Dimensão não deve excluir empresas do acesso ao PT2030, dizem os patrões
Empresas de maior dimensão só podem aceder ao Portugal 2030 se fizerem “investigação e inovação em cooperação com uma PME” ou se os projetos forem “predominantemente ambientais”.
Uma das novidades do novo quadro comunitário de apoio, o Portugal 2030, é a quase exclusão da elegibilidade das grandes empresas. O Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) vai concentrar os apoios em micro, pequenas e médias empresas que empregam menos de 250 pessoas. Esta limitação é vista com preocupação por parte dos patrões já que temem que os investimentos produtivos fiquem quase excluídos e que se perca o efeito positivo de arrastamento.
“Não é a concentração dos apoios do FEDER nas PME que me preocupa. O que me preocupa é a excessiva limitação do acesso de não PME a esse fundo”, diz ao ECO, António Saraiva. O presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) acrescenta ainda que outro motivo de inquietação é “a incoerência da Comissão Europeia a este respeito”.
O patrão dos patrões lamenta que, “por um lado, se promovam os chamados projetos importantes de interesse europeu comum, aos quais se pretende dar um tratamento privilegiado em termos de ajudas de Estado e, por outro lado, quase que se exclua por completo o acesso das não PME a apoios no âmbito da Política de Coesão”.
“Tenho defendido que a União Europeia deve ser coerente e, sem prejuízo de uma política para as PME que tenha em conta as suas necessidades e características (tratando diferentemente o que é diferente), deixe de discriminar as empresas em função da sua dimensão e as apoie fundamentalmente em função do mérito dos seus projetos”, complementa António Saraiva.
Tenho defendido que a União Europeia deve ser coerente e deixe de discriminar as empresas em função da sua dimensão e as apoie fundamentalmente em função do mérito dos seus projetos.
Posição idêntica tem o recentemente reeleito presidente da Confederação do Turismo de Portugal. “Os apoios ao investimento empresarial devem ter em consideração a estrutura do tecido empresarial, mas não devem excluir, no plano dos princípios, nenhum agente económico em função da sua dimensão”, diz ao ECO Francisco Calheiros. “Os futuros regulamentos de acesso ao financiamento, com recurso a fundos públicos, europeus e ou nacionais, devem ter esta situação em linha de conta e encontrarem as valências e as capacidades que todo o tecido empresarial pode contribuir para o desenvolvimento económico”, acrescenta.
De acordo com o que já se sabe, embora os regulamentos ainda não estejam publicados, as empresas de maior dimensão até podem aceder ao Portugal 2030 se fizerem “investigação e inovação em cooperação com uma PME” ou se os projetos forem “predominantemente ambientais”, contribuindo para “aumentar a eficiência energética, reduzir as emissões e promover as energias renováveis”, como explicou a comissária europeia da Coesão e Reformas, em entrevista ao Expresso (acesso pago).
Elisa Ferreira, nessa mesma entrevista, explicou que há ainda “exceções” para os investimentos feitos nos Açores e na Madeira, já que são regiões ultraperiféricas. Mas também para as small mid cap e mid cap (que empregam até 499 ou três mil trabalhadores, respetivamente), ao nível dos projetos de investigação, desenvolvimento e inovação, sobretudo ligados à inovação e digitalização, e dos “instrumentos financeiros, como empréstimos e garantias”.
Para António Saraiva estas exceções “não são, de todo, suficientes” e o impacto positivo junto das PME não é compensador. “Não estamos perante um jogo de soma nula, em que o que uns perdem, os outros ganham. Isso seria esquecer a importância do efeito de arrastamento de empresas de maior dimensão sobre as PME”, acrescenta o presidente da CIP.
O empresário antecipa “um impacto obviamente negativo” da exclusão das grades empresas do PT2030, “uma vez que serão excluídos projetos relevantes quer do ponto de vista do desenvolvimento local, quer do ponto de vista do grande objetivo do relançamento de uma base industrial mais robusta”. “Quer numa perspetiva, quer noutra, está também em causa o efeito de alavancagem que, reconhecidamente, as empresas de maior dimensão exercem sobre as PME”, sublinhou ainda o responsável.
