Encerramento de fábrica da Corticeira Amorim apanhou Silves de surpresa
Só na quarta-feira a Amorim Cork Solutions avisou trabalhadores, câmara e CCDR da decisão de fechar a fábrica a 9 de junho. "Para já, ninguém vai sair das suas casas", diz empresa ao ECO/Local Online.
A Corticeira Amorim apanhou de surpresa o Executivo da câmara de Silves e também o presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) Algarve ao anunciar, numa reunião com estas entidades nesta quarta-feira, o encerramento da fábrica da Amorim Cork Solutions naquele concelho algarvio. José Apolinário, presidente da CCDR-Algarve, e Maxime Sousa Bispo, vereador que tem representado a autarquia nas conversações que decorrem há anos com a corticeira para redução da pegada ambiental, assinalam ao ECO/Local Online essa surpresa.
“Fomos ontem apanhados de surpresa com esta decisão, que era inesperada”. A reação do vereador da autarquia de Silves coincide com a do líder da CCDR no que concerne ao termo “tristeza”, utilizado para definir o estado de espírito na região e no concelho onde a fábrica do grupo de Mozelos estava implantada desde finais dos anos 1960, altura em que nasceu a Corticeira Amorim Algarve Lda.
“Estamos tristes. Para lá da tristeza, desolação, até porque Silves tem a tradição da cortiça, é um concelho onde existiam muitas fábricas relacionadas com a indústria corticeira”, refere Maxime Sousa Bispo.
Os trabalhadores foram informados por volta das 7 horas da manhã e a câmara, que esperava reunir-se com o porta-voz da Amorim Cork Solutions na própria quarta-feira, naquela que seria a 16.ª reunião de monitorização, recebeu a indicação do encerramento cerca das 10 horas da manhã.
Aos 31 trabalhadores é dada a oportunidade de passarem a laborar na fábrica de Vendas Novas, a mais de 200 quilómetros, onde se concentrará a produção de produtos de isolamento em cortiça, mas, para já, a empresa não sabe quantos aceitarão a mudança: “não temos expetativas, uma vez que ainda não foram iniciadas as conversas individuais com os trabalhadores”.
“Reconhecendo, no entanto, que esta solução poderá não ser viável para todos, a empresa está disponível para negociar condições justas de indemnização com os trabalhadores que optem por não acompanhar esta transição”, indica fonte da corticeira.
José Apolinário, presidente da CCDR-Algarve nota que a região “precisa de diversificação económica” e que a cortiça é tradicionalmente uma área de atividade da região, mas diz entender a decisão. “Compreendo que é a economia de mercado, mas vejo com tristeza”.
“É o mercado a falar mais alto”, diz executivo da CDU
Há anos envolvida em reuniões, conducentes a medidas de redução da poluição e do ruído da fábrica, envolvendo a câmara e a CCDR Algarve, bem como representantes dos moradores da localidade de Vale de Lama e o grupo hoteleiro Pestana, a Corticeira Amorim surpreendeu ao anunciar o encerramento de uma fábrica onde, segundo apurou o ECO/Local Online, tem feito investimentos avultados para cumprir critérios ambientais.
“A centralização da operação em Vendas Novas beneficiará da maior proximidade da produção às matérias-primas utilizadas e da concentração dos investimentos necessários à obtenção de maior produtividade e competitividade no relançamento do negócio de cortiça expandida”, diz fonte da Corticeira Amorim ao ECO/Local Online, confirmando que apenas na quarta-feira foi comunicada a decisão de encerrar a unidade de produção de cortiça expandida.
Maxime Sousa Bispo expõe os argumentos dados pela empresa à autarquia, entre os quais a indicação da distância face à origem da matéria-prima – mais próxima de Vendas Novas do que de Silves – e também o declínio da procura de aglomerados de cortiça, relacionado com o menor custo de alternativas como lã de rocha e esferovite. Também o aumento da arroba de cortiça nos últimos anos tem provocado custos acrescidos e até prejuízos da fábrica, diz. “É o mercado a falar mais alto”, reconhece o vereador do executivo CDU.
