Gonçalo Raposo Cruz, CEO da BDO Portugal, admite que possa haver uma unificação da entidade que lidera com Espanha e Brasil, com o objetivo de a auditora ganhar dimensão e ser mais relevante.
A BDO Global tem vindo a avançar com a fusão de algumas empresas dentro do grupo em países onde há sinergias, e Portugal poderá entrar neste movimento. Em entrevista ao EContas, Gonçalo Raposo Cruz, CEO da BDO Portugal, admite que está a ser ponderada a possibilidade de uma unificação da empresa que lidera a Espanha e ao Brasil, “parceiros naturais” do país.
Este passo permitiria ganhar dimensão e tornar-se num “player mais importante” nos vários mercados, “falando a uma só voz” e tomando decisões em conjunto, explica o responsável pela auditora que vai passar a fiscalizar as contas do Banco Santander, tanto cá como noutros quatro países.
Sobre a entrada de um fundo de private equity no capital, um movimento que tem acelerado nos últimos tempos no mercado de auditoria, Gonçalo Raposo Cruz reconhece que esta aposta permite às empresas ganharem capacidade financeira para crescerem e investirem. Mas afasta que isto venha a acontecer, pelo menos por agora, na BDO.
A entrada de fundos de private equity no capital de auditoras tem acelerado. Para a BDO este passo faz sentido para alavancar o crescimento?
As nossas perspetivas futuras são claras. São dois vetores: o da qualidade e o das pessoas. Fala-se muito na rotação do staff e, por outro lado, das dificuldades de atratividade desta profissão. Falo mais dos auditores, mas é genérico. Esses são os nossos focos, que é ter profissionais de qualidade e dar-lhes as condições para prestarmos um serviço de qualidade.
Sentem dificuldades em atrair e reter jovens?
Tem sido um dos maiores desafios. O crescimento para a BDO não é um objetivo em si. Há dois motivos que nos obrigam a crescer. E um deles é dar uma oportunidade de carreira aos jovens que todos os anos entram nesta casa. Quando dizemos às pessoas que é possível entrar numa consultora como a nossa e ter uma oportunidade de carreira, é porque é uma realidade. Mas para isso temos que ter um crescimento que permita a quem entra, e que tenha perfil e queira fazer uma carreira nesta profissão, ter as suas oportunidades.
O crescimento é necessário também para termos a capacidade financeira para fazer face aos investimentos que vão ser necessários nos próximos anos. Fala-se muito em tecnologia, mas sempre com o objetivo da qualidade. Esses são os dois vetores que são os nossos pilares. É a qualidade e atrair e reter pessoas. Depois, há dois fenómenos que penso que podem acelerar o crescimento.

Que fenómenos são esses?
Um é o das sociedades multidisciplinares. Temos estado atentos ao que se tem passado no mercado. Há consultoras a integrar e a ter um departamento de legal. Até há poucos anos, a lei não o permitia em Portugal. A BDO Legal existe e tem cerca de 800 advogados em todo o mundo e está em 70 países. Não é uma empresa, mas é uma área de negócio, é uma comunidade que se chama BDO Legal e que tem uma presença muito forte em alguns países. A BDO Espanha, por exemplo, tem 200 advogados e tem uma presença muito significativa no mercado da advocacia do país.
Portugal também terá um departamento de legal?
Ainda não tomámos essa decisão. Temos conversado com muitas pessoas desse setor. Estamos influenciados pelo facto de já existir na BDO uma comunidade com grande relevância e pelo facto de sabermos que, se eventualmente integrarmos um escritório de génese mais portuguesa, vai integrar uma firma internacional com uma rede muito significativa. É um tema que está em análise e ainda não tomámos nenhuma decisão.
Qual é o outro fenómeno?
[A entrada de] private equity é um fenómeno que não é recente. Noutros países já existe há alguns anos. Private equity muito relevantes têm entrado no capital e na estrutura de governance de redes internacionais.
É um movimento que tem acelerado?
Tem acelerado em termos globais. Em Portugal, já há alguns fenómenos desses. Vai trazer uma grande oportunidade de financiamento. Ou seja, a entrada dos acionistas vai permitir a essas redes terem mais capacidade financeira para crescer e para investir. Mas também vai trazer alguns desafios.
Que desafios destacaria?
Há um desafio muito importante em termos de gestão de conflito de interesses. Temos cerca de 3.000 clientes em Portugal. Os fundos de private equity têm todos estruturas de participações muito disseminadas em muitas entidades. É uma rede que tem de ser objeto de uma análise prévia muito significativa e vai limitar depois o raio de ação das auditoras.
A BDO também considera a entrada de um private equity no capital?
