O som da Contabilidade
Se queremos que os contabilistas “mudem o mundo”, então temos de começar por lhes dar as ferramentas certas. Investir na sua educação é investir na competitividade das empresas e na solidez económica.
No Congresso Internacional de Contabilidade e Auditoria de 2025, a Senhora Bastonária da Ordem dos Contabilistas afirmou no seu discurso final que “os contabilistas vão mudar o mundo”. Esta ideia, repetida ao longo do evento por vários académicos, reflete o apelo à ação realizado a nível internacional.
Há cada vez mais uma pressão sobre os profissionais da contabilidade para dar respostas às exigências do novo ambiente de negócios. Uma adaptação que exige uma atualização a nível de novas tecnologias e de diretrizes de reporte ESG. A exigência da profissão não se fica por aí, a transição esperada nos negócios requer dos profissionais maior capacidade de aconselhar os seus clientes sobre temas que vão além de débitos e créditos, ativos e passivos. Como business partners, o papel de liderança e aconselhamento destes profissionais às empresas significa que contribuem de forma ativa para a definição de estratégias, políticas e práticas empresariais também em assuntos ambientais, sociais e de governança.
A pergunta que se coloca é se os profissionais estão preparados para esta transição? E os futuros profissionais, os que estão hoje a seguir o seu percurso académico? Estamos a prepará-los para o que encontrarão no futuro? Desconhecemos o que está pela frente, mas certamente será mais desafiador do que a complexidade de negócios que encontramos nos dias de hoje.
O estereótipo do profissional de contabilidade como um mero contador de feijões que regista faturas e preenche declarações de impostos foge em larga escala da realidade por detrás do trabalho financeiro especializado, de discernimento, de estratégia e de resolução de problemas que os verdadeiros contabilistas realizam diariamente. Este estereótipo tem impactado de forma negativa a atratividade da profissão, resultando, pela primeira vez em muitos anos, numa menor taxa de preenchimento de vagas nos cursos de contabilidade em 2025, face ao restante do ensino superior.
O ensino superior precisa de se reinventar para fazer face à velocidade a que o setor evolui, o que exige dos docentes uma atitude mais experimental, tanto nos conteúdos como nos métodos de ensino, que já não podem ficar presos a modelos tradicionais. É preciso integrar novas tecnologias, dados, análise crítica e ESG como pilares centrais da formação, e não como módulos complementares.
Para que esta transformação seja real, é essencial fortalecer a colaboração entre academia, empresas e profissionais. O setor empresarial tem de assumir um papel mais ativo, criando oportunidades que aproximem os estudantes da prática e clarifiquem as competências que ganharão peso nos próximos anos. Esta ligação direta entre as necessidades do mercado e o processo de aprendizagem ajuda a reduzir o desfasamento que tantas vezes limita a preparação dos recém-licenciados.
Felizmente, já há sinais de mudança. Multiplicam-se os webinars que divulgam a investigação académica mais recente, a adoção de práticas de gamificação que tornam a aprendizagem mais dinâmica, a criação de manuais gratuitos como o Accounting Streams e o uso de métodos inovadores para ensinar conceitos contabilísticos, como a abordagem musical do canal YouTube Accounting Beats. Estas iniciativas mostram que é possível modernizar e difundir o ensino da contabilidade sem perder rigor técnico.
No entanto, para que todo este esforço tenha impacto, é preciso valorizar de forma consistente o papel do contabilista e o ensino da contabilidade. Uma profissão que sustenta a transparência financeira, orienta decisões estratégicas e garante o cumprimento de normas complexas não pode ser vista como um exercício burocrático. A valorização começa na sala de aula, continua nas empresas e deve refletir-se na perceção pública.
Se queremos que os contabilistas “mudem o mundo”, como afirmou a Bastonária, então temos de começar por lhes dar as ferramentas certas. Investir na educação dos futuros profissionais não é apenas reforçar a profissão. Investir na contabilidade e nos contabilistas é investir na competitividade das organizações e na solidez da economia.
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