Fuga para a Vitória: quando o interesse público prevalece
O paralelismo que encontro entre este filme de 1981 e a recente crise da greve do lixo de Lisboa, é exatamente a questão da resiliência, da equipa e da vitória.
O título deste meu artigo é do filme “Fuga para a vitória (Victory)”, de 1981, com Sylvester Stallone, Michael Caine e o grande Pélé, entre outros, realizado pelo mestre John Houston.
Para quem não viu, o filme leva-nos a um jogo de futebol imaginário entre uma equipa de prisioneiros na Alemanha da II Guerra Mundial e uma equipa de oficiais alemães, que resulta na fuga vitoriosa dos prisioneiros após um jogo mais ou menos legítimo de futebol.
Inspirado em factos reais, o filme fala, acima de tudo, de resiliência, camaradagem e coragem.
E o paralelismo que encontro entre este filme e a recente crise da greve do lixo de Lisboa, é exatamente a questão da resiliência, da equipa e da vitória.
Lisboa respirou aliviada com o fim da greve dos trabalhadores da recolha de lixo, que, apesar de prolongada, não conseguiu – como os sindicatos do setor desejavam — paralisar a cidade ou causar o caos.
E não conseguiu porque Lisboa resistiu, as freguesias e os lisboetas, juntos, ajudaram e no fim conseguiu-se a vitória sobre a falta de bom senso.
A liderança política de Carlos Moedas provou que é possível enfrentar crises sem ceder a pressões injustificadas. A postura inflexível dos sindicatos, ao recusarem regressar à mesa das negociações, expôs a verdadeira natureza do conflito: uma greve meramente política — de desgaste político — no início de um ano eleitoral. E todos se aperceberam disso.
Os argumentos dos sindicatos sobre falhas no acordo com a CML perderam toda a credibilidade quando veio a público que quase a totalidade dos pontos reivindicados já se encontravam cumpridos. E os restantes em andamento. E todos se aperceberam disso.
A estratégia sindical prejudicou não apenas a cidade, mas também os próprios sindicatos, que arriscaram a sua legitimidade. Ao transformar uma greve laboral numa disputa política, alienaram a opinião pública e enfraqueceram o apoio à sua causa. Lisboa, por outro lado, seguiu em frente, demonstrando que não se curva facilmente a agendas alheias ao interesse coletivo. Piorando ainda quando se percebe pelos números de adesão dos tais trabalhadores descontentes, tirando um único dia, todos os outros estiveram muito abaixo dos 50%. Ou seja, até os trabalhadores perceberam a postura dos sindicatos e não lhes deram razão.
Enquanto a greve decorria, as freguesias no geral, e Santo António em particular, assumiram um papel de destaque na manutenção da limpeza da cidade. Tal como no filme que refiro, a força da equipa foi crucial para a vitória nesta crise. Com recursos limitados, as freguesias mobilizaram equipas e realizaram operações extraordinárias de grande espírito de esforço e criatividade, garantindo que a vida dos lisboetas seguisse com o mínimo incómodo possível.
Este esforço, embora eficaz, não foi isento de custos. Importantes recursos financeiros foram desviados de outras prioridades locais, e o desgaste humano foi significativo. Ainda assim, o trabalho das equipas das juntas merece todo o reconhecimento – e o meu agradecimento, no que Santo António concerne — pois mostrou que a ação local, concertada, pode ser uma poderosa ferramenta para mitigar crises.
No entanto, alguns impactos económicos foram inevitáveis. A perceção negativa causada pela acumulação de resíduos em algumas áreas afetou a imagem da cidade linda que é Lisboa e, acima de tudo o comércio local.
Não me parece é que tenha afetado a imagem do autarca Carlos Moedas, pois os lisboetas sabem bem diferenciar o que são reivindicações legitimas por melhores condições de trabalho, de ações desprovidas de bom senso, onde o bem-estar coletivo é apenas um peão em nome de motivações políticas em anos eleitorais.
Apesar da greve, Lisboa conseguiu manter-se funcional. Não houve caos, graças também à outra componente da equipa: os lisboetas que colaboraram, ao perceber o que estava em causa, ao colocar o lixo nos locais propícios e ao evitar depositar objetos de grande porte – os monos – na via pública. E o meu agradecimento vai também para eles, por este comportamento cívico.
Mas este filme deve ser também um aviso e um lembrete (como os post-its que deixamos nos computadores dos filhos para eles arrumarem o quarto) de que crises como esta podem repetir-se e têm custos invisíveis: as despesas extraordinárias com limpeza, a sobrecarga nas juntas e nas suas equipas e o impacto reputacional.
Lisboa não pode depender de respostas emergenciais quando o bom senso não impera. Precisa de mecanismos mais robustos para evitar que situações semelhantes voltem a ocorrer.
E os sindicatos têm de perceber, de uma vez por todas, que existem para a defesa dos trabalhadores e não para fazer política em nome de quem acham que deveria estar no poder, à revelia da opinião dos eleitores.
Um Desejo para 2025: Diálogo e Resiliência
Com o capítulo da greve do lixo encerrado, é tempo de olhar para o futuro. Que 2025 seja o ano em que Lisboa consolide uma cultura de diálogo e resolução pacífica de conflitos. Que os sindicatos recuperem o foco nos interesses legítimos dos trabalhadores e que a liderança política continue a demonstrar coragem e compromisso com o bem comum, como até aqui.
Mais do que nunca, Lisboa precisa de se unir em torno de um objetivo comum: construir uma cidade sustentável, resiliente e preparada para enfrentar os desafios do futuro.
E que esta vitória – porque efetivamente assim o foi, tal como no filme do título – sirva de lição e inspiração para que crises semelhantes não se repitam e para que, juntos, possamos fazer de Lisboa uma referência global de gestão urbana eficiente e colaborativa.
Que 2025 seja o ano em que Lisboa não só supera desafios, mas também reafirma a sua capacidade de crescer e prosperar em harmonia com os seus cidadãos. Com todos.
E que nunca, mas mesmo nunca, o interesse público seja refém de agendas políticas.
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