Portugal entrega esta segunda-feira em Bruxelas a reprogramação do PT2030. Castro Almeida revela, no ECO dos Fundos, as principais mudanças. Grandes empresas do digital e biotecnologia vão ter apoios.
Portugal vai entregar esta segunda-feira em Bruxelas a reprogramação do Portugal 2030. Entre as várias medidas está a possibilidade de as grandes empresas nas áreas do digital, das tecnologias limpas e da biotecnologia poderem aceder a fundos do atual quadro comunitário de apoio. E caso o exercício de reprogramação seja aceite, todas as obras de drenagens que custem mais de cinco milhões de euros também poderão ser financiadas pelo Portugal 2030.
O ministro Adjunto e da Coesão, Manuel Castro Almeida, revela no ECO dos Fundos, o podcast quinzenal do ECO sobre fundos europeus, as linhas gerais da reprogramação do PT2030. Em ano de eleições autárquicas, Carlos Moedas vai poder contar com fundos do PT2030 para financiar o grande túnel de drenagem de Lisboa, até aqui financiado com o orçamento da Câmara. Não só serão elegíveis despesas futuras, como também as faturas “de obra que está feita”, explicou Castro Almeida. A medida, garante, não é exclusiva de Lisboa, já que há câmaras como Oeiras e câmaras no Algarve que têm obras de drenagens com custos superiores a cinco milhões de euros.
Com esta alteração resolve-se também o problema do Sustentável 2030 que estava em risco de devolver, este ano, verbas a Bruxelas decorrentes da aplicação da regra da guilhotina. Um risco que decorria do facto de o PT2030 ter começado com um atraso adicional face aos quadros comunitários anteriores, mas também pelos atrasos na Justiça do concurso das carruagens de comboios que foi impugnado. “São 17 milhões de euros que Portugal perde todos os meses”, diz Castro Almeida. Carruagens que deviam ser financiadas pelo PT2030 e que terão de ser pagas com o Orçamento do Estado.
A reprogramação, além dos 1.200 milhões de euros do Compete e dos programas regionais para apoiar as grandes empresas em investimentos nas áreas do digital, das tecnologias limpas e da biotecnologia, trará também uma linha de 176 milhões de euros — o Restore — para financiar consequências de desastres naturais. O objetivo é que os apoios sejam concedidos de forma mais célere do que através do Fundo de Solidariedade.
A reprogramação vai ainda permitir que os projetos que saíram do PRR – Barragem de Água do Pisão, Tomada de Água do Pomarão e dessalinizadora do Algarve – sejam financiadas pelo Portugal 2030, através do programa Sustentável 2030. Estas obras, dado o volume do investimento em causa, vão também ser financiadas pelo Fundo Ambiental e pelo Orçamento do Estado, revela Manuel Castro Almeida. Fica assim de fora a possibilidade de recorrer a empréstimos do Banco Europeu de Investimento (BEI).
Mas há mais novidades. “Fizemos também algumas alterações de elegibilidade entre programas”, diz o ministro com a tutela dos fundos europeus. “As obras em alta para a água e para o lixo, deixaram de ser financiadas nos programas regionais e passam a ser financiadas também no Sustentável”, explicou.
Por outro lado, foram adotadas novas regras na repartição de responsabilidades entre os fundos da coesão e os fundos da política agrícola, “para que as áreas que sejam próximas da agricultura e da floresta possam ser apoiadas também com fundos da coesão”.
Houve um conjunto de investimentos que tiveram de sair do PRR, porque não eram possíveis de ser concluídos a tempo de 2026. Os mais emblemáticos: o Metro de Lisboa, a barragem do Pisão, a tomada de água do Pomarão, a dessalinizadora do Algarve. Já estão escolhidas as fontes de financiamento alternativas destes projetos?
Já está aprovada na Comissão Interministerial de Coordenação do Portugal de 2030, a inclusão dessas obras. Na reprogramação do Portugal de 2030, essas obras já estão incluídas.
E vão todas?
E vão todas, exatamente.
Na totalidade?
Todas as obras que saíram, que deixaram de ser financiadas pelo PRR, porque não ia ser possível construí-las dentro do prazo fixado, vão ser feitas. Quer o Pisão, quer o Pomarão, quer a dessalinizadora do Algarve, vão ser construídas. Já está aprovada uma dotação agora no Portugal 2030 para garantir que estas obras vão ser feitas. Uma parte é Portugal de 2030, outra será Orçamento do Estado e há também uma componente de Fundo Ambiental.
Não vão recorrer a empréstimos do BEI para estas obras?
Creio que não.
Isso era uma questão que se colocava porque se Águas de Portugal tivesse de recorrer a um empréstimo BEI, os utilizadores veriam repercutida na sua fatura os encargos desse empréstimo. Como é que o PT2030 tem dotação para tudo isso?
