Grandes amplitudes térmicas e temperaturas muito baixas causam quebra de 70% na produção da cereja no Fundão, gerando um forte impacto económico na região e na fileira deste fruto sazonal.
Se a cereja do Fundão é conhecida por ser doce e fresca, já o mesmo não se pode dizer da campanha deste ano que trouxe um trago amargo com quebras na ordem dos 70% na produção e significativa redução da margem do lucro, estimam produtores, associação de fruticultores Cerfundão e Câmara Municipal.
A causa da forte correção da produção é causada pela grandes amplitudes térmicas e as temperaturas muito baixas, registadas particularmente à noite, durante a floração, notam os especialistas.
Os prejuízos desta campanha da cereja são avultados e com significativo impacto económico numa região que tem uma quota de 60% na cereja nacional e “gera 20 milhões de euros anuais“, começa por destacar o vice-presidente da Câmara Municipal do Fundão, Miguel Gavinhos.
“Sendo um setor emergente na economia nacional, esta quebra de produção na ordem dos 70% traz um prejuízo muito significativo para os produtores“, sustenta o número dois da autarquia. Sobretudo, realça, quando “há famílias da região muito dependentes das campanhas de produção da cereja neste período“.
Estas famílias veem-se agora com “a impossibilidade de comercializarem este fruto sazonal que depois não chega às prateleiras e acabam por não ter o retorno” económico que esperavam, frisa Miguel Gavinhos. Por tudo isto, o autarca considera que “este é um ano atípico para a venda da cereja“.
O produtor João Carvalho, da Quinta do Carvalho, ainda não fechou as contas da campanha da cereja, que decorreu de maio a julho, mas já estima um prejuízo na ordem dos 100 mil euros. “Ainda não fiz as contas, mas perdi aproximadamente 100 toneladas, pois só colhi cerca de 30 toneladas”, calcula o agricultor que vende cereja diretamente ao consumidor e ao Pingo Doce.
Ainda que as dificuldades já não sejam de agora, João Carvalho diz que nunca teve um ano como este. “Temos atravessado anos fracos de produção desde 2017, mas este ano foi muito pior: as chuvas tardias racharam as cerejas e tivemos uma quebra na ordem dos 70% a 80%”, lamenta. Resta-lhe agora “continuar a trabalhar” e uma coisa é certa: “para o ano não arriscar gastar 20 mil euros para tratar a cerejeira” como fez antes desta campanha.
Mas as dificuldades não ficam por aqui: o aumento dos custos na produção, desde os fertilizantes até aos produtos para tratamento deste fruto sazonal, assim como os custos laborais, a reboque da guerra na Ucrânia e da inflação que se faz sentir nos últimos dois anos.
A somar a tudo isto, acrescenta Filipe Costa, gerente da associação de fruticultores Cerfundão, “a elevada carga fiscal que, após uma campanha muito má de produção, deixa as explorações agrícolas com sérias dificuldades em acompanhar este ciclo económico e social”.
Temperaturas baixas quebram produção da cereja
Para o gerente da Cerfundão, “a campanha deste ano foi muito desafiante, quer pela conjuntura económica, quer pelas quebras de produção elevadas na região“. E aponta o dedo às grandes amplitudes térmicas e às temperaturas muito baixas registadas à noite, durante a floração, que provocaram quebras até 70% na produção da cereja do Fundão. “Desde a fase de floração até à colheita, um conjunto de circunstâncias climáticas propiciaram uma quebra dessa magnitude”, começa por explicar ao ECO/Local Online.
Aos armazéns desta organização de produtores certificada — que procede ao embalamento e comercialização da Cereja do Fundão IGP –, só chegaram 300 toneladas deste fruto. “Apenas posso responder pela Cerfundão que das 1.000 toneladas previstas trabalhou apenas cerca de 300 toneladas“, lamenta Filipe Costa.
Um dos produtores que vende para a Cerfundão é Pinto Castelo Branco, da Quinta da Porta, que também se viu confrontado com uma redução da produção no pomar. “Tive quebras de produção de mais de 60%”, mas tudo depende da variedade das cerejas — tem mais de uma dúzia no pomar.
A campanha deste ano foi muito desafiante, quer pela conjuntura económica quer pelas quebras de produção elevadas na região.
A campanha da cereja já terminou, mas à semelhança de João Carvalho, também Pinto Castelo Branco ainda não tem as contas fechadas. Ainda assim, o produtor é perentório em afirmar que “este não foi um ano ideal. Inicialmente parecia ser bom, pois tivemos boas condições meteorológicas durante o inverno. Mas depois, quando já estávamos em abril, houve umas noites com geada que afetaram bastante a produção“.
O gerente da Cerfundão acrescenta, por sua vez, que “já no período de maturação do fruto e junto à colheita, os acumulados de precipitação registados provocaram o fendilhamento das cerejas inviabilizando a sua aptidão comercial”. E, por consequência, um avultado prejuízo nos bolsos dos produtores.
A cereja põe a mexer economia da região
Além da agricultura, a fileira da cereja também põe a mexer outros setores económicos, como a restauração e o turismo, atraindo milhares de pessoas por altura da apanha do fruto.
A cereja tem de tal forma tanta procura que, ao longo dos anos, a Câmara do Fundão tem incentivado à criação de diversos produtos confecionados a partir deste fruto, que vão desde os bombons, passando pela cerveja — a grande novidade deste ano –, até à doçaria tradicional e pratos gastronómicos que contribuem para a dinamização da economia local.
“Temos procurado transformar a cereja num produto não sazonal através da aplicação numa variada gama de produtos, como o pastel cereja do Fundão, o chã, o licor ou uma edição de gelados da marca Santini, que se comercializam durante todo o ano”, adianta o vice-presidente da autarquia.
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Das quebras de 70% na produção da cereja no Fundão ao impacto na vida dos produtores
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