Lista negra é pouco usada para proteger fundos europeus contra a fraude

Das 448 entidades colocadas na lista negra no final de 2020, apenas 18 foram inscritas por insolvência (pelo que é improvável que voltem a candidatar‑se a fundos da UE) e só 2 por fraude e corrupção.

O recurso à utilização de uma lista negra não é eficaz a evitar o pagamento de fundos europeus a pessoas, empresas ou organismos públicos implicados em crimes como a fraude e a corrupção. Esta é uma das principais conclusões do novo relatório do Tribunal de Contas Europeu (TCE), publicado esta segunda-feira

“A lista negra pode ajudar a que os fundos da UE não vão parar às mãos erradas, mas não está a ser usada da melhor forma. O que temos é uma manta de retalhos de diferentes estratégias de exclusão ao nível da União e dos Estados‑Membros”, afirma Helga Berger, membro do TCE responsável pela auditoria, citada em comunicado. “Por outro lado, os dados necessários não estão disponíveis ou não são usados nos registos da lista negra da UE. Esta situação diminui a utilidade e o efeito dissuasor da lista.” Um sistema só tem a qualidade das informações que o compõem”, acrescenta.

A Comissão Europeia tem em funcionamento um sistema de deteção precoce e de exclusão (EDES), que é o único sistema de exclusão ao nível da UE. O EDES sinaliza as entidades de risco aos responsáveis por autorizar as despesas geridas pela Comissão de forma direta ou com parceiros.

Nesta auditoria o Tribunal de Contas Europeu descobriu que o EDES tem “procedimentos de decisão sólidos e inclui uma vasta gama de situações em que as entidades em causa devem ser inscritas na lista negra”. No entanto, das 448 entidades colocadas nesta lista no final de 2020, todas menos 18 tinham sido inscritas por motivo de insolvência (pelo que é improvável que voltem a candidatar‑se a fundos da UE) e apenas duas por fraude e corrupção“, avança o comunicado da instituição liderada por Klaus-Heiner Lehne.

Esta baixa taxa de inscrição na lista negra deve‑se “a falhas nos mecanismos de identificação das entidades em situações de exclusão”, segundo o tribunal, sobretudo, porque a responsabilidade pela exclusão se divide “por muitos serviços da Comissão”. “Estes também enfrentam problemas jurídicos e técnicos para aceder a dados dos Estados‑membros, como os registos comerciais ou criminais. Muitas vezes, têm de confiar nestes dados, porque não existem cadastros ou registos à escala da UE”.

Ainda assim, mesmo quando existem dados pertinentes ao nível da UE, por exemplo sobre investigações de fraude, “estes nem sempre são utilizados ou utilizáveis”, lamenta o Tribunal. “Além disso, a Comissão confia demasiado na palavra dos candidatos a subsídios ou à prestação de serviços: se estes declararem que não estão numa situação de exclusão, a Comissão limita‑se a aceitar os pedidos, sem os verificar”, acrescenta o relatório.

O Tribunal recorda que os Estados‑membros não são obrigados a criar sistemas de lista negra e têm diferentes estratégias para proteger os interesses financeiros da UE. “Esta manta de retalhos de mecanismos de exclusão diminui a eficácia global da lista negra e resulta em níveis desiguais de proteção do orçamento da União consoante o Estado‑membro”, defende o TCE.

O sistema de deteção precoce e de exclusão não se aplica em domínios como a agricultura e a coesão, cuja gestão dos fundos é partilhada entre a Comissão e os Estados‑membros e representa a grande fatia das despesas da UE. Para este último caso o tribunal usou os exemplos de Portugal, Itália, Polónia e Estónia como amostragem da forma como os Estados-membros aplicam as regras de exclusão ao nível dos gastos com a Política Agrícola e a Política.

E se estes quatro Estados membros divulgam publicamente informação sobre o estado de solvência das empresas, a natureza da informação difere entre eles. Por outro lado, os mecanismos para verificar se existem dívidas ao Fisco e à Segurança Social também são diferentes. Na Estónia essa informação é pública e grátis e está disponível online (para dívidas acima de 100 euros); na Polónia também caso as dívidas persistam 60 dias após o início de um processo de revitalização; em Itália existe uma entidade que certifica a não existência de dívidas através de um site, mas o requerente tem de se identificar e, em Portugal, “esta informação está restringida aos utilizadores autorizados das plataforma informática do Governo”, detalha o Tribunal de Contas Europeu, sem no entanto fazer referência à lista de devedores do Fisco e da Segurança Social, onde os contribuintes estão divididos por valor em dívida e singulares ou particulares.

O Tribunal de Contas Europeu sublinha que “a falta de consistência na gestão partilhada dos fundos significa que as contrapartes em situações idênticas podem ser tratadas de forma diferente“. Por exemplo, em Portugal quem tem dívidas de fundos de coesão não pode receber mais apoios comunitários, mas em Itália, a legislação nacional exige que os beneficiários finais recebam luz verde nas verificações anti-mafia e tenham um certificado antes de receberem fundos de coesão ou agrícolas. Já na Estónia, quem é condenada por fraude, corrupção ou outras atividades criminais não relacionadas com fundos europeus podem ser impedidas de receber apoios de Bruxelas.

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