Não temos nenhuma intenção, para já, [de deixar entrar um private equity no capital]. A BDO Portugal é detida pelos sócios portugueses dentro de uma cultura da proximidade e da qualidade. Essa tem sido a tónica da nossa estratégica desde há uns anos.
Não temos nenhuma intenção, para já, [de deixar entrar um private equity no capital]. A BDO Portugal é detida pelos sócios portugueses dentro de uma cultura da proximidade e da qualidade. Essa tem sido a tónica da nossa estratégica desde há uns anos.
A BDO Portugal tem vindo a comprar empresas mais pequenas para reforçar as suas capacidades em áreas e regiões chave?
Estamos hoje presentes em oito cidades. Em 2019, adquirimos uma empresa em Braga, na área do advisory. São consultores empresariais, mais financeiros, deal advisory e candidaturas a fundos europeus. É uma empresa que tem hoje o triplo das pessoas que tinha. Tem um partner local. Na Maia, integrámos uma empresa de outsourcing. Em Faro, onde estamos há mais de 20 anos, integrámos muito recentemente uma pequena SROC. Abrimos um escritório em Leiria há dois anos, com uma base de outsourcing.
Têm sido ajudas ao crescimento e uma forma de entrarmos em territórios onde não tínhamos presença física tão forte. Queremos estar ao pé dos clientes e queremos também aproveitar os jovens que saem das universidades de todo o país. Trazê-los para só para Lisboa ou só para o Porto não era a melhor solução. O crescimento da BDO foi fundamentalmente orgânico. Integrámos cinco operações nos últimos cinco anos porque nos fazia sentido pela sua localização e pelas equipas.
Preveem integrar mais empresas?
Neste momento, temos uma opção clara de consolidação. Temos as equipas espalhadas pelo país, temos as service lines com um leque já muito vasto de oferta de vários serviços. Agora, temos de consolidar o crescimento. Duplicar uma empresa em cinco anos obrigou a um investimento prévio nas estruturas de suporte para chegarmos a um patamar diferente do que tínhamos há cinco anos. Não temos em curso nenhuma operação de integração. Vamos estar sempre atentos ao mercado.

As pequenas empresas estão a procurar estas integrações para conseguirem responder a investimentos avultados, nomeadamente em inteligência artificial (IA). Os auditores estão preparados para integrar esta nova tecnologia no dia-a-dia?
Temos a vantagem de utilizamos ferramentas que são coordenadas pela BDO Global. Em termos de auditoria, temos um software único que é usado obrigatoriamente em todos os clientes em todos os países. Temos depois uma parceria com a Microsoft. Todas as ferramentas são introduzidas pela BDO Global e são depois disseminadas para todos os países. Até ao momento tem sido basicamente ferramentas de produtividade e de melhoria de processos internos.
O nosso software de auditoria ainda não integra na sua génese a IA. O que temos depois é um conjunto de ferramentas de validação de dados, que são essenciais em duas coisas. Uma é a qualidade dos dados utilizados pelo auditor e, depois, as melhorias de produtividade para sobrar mais tempo para outras funções. Os nossos clientes, mais do que um auditor ou um consultor, procuram muitas vezes um parceiro que os ajude a crescer.
Pode haver uma unificação [da BDO Portugal, Espanha e Brasil] e ter uma comunidade que possa trabalhar em conjunto, decidir em conjunto e abordar o mercado de forma conjunto. Sempre na lógica de sermos uma estrutura maior e um player mais importante nos vários mercados onde estamos inseridos.
A BDO também poderá avançar com fusões dentro do próprio grupo?
Está em discussão. É o conceito dos clusters e das regiões. Em África, por exemplo, tem havido vários fenómenos de agregação numa única empresa. Na América do Sul estamos a passar por esse processo. São entidades que juridicamente se vão juntando numa BDO South America ou numa BDO Latin America.
A BDO Portugal e Espanha também poderão passar por este processo?
São ideias que são muito discutidas e são, de alguma forma, fomentadas pela própria BDO Global, de que países que tenham algumas sinergias ou aspetos que na sua cultura os aproxime possam dar passos de crescimento e falar a uma só voz. Brasil e Espanha são parceiros naturais de Portugal.
Pode vir a acontecer uma fusão entre Portugal, Espanha e Brasil no futuro?
Isso pode vir a acontecer no futuro. Haver uma unificação – não queria falar em fusão – e ter uma comunidade que possa trabalhar em conjunto, decidir em conjunto e abordar o mercado de forma conjunto. Sempre na lógica de sermos uma estrutura maior e um player mais importante nos vários mercados onde estamos inseridos.
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“Unificação da BDO Portugal, Espanha e Brasil pode vir a acontecer no futuro”
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