O presidente da Recuperar Portugal está a fazer um diagnóstico dos projetos que é necessário substituir ou optar por fasear. Fernando Alfaiate critica "teimosia" de Bruxelas com limite de 2026.
O presidente da Recuperar Portugal, a estrutura de missão que acompanha a par e passo a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), reconhece que há projetos de infraestruturas que arriscam não estar prontos no limite imposto pela Comissão Europeia para a execução da bazuca.
E não são apenas o Metro de Lisboa ou a Barragem do Pisão, admite, sem enumerar os investimentos que podem estar em causa. “Pela sua condição, poderão surgir circunstâncias que podem impedir a concretização no tempo”, disse Fernando Alfaiate no ECO dos Fundos, o novo podcast semanal do ECO dedicado aos fundos europeus.
A solução? “Temos de estar muito atentos à realização desses projetos e acompanhá-los de muito perto”, diz. Mas, para acautelar riscos, a estrutura de missão está “a fazer diagnósticos relativamente a todos os projetos”. “Não só nesses projetos de infraestruturas, porque todos terão exatamente este problema, seja um projeto grande ou pequeno. Estamos a aguardar algumas orientações sobre esta matéria da Comissão Europeia. Já as colocámos e vamos falar com eles, nas próximas semanas, para tentar saber como fazer a utilização mais eficiente dos fundos que estão disponíveis: fazer faseamentos ou substituições de investimentos. Tudo isso poderá ser possível”, explicou Fernando Alfaiate.
O responsável considera “curioso” o facto de a Comissão Europeia agora aceitar o faseamento dos projetos — serem financiados parcialmente pelo PRR e depois de 2026 por outras fontes de financiamento –, já que no início as opções eram apenas fazer ou não fazer. Mas ainda falta conhecer as regras para fasear os projetos.
Fernando Alfaiate critica a posição inflexível de Bruxelas em relação à data de conclusão do PRR e reconhece que Portugal ganharia muito em ter mais um ano para executar a bazuca. “Verdadeiramente, não percebo a teimosia e a fixação do junho de 2026. Tudo deve ser feito para que as coisas se concretizem e, no caso Portugal, estaríamos muito confortáveis para executar tudo o que está previsto se tivéssemos mais um ano”, concluiu.
Há projetos que lhe inspiram mais preocupação neste momento?
Há projetos relacionados com infraestruturas que têm um risco de concretização maior. Pela sua condição, poderão surgir circunstâncias que podem impedir a concretização no tempo. E aqui o tempo é essencial.
Está a falar, por exemplo, da Barragem do Pisão, do Metro de Lisboa?
Temos projetos de infraestruturas, que não é só esse projeto que refere, mas outros, que que podem estar nessas circunstâncias. O que é que temos de fazer? Temos de estar muito atentos à realização desses projetos e acompanhá-los muito de perto, pela sua execução, tendo sempre como ponto de concretização junho de 2026, a data que temos como limite para a entrega dos marcos e metas concluídos.
Poderá ser uma opção fasear projetos como o Metro de Lisboa, a Barragem do Pisão ou outras obras? Ou seja, haver uma parte do projeto inscrita e financiada via PRR e outra com outros fundos europeus?
É curioso a Comissão vir agora colocar estas questões. Mas ainda bem que faz essa questão, porque é importante esclarecer o seguinte: nem sempre tivemos esse posicionamento do lado da Comissão, no início. Falávamos sempre mais em projetos binários: ou se faz ou não se faz. Se não se fizer, o Estado-membro perde dinheiro. A Comissão evoluiu nesse aspeto, o que é positivo. Ou seja, já admite o faseamento, mas não concretizou a forma de o fazer. Do ponto de vista de entidades coordenadoras — falo por nós, mas também por outros Estados-membros, nas reuniões que tenho assistido sobre essa matéria –, ainda não há uma metodologia clara da Comissão que defina concretamente como isso faz. Mas já é uma abertura. Não poderia ser de outra maneira. Até porque recursos adicionais para concretizar projetos podem existir e a Comissão não pode impedir o Estado-membro de o fazer. E há também uma garantia do Estado português de que os projetos que estão no PRR são para concretizar. Se não forem totalmente financiados por fundos PRR, existirão possibilidades para serem financiados e têm de ser encontradas.
À data de hoje, estamos a fazer diagnósticos relativamente a todos os projetos, não só nesses projetos de infraestruturas, porque todos terão exatamente este problema, seja um projeto grande ou pequeno. Estamos a aguardar algumas orientações sobre esta matéria da Comissão Europeia. Já as colocámos e vamos falar com eles, nas próximas semanas, para tentar saber como fazer a utilização mais eficiente dos fundos que estão disponíveis: fazer faseamentos ou substituições de investimentos. Tudo isso poderá ser possível.
