Auditorias aos fundos vão ser determinadas por modelo de risco

A presidente da Agência para o Desenvolvimento & Coesão, Cláudia Joaquim, sublinha que 97% das irregularidades comunicadas ao OLAF, no âmbito do PT2020, não são suspeitas de fraude.

A Agência para o Desenvolvimento e Coesão, em parceria com a Nova IMS, está a implementar um modelo de risco para ajudar a selecionar as operações que vão ser auditadas pelas autoridades de gestão, revelou a presidente da Agência para o Desenvolvimento e Coesão no ECO dos Fundos, o podcast quinzenal do ECO sobre fundos europeus.

“Temos implementado, em parceria com a Nova IMS, um modelo de risco, que surgiu no contexto do 2020 por imposição regulamentar da Comissão Europeia”, contou Cláudia Joaquim. “Mas em Portugal já está bastante avançado. É um modelo de risco para seleção das operações que vão ser objeto de verificação administrativa por parte das autoridades de gestão”, precisou.

“O modelo de risco tem como objetivo direcionar, ao contrário de uma seleção aleatória, as ações de verificação no local”, acrescentou. “A própria Inspeção-Geral de Finanças também está a utilizar um modelo de risco na seleção das operações que são auditadas”, mas não é a mesma coisa, precisou a responsável. “A nossa expectativa é que se possa direcionar os recursos que são escassos” para as “situações onde possa vir a permitir detetar determinadas situações” de potencial uso indevido dos fundos europeus.

Cláudia Joaquim garante que os testes com inteligência artificial para analisar candidaturas estão a correr bem, reconhece que não têm sido cumpridos os prazos de análise das mesas e revela que, “nos próximos dias”, tenha concursos para 25 trabalhadores reforçarem o mapa de pessoal específico das autoridades de gestão.

Os beneficiários têm-se queixado de atrasos na análise das candidaturas. Foram lançados concursos para que as universidades pudessem ajudar as autoridades de gestão na análise das candidaturas. Neste momento, já há universidades no terreno a analisar candidaturas?

Neste momento existem três projetos. Um com o Compete, no âmbito de algumas das tipologias que têm mais candidaturas. E esse trabalho do acompanhamento que também temos feito nas reuniões já teve bastantes testes e está numa fase que nos parece já de uma implementação mais direta, porque todos os testes foram feitos com muita informação do Portugal 2020. Quando falamos em aplicar a inteligência artificial à análise de candidaturas, por exemplo, é necessário, e é isso que está a ser feito, aplicar nos modelos e ir analisando as conclusões com base naquilo que foi feito pelo humano.

As universidades vão todas utilizar inteligência artificial na análise das suas candidaturas?

O Compete com uma universidade, o programa Pessoas com outra e a própria Agência na responsabilidade que temos no desenvolvimento do AG+, que é também um sistema de back office que alguns programas regionais adotaram. Estamos a trabalhar para poder aplicar, em determinadas fases do processo, inteligência artificial. Isso passa, por exemplo, por haver a utilização de muitos dados em candidaturas do Portugal 2020, quando temos muita similitude entre o 2020 e o 2030, para que depois possam haver testes e ir-se verificar, nesse trabalho feito pelas universidades, se os resultados a que se chegam são resultados similares ou com que nível de risco ou de diferença face ao trabalho humano.

Estamos a falar de que níveis de risco nesses testes feitos até agora?

A perceção que tenho é que foram resultados muito positivos para os testes que já foram feitos e com um potencial importante de redução do tempo de trabalho, sendo que passará sempre, inevitavelmente, depois, por uma verificação final de um técnico. Nunca poderemos pôr a máquina decidir. Pareceu-me estar mesmo num bom caminho. Na Agência já utilizamos, na Linha dos Fundos, inteligência artificial através de um assistente virtual que é o Ivo e que já nos permite responder a muitas das questões que são colocadas por escrito por parte dos beneficiários. Também temos implementado, em parceria com a Nova IMS, um modelo de risco, que surgiu no contexto do 2020 por imposição regulamentar da Comissão Europeia. Mas em Portugal já está bastante avançado. É um modelo de risco para seleção das operações que vão ser objeto de verificação administrativa por parte das autoridades de gestão. Já temos nestas vertentes inteligência artificial e, naturalmente, com grande preocupação na análise de candidaturas. Ou, por exemplo, na análise, que é outro trabalho que estamos a desenvolver, dos contratos. Quando temos operações com contratação pública muito pesada, ter mais esse apoio vai ser muito importante.

