disse ao ECO, o presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR. “Ao nível da eficiência energética, é preciso que o Fundo Ambiental decida as candidaturas que tem há largos meses e ao nível da indústria 4.0 é necessária acelerar a execução das medidas de transição digital das empresas como a rede nacional de test beds, o comércio digital e empreendedorismo”, elenca Pedro Dominguinhos, recordando que estes foram alertas já lançado no último relatório da CNA.
Questionado se há razões para estar preocupado com a execução do PRR, Pedro Dominguinhos ironiza dizendo que a resposta será dada no próximo relatório da comissão, mas reconhece que “há projetos que necessitam de ser acelerados”. “Não significa que não vamos conseguir cumprir as metas e marcos definidos”, ressalva. “Mas alguns são difíceis e teremos de pedalar muito”, conclui.
Os dados da Comissão Europeia não permitem comparar quais os montantes pagos aos beneficiários finais nos restantes países, por isso, não é possível perceber se a este nível qual a posição relativa de Portugal.
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