“É necessário colocar mais o foco nos pagamentos” do PRR

A dois anos do final do prazo de execução da bazuca, Pedro Dominguinhos defende que "há que colocar mais o foco no pagamento". Presidente da CNA sublinha que é necessário responder ao que é urgente.

O presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento (CNA) do PRR, Pedro Dominguinhos, considera que é necessário colocar mais o foco nos pagamentos.

Pedro Dominguinhos reconhece que, “em 2024, houve uma aceleração em termos médios mensais dos pagamentos, mas, se calhar, ainda não com a aceleração necessária”.

Num momento em que o Executivo continua a anunciar medidas para tentar agilizar a execução do PRR, o presidente da CNA alerta: “Ou temos a capacidade de entender o que é urgente para rapidamente poder ajudar na resolução dos problemas, ou estaremos daqui a um ano a falar exatamente da mesma situação”.

O Executivo tem posto a tónica na emergência da aceleração da discussão dos fundos europeus. No entanto, quando olhamos para os níveis de pagamentos aos beneficiários finais pouco ou nada mexeram. O que é que se passa?

Temos monitorizado mensalmente o volume de pagamentos. Notamos que, em 2024, houve uma aceleração em termos médios mensais dos pagamentos, embora, se calhar, ainda não com a aceleração necessária para podermos concretizar mais rapidamente. Devo, no entanto, lembrar que muito dos processos de pagamento dependem da concretização física de procedimentos e o primeiro semestre de 2024 foi particularmente exigente do ponto de vista administrativo.

Na sequência do processo de operacionalização do IVA tem existido uma carga administrativa muito significativa em todos os beneficiários finais e intermediários para, do ponto de vista administrativo, cumprir todos os requisitos que são fundamentais. Muitas vezes, o que tem acontecido é que, enquanto estes requisitos administrativos não estão cumpridos, não é possível proceder a pagamentos.

É por isso que se justifica a alteração publicada em Diário da República, a semana passada, para agilizar o pagamento do IVA?

Também. O que estava a acontecer é que a DGO estava a fazer um entendimento que mesmo que as entidades tivessem saldo, isto é uma questão técnica, tinham de cabimentar uma fonte de financiamento do PRR. E só era possível cabimentar a despesa se tivessem arrecadado a receita, o que se tornava uma impossibilidade. O arrecadar da receita é faseado e a despesa quando se cabimenta é na sua totalidade. Temos de ter a capacidade de perceber a urgência dos problemas. Quando um problema é urgente, tem de ser resolvido de forma urgente.

Esta foi uma situação que a Comissão Nacional de Acompanhamento ainda colocou à Comissão Interministerial do anterior Governo e que demorou praticamente um ano a ser resolvido. Ou temos a capacidade de entender o que é urgente para rapidamente poder ajudar na resolução dos problemas, ou estaremos daqui a um ano a falar exatamente da mesma situação.

O mesmo se passa com a aceleração dos pagamentos. A decisão política é meritória, que seja de até final do ano a análise de pagamentos ser feito em 20 dias. Mas então temos de mudar processos, procedimentos e massa crítica para analisá-los para cumprir os 40 dias.

Em 2024, houve uma aceleração em termos médios mensais dos pagamentos, embora, se calhar, ainda não com a aceleração necessária para podermos concretizar mais rapidamente.

No caso do PRR, a análise das candidaturas deverá ser feita a 50 dias e os pagamentos a 20. Isto será possível?

Nalgumas análises é possível. E os avisos que estão a ser publicados estão exatamente com este prazo. Por outro lado, aquilo que temos verificado em alguns beneficiários intermediários é que estes prazos continuam a não ser cumpridos. Os beneficiários intermediários, quer através da contratação de outras entidades, que está a custar a ser feita, até porque não basta dizer que se vai contratar, porque uma entidade quando quer contratar e lançar um procedimento tem de ter o orçamento disponível e se o orçamento não for suficiente, tem de pedir autorização às Finanças.

O processo volta a emperrar.

Este é um processo que tem de estar todo oleado. Se não fizermos uma análise global do processo… não basta dizermos só que isto vai ser feito desta forma, se não tivermos os meios para o fazer. A Comissão Nacional de Acompanhamento monitoriza mensalmente o prazo médio de resposta dos avisos e tem de haver uma alteração profunda dos procedimentos para que se consiga cumprir.

Naturalmente que o número de concursos que vai abrir é muito mais reduzido do que aquele que já está concretizado e, portanto, é possível. Mas continuam a existir concursos há mais de 200 dias sem resultados. Há que colocar mais o foco no pagamento. Temos 5,16 mil milhões de euros pagos, o que significa que ainda temos de pagar 75%. Se a análise dos pagamentos não for célere é extremamente complexo, sobretudo para as pequenas e médias empresas. Não são apenas os atrasos nos pagamentos, mas muitas vezes a incompreensão da elegibilidade ou não elegibilidade de algumas despesas. É fundamental que os organismos sejam claros e promovam um diálogo construtivo.

O que quer dizer com isso?

Não se pode estar três meses à espera para dar uma resposta e depois enviar todo o pedido de pagamento recusado, muitas vezes porque não se preencheu o campo A ou B, quando se pegava num telefone e rapidamente se alterava esta situação. Ou mudamos esta filosofia ou continuaremos a ter, por parte dos empresários, as declarações que temos ouvido, que continua a ser extremamente complicado e que há demora nos pedidos de pagamento.