Foram resultados muito positivos para os testes [com inteligência artificial] que já foram feitos e com um potencial importante de redução do tempo de trabalho,

No futuro, situações como a que se passou com Manuel Serrão e com a Selectiva Moda, com a inteligência artificial que está a ser introduzida, provavelmente não se repetiriam? Ou mais uma vez estamos perante um tipo de análise muito focada nas faturas e será sempre a verificação no terreno que poderia evitar esse tipo de situações?

Começaria por distinguir, porque muitas vezes vamos confundindo, o que é uma irregularidade nos fundos europeus do que é fraude ou suspeita de fraude. E o que distingue a intenção. É sempre uma fronteira ténue, naturalmente. Mas 97% das irregularidades comunicadas ao OLAF [Organismo Europeu de Luta Antifraude], no âmbito do Portugal 2020, são irregularidades sem suspeita de fraude. Na suspeita de fraude estamos a falar já de outro nível, um nível que naturalmente caberá às entidades investigar.

Ao Ministério Público.

O que é que um modelo de risco desta natureza permite? Com diversos fatores, pressupostos e experiência, porque fomos buscar toda a experiência, dito desta forma do Portugal 2020, não só ao nível dos beneficiários, como da tipologia de operações, onde é que houve mais irregularidades, onde é que incidiram nas verificações das auditorias mais erros. É a conjugação, este modelo, que permite classificar e direcionar, ou dirigir, é a nossa expectativa. É essa implementação que está feita. A análise iremos fazendo e o modelo tem uma perspetiva de melhoria contínua. Ou seja, com os primeiros resultados do Portugal 2030, serão incrementados e o modelo terá esse aperfeiçoamento.

Respondendo à sua pergunta, o modelo de risco visa e tem como objetivo direcionar, ao contrário de uma seleção aleatória, as ações de verificação no local. A própria Inspeção-Geral de Finanças também está a utilizar um modelo de risco na seleção das operações que são auditadas. Não estamos a falar da mesma coisa. A nossa expectativa é que se possa direcionar os recursos que são escassos da melhor forma possível. Admito, e é a minha expectativa, que na seleção dessas ações, ela seja mais direcionada para situações onde possa vir a permitir detetar determinadas situações.

Mas o modelo vai ter sempre de mudar? Ser possível fazer uma verificação mais no terreno e não tanto olhar para as faturas e papéis?

Naturalmente que a verificação no terreno é muito importante. O objetivo é sermos mais direcionados na seleção das operações que são verificadas pelas autoridades de gestão, porque estas autoridades, quando têm a sua verificação administrativa, ela pode também ser uma verificação no local. Se conseguirmos direcionar melhor, no limite, até pode haver uma diminuição da amostra porque ela foi direcionada e é maior a probabilidade de incidir sobre as situações onde haja maior probabilidade de irregularidade. Isso permite também libertar recursos para poderem fazer mais verificações no local.

“97% das irregularidades comunicadas ao OLAF, no âmbito do Portugal 2020, são irregularidades sem suspeita de fraude”, diz Cláudia Joaquim, presidente da Agência para o Desenvolvimento & Coesão (AD&C), em entrevista ao podcast “ECO dos Fundos”.Hugo Amaral/ECO

Uma das grandes novidades é a criação de uma equipa que será alocada onde for preciso, Iapmei, AICEP, Compete, etc. É possível garantir as competências técnicas específicas para analisar cada aviso, cada concurso, de cada organismo?

Essa equipa foi criada no âmbito do PRR e não no âmbito do Portugal 2030.

Ela não vai transitar depois para ajudar no PT2030?

