Presidente em Almada desde a conquista do bastião comunista em 2017, Inês de Medeiros não diz se tentará novo mandato, mas reconhece força ao Chega junto de eleitorado tradicionalmente comunista.
“Parece-me evidente que os tempos que nós estamos a viver deveriam alertar para a necessidade absoluta de sermos muitos a vir para a política ativa”. O apelo é de Inês de Medeiros, atriz de formação, realizadora, e que chegou a um cargo eleitoral em 2009, como deputada no segundo Governo de José Sócrates.
Em 2017, foi a Almada tomar o bastião comunista, que ganhou por 313 votos. Para 2025, não revela ainda se será candidata à câmara, mas admite que fará tudo para travar a extrema-direita, a qual, lembra, já em França conseguiu captar votos à extrema-esquerda nas antigas zonas industriais.
Tem uma carreira de sucesso prévia à atividade política, onde está ativamente há 16 anos, quando entrou no Parlamento. Como lê o atual ambiente político conturbado no país?
Já? Meu Deus. Na política ativa, vamos dizer assim. Parece-me evidente que os tempos que nós estamos a viver deveriam alertar para a necessidade absoluta de sermos muitos a vir para a política ativa e, sobretudo, não deixar a política por mãos alheias (riso). Andam aí umas mãos muito sequiosas de poder, dizendo mal do poder, para conquistar poder.
E têm-no conquistado noutros países, todos nós sabemos quais são. Não vale a pena esconder. Preocupa-me naturalmente o aumento muito substancial da extrema-direita, até pela sua variedade. Desde o exemplo da Alemanha, à França, ao Trump. Aquilo é muito variável, até na forma como se apresentam. Mas têm uma coisa em comum: querem mesmo o poder. Não haja dúvida nenhuma que querem o poder.
Estou convencida de que só serão travados – e garanto que em tudo o que eu puder, de forma assumida, tudo farei para que não o possam conquistar, nem diretamente, nem em derivações algo oportunistas. Mas isso só se consegue se houver um cada vez maior envolvimento de todas as pessoas naquilo que o 25 de Abril nos trouxe.
Celebrámos o ano passado e então vamos relembrar o melhor do 25 de Abril, em que a política era algo de todos, a política saiu à rua, a liberdade saiu à rua, a palavra saiu à rua e, portanto, não basta estar atrás de um ecrã num telemóvel a expressar indignações várias e diversas e sistemáticas. É preciso estar disponível para pensar, construir, planear, convencer, que é a coisa mais difícil.
Mostrar que há outras alternativas, porque, quer se queira quer não, é verdade que aqueles que defendem tudo o que pessoas como eu combatem estão a ser mais eficazes nesta disseminação da descrença, do desrespeito, do desânimo, da tristeza, da falta de esperança, da agrura. Um dos meus muitos problemas com a extrema-direita é que também nunca têm um projeto de futuro que seja positivo.
É o poema de Sophia. São discursos que tornam as almas pequenas. É o velho abutre. E nós temos de conseguir, com as nossas diferenças, mas com partidos que acreditam nos valores da democracia, do Estado de direito, dos direitos universais. Temos que conseguir convencer que ainda faz sentido e que ainda é um projeto de esperança.
Teme que a extrema-direita ganhe força em Almada?
Temo que a extrema-direita ganhe força onde quer que seja. Não é novidade. Nós sabemos que em França, nas antigas zonas industriais, que eram as bacias vermelhas (estou a fazer uma tradução literal), passaram, infelizmente, dos partidos comunistas diretamente para a extrema-direita. Não é uma originalidade portuguesa. Sabemos o que aconteceu no Alentejo.
Eu fico descansada porque Almada há quatro anos foi, ou acho que foi, dos poucos municípios onde a extrema-direita não elegeu um único vereador. Pode acontecer. Acho que não vale a pena estar a fingir que não. A ultra-mediatização também os favorece. Agora, deixo para os historiadores e os sociólogos perceber as razões.
Acho que era importante estudar essa passagem de um extremo ao outro, se quiserem, de forma um bocadinho mais fina do que aquela banalidade, de dizer ‘os extremos unem-se’. Acho que há algo mais profundo que deve ser estudado.
Preparada para um terceiro mandato e para a possível eleição de um vereador do Chega?
Não vou falar de terceiros mandatos neste momento, mas não gostaria que Almada tivesse um vereador do Chega. Mas aí não são as forças políticas que decidem, é mesmo o povo que decide.
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“Temo que a extrema-direita ganhe força, onde quer que seja”
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