Isto é uma exigência muito grande para as entidades públicas, que muitas vezes também lutam, e é importante ter também atenção, com falta de recursos e que precisam naturalmente de reforço, quer dos sistemas de informação, quer das pessoas que o próprio Governo já prometeu que iriam ser contratados. Mas o processo de contratação não é imediato tal como não é o processo de formação. Há aqui uma exigência muito grande sobre as entidades as entidades públicas.

“Ou temos a capacidade de entender o que é urgente para rapidamente poder ajudar na resolução dos problemas, ou estaremos daqui a um ano a falar exatamente da mesma situação”, diz Pedro Dominguinhos.Henrique Casinhas/ECO

A ideia de criar uma unidade móvel, que será alocada à instituição que necessite naquele momento de ajuda, é melhor a melhor solução? Terão capacidade de dominar a especificidade das matérias de cada, de cada programa e de cada e de cada fundo, de forma cabal e atempada?

Este será o grande desafio. As exigências administrativas e regulamentares de cada uma das análises de candidaturas são distintas. Não se avalia uma candidatura do Fundo Ambiental – a energia ou baterias para armazenamento de energia – como se analisa a construção de 33 fogos. Este é o desafio, do ponto de vista da capacidade técnica e de gestão de cada uma dessas equipas, também importa perceber que tipo de tarefas é que elas irão desempenhar: de análise de pagamento, de avaliação de candidaturas?

Porque no caso de avaliação das candidaturas, o senhor ministro Castro Almeida já disse que essa é sobretudo uma tarefa para as instituições de ensino superior. Importa perceber quais as tarefas em que essa equipa móvel poderá ajudar cada um dos organismos, porque nalguns casos, as tarefas são eminentemente técnicas e obrigam a um domínio aprofundado das mesmas. Se fizerem uma análise prévia, poderão libertar os técnicos de cada uma das entidades para análises específicas e que exigem um maior nível de conhecimento. Importa perceber o processo de trabalho que vai ser criado.

E para concluir não queria deixar de perguntar se tem alguma novidade relativamente à posição da Comissão Europeia sobre o quinto desembolso do PRR?

Até agora não existe. Está em análise. A análise da Comissão Europeia não é feita apenas no final, até porque a estrutura de missão também tem uma metodologia de trabalho com a Comissão Europeia, que é particularmente exigente. Há reuniões semanais e não existiram grandes surpresas. A Barragem do Pisão era algo complexo, mas com as declarações ambientais concretizadas pela APA recentemente, dão um grau de segurança superior. Mas, mais uma vez, e o Tribunal de Contas Europeu, aponta isso no relatório, a evidência exigida pela Comissão Europeia nem sempre é conhecida a priori. Temos visto nas nossas visitas ao terreno que muitas vezes os beneficiários finais são confrontados com exigências para as quais não tinham conhecimento previamente.

Um assunto que tem sido pouco falado. Já ultrapassámos metade do PRR. É fundamental começar a olhar para os resultados e para os impactos. Em todos os nossos relatórios alertamos que é fundamental criar uma agenda de avaliação de resultados e de impactos do PRR.

O PlanApp tem um novo presidente – o professor Pedro Saraiva substituiu o professor Paulo Areosa Feio, por jubilação deixou de exercer as funções – mas é essencial que, em articulação com o Governo, se crie esta agenda de avaliação. A Comissão Nacional de Acompanhamento tem publicado recentemente o perfil de investimento em cada uma das regiões. Publicámos também o investimento per capita em cada uma das comunidades intermunicipais e das áreas metropolitanas. E há dados que merecem reflexão.

Como, por exemplo?

Temos visto que há regiões que têm uma capacidade muito significativa de absorção de fundos. A região de Aveiro, de Coimbra, de Leiria, a Área Metropolitana do Porto ou o Alto Alentejo. As três regiões do Centro indiciam que os ecossistemas ou os sistemas regionais de inovação, a articulação entre as empresas, as universidades, o sistema científico e tecnológico, as autarquias, parecem estar mais desenvolvidos do que noutra região. Isto significa que a capacidade de absorção dos fundos depende muito da capacitação dos atores dos territórios e da forma como conseguem articular em rede as candidaturas que concretizam.

Continuam a existir concursos há mais de 200 dias que sem resultados. Há que colocar mais o foco no pagamento.

Este é um programa exigente e muitas vezes as candidaturas já decorreram de relações prévias, de projetos prévios, que são particularmente relevantes. Precisamos de olhar para estes resultados para, numa lógica de complementaridade com o PT2030, não fazermos tábua rasa. Importa aprender alguma coisa com estes investimentos, com a forma como as regiões estão a captar e que tipologia de fundos as regiões estão a captar para perceber também se estão ou não a tentar resolver as debilidades aquando do diagnóstico.

Temos regiões onde, em termos percentuais, a habitação representa um papel muito reduzido. Por exemplo, o Alentejo Litoral tem um forte investimento na área dos cuidados de saúde primários, onde a unidade local de saúde foi capaz de concretizar investimentos. Mas ao nível da habitação, o número de fogos que está previsto reabilitar ou construir é muito reduzido e sabemos os projetos significativos que estão previstos para a região de Sines.

Importa compatibilizar esta análise também para complementar com o PT2030 para perceber até que ponto é que estamos ou não a ir ao encontro e a debelar as dificuldades aquando do diagnóstico. Claro que não podemos obrigar as entidades a concorrer ou a aprovar projetos que não sejam elegíveis ou que tenham mérito. Mas capacitar os atores do território é essencial e não podemos correr o risco de, no futuro, aumentarmos as debilidades em vez de as reduzirmos.

  • Diogo Simões
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