Francisco Calheiros acrescenta mais um ângulo à discussão: os efeitos da pandemia de Covid-19. “Importa que em tempos de pandemia e pós-pandemia os recursos financeiros públicos sejam afetos à totalidade do tecido empresarial. Caso contrário estaríamos a afastar agentes económicos de um esforço que tem que ser comum e totalmente abrangente”, sublinha o presidente da CTP.
Em tempos de pandemia e pós-pandemia os recursos financeiros públicos sejam afetos à totalidade do tecido empresarial. Caso contrário estaríamos a afastar agentes económicos de um esforço que tem que ser comum e totalmente abrangente.
João Vieira Lopes tem uma visão mais benigna desta limitação. “Tendo em conta que historicamente estão excluídas da generalidade dos apoios e tendo em conta que as grandes empresas poderão participar em alguns projetos estruturantes, não há razão para grandes preocupações”, diz ao ECO o presidente da Confederação do Comércio e Serviços Portugal.
Para o responsável as exceções traçadas nos regulamentos são suficientes e, “tendo em conta as características do tecido empresarial” nacional “faz sentido” privilegiar o acesso das PME ao FEDER. “As PME, nomeadamente por maiores dificuldades de acesso a crédito bancário, precisam dos instrumentos do PT 2030, pelo que pensamos, que, com bons projetos o impacto será positivo”, explica. No entanto, isto “não quer dizer que, para projetos determinados, não seja vantajoso ter também a possibilidade de se integrarem empresas de maior dimensão”, acrescenta Vieira Lopes, cuja confederação representa mais de 200 mil empresas que dão emprego a 1,4 milhões de trabalhadores.
O desenvolvimento de projetos em ligação com PME e universidades não é propriamente novidade. “Já houve no passado alguns projetos que fizeram esta ligação”, recorda Vieira Lopes. “Valorizar as dinâmicas em rede e a cooperação entre empresas é um bom princípio em que todos ganham”, garante.
António Saraiva também não contesta as exigências da Comissão. “Não é a exigência de uma ligação às PME que contesto. Contesto, sim, a crescente e excessiva restritividade no acesso de grandes empresas aos fundos estruturais. Note que estarão praticamente excluídas de apoios ao investimento produtivo”, frisa o presidente da CIP.
Temos muitas dúvidas que possam existir já Programas Operacionais completamente estruturados para o arranque do novo ciclo de fundos estruturais.
Quanto à possibilidade de as empresas poderem aceder ainda este ano ao novo quadro comunitário as opiniões divergem. António Saraiva diz categoricamente que assim o espera, até porque “o Governo tem alimentado a expectativa de abertura dos primeiros concursos no quarto trimestre de 2021” e, “recentemente, a comissária europeia Elisa Ferreira confirmou que há condições para tal”. Na mesma entrevista ao Expresso (acesso pago), a responsável disse que Portugal tem condições para o fazer, tal como o ministro do Planeamento o anunciou, também em entrevista ao Expresso (acesso pago). “Os concursos do Plano de Recuperação e Resiliência deverão começar a ser lançados no segundo trimestre. E os concursos do Portugal 2030 deverão abrir no quarto trimestre de 2021”, disse Nelson Souza.
Neste capítulo é Vieira Lopes que assume a posição pessimista: “Temos muitas dúvidas que possam existir já Programas Operacionais completamente estruturados para o arranque do novo ciclo de fundos estruturais”. “Já existem, no entanto, um conjunto de regras que permitem a antecipação de fundos comunitários, o que é positivo”, conclui o presidente da CCP, numa referência ao mecanismo de antecipação dos fundos europeus pelo Tesouro português que depois é refinanciado pelos fundos que chegarem do React-EU.
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