“A decisão de encerramento baseia-se exclusivamente em critérios de busca de maior eficiência operacional”, aponta o autarca, recusando associar esta decisão da Corticeira Amorim às exigências de investimentos em melhorias do desempenho ambiental da fábrica que vêm sendo feitas há anos. “O fecho da fábrica de Silves, ao contrário do que vem sendo dito por algumas pessoas, nada tem a ver com o município de Silves ou com os vizinhos. Se tivessem encomendas, não fechavam a fábrica. O que nos foi comunicado é que é um problema de mercado”, reforça o vereador. Nunca existiu uma ação contra a empresa e “sempre houve preocupação de que fábrica se mantivesse em funcionamento. As pessoas sempre foram sensatas, pacientes, razoáveis, cientes de que os problemas na fábrica não eram de resolução rápida”. O autarca elogia ainda a postura do grupo industrial e dos vizinhos da fábrica.
No âmbito da reorganização interna da Amorim Cork Solutions e da transferência da unidade de produção de cortiça expandida de Silves para Vendas Novas, será proposta a possibilidade de transferência dos 31 colaboradores atualmente em Silves para Vendas Novas. Reconhecendo, no entanto, que esta solução poderá não ser viável para todos, a empresa está disponível para negociar condições justas de indemnização com os trabalhadores que optem por não acompanhar esta transição.
Segundo o vereador da autarquia de Silves, vários trabalhadores, e até cônjuges de outros já falecidos, residem em casas de função da Amorim. A expectativa da autarquia é que os moradores venham a ter direito de preferência na aquisição destes imóveis.
Já a Corticeira Amorim assegura ao ECO/Local Online que “para já, ninguém terá de sair das suas casas – após concluído o processo de transferência, iniciaremos um diálogo com cada um dos moradores para encontrarmos a melhor solução”.
“A solução demonstra alguma sensibilidade social”, reconhece o vereador do Executivo liderado por Rosa Palma.
A poluição e o ruído gerados pela atividade da fábrica corticeira eram há muito contestados pela população vizinha e pelo grupo hoteleiro Pestana, que detém o Silves Golf Resort a escassas centenas de metros a sul da fábrica, ao qual chegavam cinzas e poluição atmosférica.
Em março último, o grupo “Poluição Silves”, com 226 seguidores na sua página do Facebook, dava conta, numa publicação nesta rede social, da realização de uma reunião a 28 de fevereiro na câmara de Silves, na qual os responsáveis da Amorim Cork Solutions se terão comprometido a “não emitir mais fumos ou cheiros para a atmosfera a partir de 1 de julho de 2025”. Uma nova reunião de acompanhamento ficava marcada para a passada segunda-feira, 5 de maio.
Contudo, a reunião acabaria por ser adiada para esta quarta-feira, a pedido da própria empresa, alegando, segundo o autarca de Silves, com a reunião de acionistas do grupo Amorim agendada para dia 6. “Nunca nos foi dito que seria para comunicar o encerramento. Pensávamos que poderia ser por decisões importantes de investimentos que a Amorim Cork Solutions tivesse de desenvolver na fábrica, na sequência de outros investimentos que vinham a ser realizados”, diz ao ECO/Local Online o vereador da autarquia algarvia.
Ao ECO/Local Online, fonte da empresa diz que “será feito um elevado investimentos em Vendas Novas para restruturar o processo produtivo e para melhoria do produto”, sendo que “esse estudo ainda está em curso”.
Quanto ao destino a dar àquela que foi uma das primeiras fábricas do grupo Amorim e era a última das muitas que, em Silves, se dedicaram à cortiça durante décadas, ainda nada está definido, assegura a Corticeira Amorim. Do lado da câmara, Maxime Sousa Bispo diz: “qualquer decisão, terão que falar connosco, até porque somos a entidade com competência no domínio do território”.
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