Isto é tudo pescadinhas de rabo na boca. O Portugal 2030 tem dotação porque tinha despesa prevista que não vai poder ser feita.
Qual despesa?
Tenho que lhe contar aqui uma pequena história para se perceber em que país vivemos. Já há vários anos, no Governo do Partido Socialista, foi lançado o concurso para a aquisição de carruagens de comboios. Foi adjudicado na perspetiva de poderem ser entregues X carruagens por mês, ou por ano, até ao final do prazo do Portugal 2030, que as ia financiar. Houve uma empresa que recorreu para o tribunal da intenção de adjudicação e o processo ainda está no tribunal. Já lá vão mais de dois anos. E por cada mês que passa, que esperamos pela decisão do tribunal, Portugal está a perder 17 milhões de euros, por mês, de dinheiro. Essas carruagens vão ser pagas já não com fundos europeus do Portugal 2030. Vão ter de ser pagas com Orçamento do Estado, porque, à medida que os meses vão passando, há um número de carruagens cuja entrega vai ser feita fora do período do Portugal 2030. É aqui um caso onde os atrasos nos tribunais está a fazer o Estado português perder bastante dinheiro: 17 milhões por mês. Portanto, há dinheiro que vai sair do Portugal 2030, porque já não vamos poder gastá-lo na compra dos comboios.
No concurso para a aquisição de carruagens de comboios, houve uma empresa que recorreu da intenção de adjudicação e o processo ainda está no tribunal. Já lá vão mais de dois anos. Por cada mês que passa, Portugal está a perder 17 milhões de euros, por mês.
Era isso que o levava a estar preocupado com a aplicação da regra da guilhotina, nomeadamente ao nível do sustentável 2030?
Há uma guilhotina que corta tudo aquilo que devia ter sido gasto até 31 de dezembro de 2025. É uma obrigação de execução. O que não foi gasto, cai a guilhotina e corta esse dinheiro.
Portugal perde o montante não executado e tem de devolver a Bruxelas.
Hoje [quarta-feira, 26 de março] estivemos a trabalhar nisso para tomar medidas para garantir que todos os programas operacionais cumpram a regra N+3 até ao dia 31 de dezembro de 2025. Não estou muito preocupado com o programa Sustentável.
Foi o senhor ministro que manifestou essa preocupação no Parlamento.
Sim, sim. Mas repare, é que, justamente, a reprogramação do Portugal 2030 já está a retirar os comboios e aplicar o dinheiro noutras coisas que vão ser gastas.
Que garante que essa execução será feita.
Que garante a execução, exatamente.
Ora, então vamos lá à reprogramação do PT2030.
Quer que lhe dê um exemplo de obra que está feita e que pode ser paga aqui?
Quero.
Vou-lhe dizer isto em primeira mão. Se a reprogramação do Portugal 2030 for aprovada, vai ser possível financiar, por exemplo, o enorme túnel que está a ser construído em Lisboa para a drenagem das águas pluviais. São muitas dezenas de milhões de euros que vão poder ser financiados no Portugal 2030.
Se a reprogramação do PT2030 for aprovada, vai ser possível financiar, por exemplo, o enorme túnel que está a ser construído em Lisboa para a drenagem das águas pluviais. São muitas dezenas de milhões de euros que vão poder ser financiados no PT2030.
Só o túnel vai resolver o problema da regra de guilhotina do Sustentável, não?
O túnel vai resolver o problema das águas pluviais e das cheias na Baixa de Lisboa, que vão desaparecer, felizmente. Essa obra não estava prevista ser financiada com fundos europeus, era a Câmara de Lisboa que ia fazê-la. Agora a Câmara de Lisboa, se a reprogramação do Portugal 2030 for aprovada, vai poder apresentar faturas de obra que está feita e de obra que venha a fazer, para poder ser financiada no Portugal 2030. É uma das razões pela qual já não estou preocupado com a regra do N+3 no programa Sustentável. Dei-lhe esta obra de Lisboa como sendo um exemplo, mas há outros. A medida, não está dirigida a Lisboa. Há outros casos de obras de valor superior a cinco milhões de euros, que foi aquilo que aprovámos, e que têm a ver com problemas de drenagens de água. Há problemas em Lisboa, mas não só. Também em Oeiras ou no Algarve. A medida é específica para obras de drenagem que custem mais de cinco milhões de euros.
Mas, ainda assim, caberá tudo dentro do Sustentável? A barragem do Pisão, a dessalinizadora? Porque não há dotação livre no Algarve 2030.
Vai sair do Sustentável, do Orçamento do Estado e do Fundo Ambiental.