Ainda não há uma metodologia clara da Comissão que defina concretamente como se faz o faseamento. Mas já é uma abertura.
Pode explicar melhor essa ideia de substituição de investimentos?
E esse é um aspeto que claramente existe no regulamento. Está explícito no regulamento do Mecanismo de Recuperação e Resiliência que, se um investimento já não é viável, ou não é viável de concretização no PRR, pode ser retirado e substituído por outro.
Que mais pode ser feito para tentar acelerar a execução financeira do PRR?
Se me permite, voltava só um bocadinho atrás. Quando disse que a Comissão Europeia tinha evoluído relativamente ao faseamento de projetos, acho que a Comissão Europeia tem obviamente um problema em mãos grande do ponto de vista de execução do PRR nos 27 Estados-membros. Porque se olharmos para o panorama que existe, noutros Estados-membros existem atrasos muito, muito consideráveis.
A Comissão também terá de evoluir e permitir que os Estados-membros tenham mais tempo, para além de 2026, para executar o PRR?
Verdadeiramente, não percebo a teimosia e a fixação do junho de 2026. Tudo deve ser feito para que as coisas se concretizem e, no caso Portugal, estaríamos muito confortáveis para executar tudo o que está previsto se tivéssemos mais um ano. Face ao planeamento que temos, isso seria o desejável para nós e para a maioria dos Estados-membros. A Comissão insiste nesse aspeto. Isso vai dar muito trabalho, essencialmente à Comissão. Existindo a possibilidade e esse dinheiro que foi contratualizado com os Estados-membros, é do interesse da Comissão e da União Europeia que se concretize. Sei que há uma decisão, que tem de ser unânime, do ponto de vista do Conselho Europeu, para obter alguma luz verde em relação à extensão deste prazo.
Uma outra circunstância, se ficarmos exatamente neste ponto, é haver algumas regras de flexibilização ou de faseamento dos projetos que ainda não as conhecemos. Sendo certo que, obviamente, do ponto de vista de Estado-membro, estamos muito à vontade. Quando fazemos um projeto, isto acontece também noutros fundos europeus, o Estado-membro tem sempre de assumir o compromisso de que o vai realizar. Ou seja, podemos fazer um corte temporal e dizer: a partir desta data, o PRR já não pode financiar este projeto, mas ele tem de ser concretizado porque faltam mais três meses, quatro meses, seis meses. Acho que a Comissão fica muito mal neste aspeto. Devia olhar para os 27 Estados-membros e ver que soluções existem. Porque, ao dar mais um ano, teríamos um PRR com mais sucesso de concretização, não só em Portugal como no resto da Europa.
Há um risco adicional em Portugal pela conjuntura política em que nos encontramos. Se Portugal for novamente a eleições legislativas, após um chumbo do Orçamento do Estado para 2025, a execução do PRR fica comprometida?
Aquilo que tenho visto, em minha ótica, é sempre muito técnica…
De quem está com a mão na massa todos os dias.
Aquilo que tenho visto é que existe um compromisso muito grande, de todos os partidos, relativamente ao PRR. Há consensos sobre esta matéria que temos vindo a sentir ao longo do tempo. Até já entre o Governo de PS, ou Governo de PSD, houve essa vontade de concretização daquilo que está aprovado, sem ter a necessária tentação de dizer: vamos reprogramar tudo. Existindo esse caminho, seria um caminho de muito risco. Reprogramações sim, mas dentro daquilo que estamos a falar, para concretizar exatamente aquilo que está previsto. Agora, começar de novo? Não, impossível. Existe uma agregação de vontades e alguma articulação no sentido de querer concretizar o programa. Circunstâncias políticas interferem sempre, às vezes em decisões. E já tivemos, no passado, essas questões em decisões de reformas, de lançamentos de grandes concursos públicos que sofreram alguns atrasos devido a alterações do Governo. Esse tipo de condicionantes, não posso dizer que não existam. Mas o essencial é esta vontade de querer concretizar um PRR que é de Portugal e não é de um determinado Governo.
Está preocupado com a possibilidade de não conseguirmos levar a cabo todas as obras que estão previstas no âmbito do PRR?
É um desafio, para além do desafio risco tempo que falávamos. Esta é outra eventual situação de risco que pode impactar na concretização. Assistimos em 2023, não tanto agora, a situações de concursos desertos, porque não havia oferta no mercado para a concretização de algumas obras. Agora também estamos numa posição diferente. No entanto, no PT2030, obras públicas vão impactar, necessariamente, com a concretização. Mas as grandes obras que temos no PRR estão adjudicadas. As obras estão iniciadas ao iniciar e a adjudicação está feita. Essa parte, digamos, está ultrapassada. Poderemos é ter o desafio temporal de haver circunstância de atraso ou de impedimento, ou de outra questão que possa surgir no meio de uma obra dessa grandeza e que possa impactar em termos do deadline que temos para o PRR.
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