Câmara de Loures vai despejar 400 inquilinos por falta de pagamento de rendas
Autarquia liderada por Ricardo Leão contactou mais de mil inquilinos que não pagavam renda, para que regularizassem as dívidas. Cerca de um terço nunca respondeu. Notificação de despejo já seguiu.
A Câmara Municipal de Loures vai proceder ao despejo de 400 apartamentos de bairros municipais, direcionando esses fogos para responder a solicitações de habitação social. Por detrás da situação está o incumprimento no pagamento de rendas, que se arrasta há mais de dois anos, adiantou Ricardo Leão, presidente da autarquia: “É cumprir a constituição, a justiça social que eu quero para o meu concelho, onde todos sintam que todos cumprimos.”
Falando na segunda edição da Local Summit, organizada pelo ECO/Local Online, o socialista eleito em 2021 – quando ganhou a câmara ao comunista Bernardino Soares – explicou ter recebido uma herança de 18 milhões de dívidas em rendas, referentes a 55% do total de inquilinos da câmara.
“Atuámos, primeiro com um ato humanista, não fomos logo para o despejo, avisámos, criámos um plano – até lhe chamaram plano Leão – de regularização de dívida que podia ir até 60 prestações. Mas tinham que cumprir o seu compromisso de redução da dívida, e pagavam a renda da casa. Com meia dúzia de despejos, com as pessoas a aderirem ao programa de redução de dívida, temos hoje a boa notícia de que baixámos para 18,5% de incumpridores”.
Durante estes dois anos e meio nem sequer se dignaram a responder à câmara, nem em participar neste plano de redução de dívidas. Estão-se borrifando. Já todos receberam a ordem de despejo, são 400 fogos, mas é da vida, porque é injusto
Agora, são esses 18,5%, ou cerca de 400 arrendatários, que serão despejados. “São pessoas que durante estes dois anos e meio nem sequer se dignaram a responder à câmara, nem em participar neste plano de redução de dívidas. Estão-se borrifando. Já todos receberam a ordem de despejo, são 400 fogos, mas é da vida, porque é injusto. Tanto era injusto para os 45% que pagavam e olhavam para os 55% que não pagavam e assim iam continuando a aumentar, como agora é injusto para os outros 80% que estão a cumprir, veem os 18% que não estão a cumprir, e nada se faz.”
O autarca socialista diz ter constatado “um problema que existia há décadas” e recorda que os mais de 1200 inquilinos que não pagavam, num universo de 2500 fogos municipais, têm hoje rendas na ordem dos 10 a 15 euros. Valores superiores às rendas que encontrou nos fogos de habitação municipal, e que rondavam os quatro euros. “A CDU, durante oito anos, fingiu que não via, meteu a cabeça na areia, e nem atualizou” as rendas, acusa.
“É assim que se acaba com o populismo”
Nesta conferência do ECO/Local Online, Ricardo Leão relembrou a polémica de novembro passado, quando se viu obrigado a demitir-se de presidente da Federação da Área Urbana de Lisboa do Partido Socialista, após uma polémica com declarações acerca de inquilinos da câmara envolvidos nos dias de distúrbios em Lisboa e vários concelhos limítrofes. Na altura, o autarca defendeu, numa reunião da câmara a que preside, que os inquilinos que fossem identificados como autores da destruição de património municipal seriam despejados. “É óbvio que eu não quero que um criminoso que tenha participado nestes acontecimentos, se for ele o titular do contrato de arrendamento é para acabar e é para despejar, ponto final parágrafo”, referiu, citado pela Lusa.
Dias depois, num artigo de opinião no jornal Público, assinado por António Costa, José Leitão e Pedro Silva Pereira, sob o título “em defesa da honra do PS”, escrevia-se que “quando um dirigente socialista ofende gravemente os valores, a identidade e a cultura do PS, não há calculismo taticista que o possa desvalorizar. É esse legado que sentimos o dever de defender”.
Agora, na Local Summit, numa referência implícita aos apelos à reflexão que se vão ouvindo após a queda do PS para terceira força política nas legislativas, Ricardo Leão destaca que “o concelho de Loures foi um dos gauleses no distrito de Lisboa onde o PS conseguiu vencer”.
Leão realça ter sido, na ocasião das suas palavras, “muito crucificado pelo que disse há um ano. Sei bem o que a população sente, não preciso agora de nenhuma reflexão. Eu já refleti muito. De há um ano e tal a esta parte comecei a ouvir da população o cansaço que existia, na teoria de que era uns terem de trabalhar para outros. O que é facto é que isso existia. Fui daqueles que jamais enfiei a cabeça na areia e fingir que não existe nada, ou considerar que há assuntos tabus e são propriedade de A, B ou C. Há que enfrentar os problemas e resolvê-los. É assim que se mata o populismo”, defende.
O autarca recupera uma expressão polémica proferida aquando do caso de novembro passado: “Agarrámos o problema de frente e com pulso firme, sem dó nem piedade.” Prosseguindo no ataque a quem colocou em causa o respeito pelos princípios fundamentais do seu partido, Ricardo Leão afirma não ver “nos valores do PS nada em que se viole qualquer valor ou princípio do PS, por defender que todos tenham os mesmos direitos ou os mesmos deveres. É estar a cumprir a Constituição, a justiça social que eu quero para o meu concelho, onde todos sintam que todos cumprimos.”
Implacável para com os incumpridores, e destacando o milhar de pedidos de apoio habitacional, designadamente “mães solteiras com filhos doentes”, o presidente da Câmara de Loures defende que “quem não cumpre as suas obrigações é despejado das suas habitações. Isto para muitos socialistas foi difícil de ouvir. Não vou permitir que [os moradores de] 400 fogos, que nem sequer respondem à câmara, ocupem casas às pessoas que estão na lista de espera. Com o despejo, desses mil [em espera] são 400 [casos] que ficam resolvidos.”
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