Que outras alterações há com a reprogramação do PT2030?
Há uma alteração que é, de facto, importante e estrutural. Na Comissão Interministerial de Coordenação ficou decidido adotar uma recomendação da Comissão Europeia no sentido de abrir os fundos do Compete e dos programas operacionais regionais às grandes empresas e não apenas às PME, para as áreas de inovação tecnológica: do digital, das tecnologias limpas e da biotecnologia. Nestas três áreas, vai ser possível financiar grandes empresas. A Comissão Europeia chegou à conclusão, com o Covid, que a Europa estava muito desprotegida em determinados setores. Há aqui um esforço de investimento nestes setores. Basicamente, quem desenvolve atividade nestas áreas são grandes empresas. Temos uma dotação na ordem dos 1.200 milhões de euros, que é agora aberta à possibilidade de grandes empresas poderem investir nestas três áreas que estão referenciadas pela Comissão Europeia.

Que outras novidades trará a reprogramação?
Vai ter também uma linha que não existia, para financiar desastres naturais, como aquele que aconteceu com os incêndios de setembro do ano passado. Lembra-se de um anúncio que a Presidenta da Comissão Europeia fez?
Sim.
Fizeram uma alteração às regras europeias e, na sequência disso, estamos a alterar. Na reprogramação de Portugal 2030, vamos incluir uma dotação de 176 milhões de euros para uma nova linha de investimento, que é o Restore, para financiar consequências de desastres naturais.
Mas já havia financiamento comunitário para as catástrofes naturais, através do Fundo de Solidariedade. Não estamos a sobrecarregar os programas regionais? É verdade que concorríamos todos ao mesmo bolo, em pé de igualdade.
Aqui tem a ver com afetar dotações dos programas regionais, a este objetivo específico das catástrofes. Porque é preciso dinheiro que esteja disponível mais em cima da hora. Sem embargo, continuarmos a candidatar-nos a fundos europeus, é preciso dinheiro disponível em cima da hora, como foi o caso dos incêndios de setembro.
O que mais ficou mais decidido na reprogramação do PT2030?
Aprovámos o dinheiro do STEP, que é aquela plataforma para o digital e para as tecnologias limpas e para a biotecnologia. Depois foi o Restore para as calamidades. Metemos lá as obras que saíram do PRR e entraram no Portugal de 2030. E fizemos também algumas alterações de elegibilidade entre programas. As obras em alta para a água e para o lixo, deixaram de ser financiadas nos programas regionais e passam a ser financiadas também no Sustentável.
Não é misturar fundos, mas é assumir que zonas que têm conexão com a agricultura podem ser financiadas com fundos da coesão. O nosso limite é muito simples. O limite é não violar a legislação europeia.
Também adotámos novas regras na repartição de responsabilidades entre os fundos da coesão e os fundos da política agrícola. Tenho notado que em Bruxelas há uma ideia de clara separação entre os fundos da Coesão e os fundos da Política Agrícola Comum (PAC). Em Portugal, o PEPAC. É um erro, digamos, da burocracia de Bruxelas. E essa burocracia de Bruxelas já conseguiu impor essas más práticas a Portugal e a outros Estados-membros. E há uma certa tendência de considerar que o que é agricultura tem os seus fundos próprios e os fundos da coesão não podem entrar na área da agricultura. Ora, uma indústria agropecuária é o quê? A indústria ou a agricultura? Se abate o seu pinhal, porque é floresta, é agricultura, e depois vai produzir portas com o pinhal que abateu, a fábrica das portas não pode ser apoiada, porque o pinhal é seu, isto é um produto agrícola. Isto não tem lógica nenhuma. Estabelecemos regras para que as áreas que sejam próximas da agricultura e da floresta possam ser apoiadas também com fundos da coesão. A agricultura é essencial à conceção do desenvolvimento regional e os fundos do desenvolvimento regional têm de estar disponíveis para apoiar a agricultura. Uma barragem pode servir fins agrícolas, de regadio, mas também serve abastecimento às populações. Fica claro, a partir de agora, que quando uma barragem sirva estes dois fins, os fundos da coesão podem financiar a barragem.
Até aqui era uma grande dificuldade, porque como a barragem tinha fins agrícolas, alto lá que não se pode mexer, porque isto é agricultura, não pode haver confusões. Tem que haver mistura. Não é misturar fundos, mas é assumir que zonas que têm conexão com a agricultura podem ser financiadas com fundos da coesão. O nosso limite é muito simples. O limite é não violar a legislação europeia. Tudo o que seja dentro dos limites da legislação, queremos aproximar os fundos da coesão do desenvolvimento rural.
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Reprogramação do PT2030 vai pagar obras de Moedas e Isaltino para travar cheias
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