Neste momento não temos essa indicação. É uma equipa no âmbito do PRR que naturalmente vai ter vantagens no Portugal 2030 e o trabalho de análise do PT2030.

Vai libertar funcionários que poderão concentrar-se no PT2030 e não no PRR.

Exatamente. A Resolução do Conselho de Ministros que criou as autoridades do Portugal 2030, e já numa antecipação da necessidade de aumentar os recursos humanos afetos às autoridades de gestão, tem um aumento de 16% dos postos de trabalho, no fundo, do teto que cada autoridade de gestão pode ter durante a execução do 2030. Este aumento, que foi significativo, do mapa de pessoal permite esse reforço das autoridades de gestão. A equipa que referiu irá estar muito em organismos intermediários do PRR, IAPMEI, etc, que são também organismos intermédios de Portugal 2030. Portanto, naturalmente, por via um pouco mais indireta, talvez, a análise de candidaturas do Portugal 2030 terá essa vantagem.

E será possível analisar as candidaturas em 60 dias e pagar a 30?

Esse é o grande objetivo. Claro que houve aqui uma situação de criação de algum stock de avisos que foram sendo encerrados e que a sua decisão não decorreu dentro desses prazos. E o plano de ação que foi definido, e que a Agência vai acompanhando, coordenando de alguma forma e monitorizando, tem um objetivo muito claro de reduzir essas situações de forma a que se consigam ultrapassar. Aí estarão criadas mais condições para que seja possível nos novos avisos, conforme vão encerrando, poderem logo ser, por parte das autoridades de gestão, ou dos organismos intermédios, utilizados como uma maior capacidade.

Houve uma criação de algum stock de avisos que foram sendo encerrados e que a sua decisão não decorreu dentro desses prazos.

Ainda a propósito de recursos humanos, o recrutamento centralizado que já concluiu a seleção dos cerca de mil candidatos permitiu uma autorização para que, das autoridades do Portugal 2030, cerca de 100 técnicos possam reforçar. Nestes 100 não estão incluídos os programas regionais. Os programas regionais, como estão enquadrados no mapa de pessoal das CCDR, será nesse âmbito desse reforço. Só para os restantes programas há aqui um reforço de avisos que já estão a ser abertos. Conto que nos próximos dias tenhamos já concursos para 25 trabalhadores. Há esta autorização para um reforço do mapa de pessoal específico das autoridades de gestão que os permite consolidar. E este mapa específico foi criado em 2018, com uma grande vantagem: pela primeira vez na área dos fundos foi possível criar um mapa de pessoal em que os trabalhadores podem e são afetos às autoridades de gestão, mas com a grande vantagem de manter nesse mapa de pessoal. E o grande desafio é captar e reter os recursos e reter os talentos de trabalhadores que tenham estes conhecimentos nesta área que é tão específica.

Disse que a inteligência artificial pode ajudar em concursos que exijam uma contratação pública “pesada”. Deveríamos mexer no Código da Contratação Pública, sobretudo ao nível dos projetos financiados por fundos europeus?

Um bocadinho em linha, admito que seja esse sentido, das alterações no âmbito do PRR…

No PRR, o Governo propõe alterações ao nível do visto prévio do Tribunal de Contas e também ao nível do levantamento provisório do efeito suspensivo, que estão em discussão na Assembleia da República. Mas só para projetos financiados pelo PRR. O ministro Castro Almeida admitiu que se o Parlamento assim o entendesse, poder-se-ia alargar a todos os projetos financiados com fundos europeus. O Governo não o fez por recear que isso levantasse problemas junto da Comissão Europeia.

Pensando naquilo que seria a execução e operacionalização, seria positivo no sentido em que o tempo que um grande investimento, ou que o beneficiário aguarda até poder iniciá-lo e assim iniciar a execução enquanto aguarda um visto prévio do Tribunal de Contas, é um tempo que se reduziria. E essa seria uma grande vantagem. Como referiu, essa é uma decisão que está mesmo sempre nas mãos da Assembleia da República e dos deputados.

  • Diogo Simões
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