Reprogramação do PT2030 tem três vantagens, diz Alexandra Vilela, gestora do Compete 2030: reintrodução das grandes empresas; majoração das taxas de apoio de mais 10% e ajudar a acelerar a execução.
A reprogramação do Portugal 2030 vai permitir que as grandes empresas voltem a ser elegíveis para apoio comunitário desde que o investimento seja feito em três áreas específicas: biotech, cleantech e digital, as áreas nas quais a União Europeia quer ganhar autonomia estratégica, e que fazem parte da iniciativa STEP. Os primeiros concursos devem ser lançados no segundo semestre, revelou Alexandra Vilela, a gestora do Compete 2030, no ECO dos Fundos, o podcast quinzenal do ECO sobre fundos europeus.
Para a responsável, a iniciativa STEP tem três vantagens: reintrodução das grandes empresas no âmbito do Compete 2030; ter uma majoração das taxas de apoio de mais 10% para todas as dimensões empresariais – grandes empresas quando elegíveis passam de 30 para 40% e as PME que têm 50 vão poder ter 60% – e ajudar a acelerar a execução dos fundos.
A regra da guilhotina obriga a que o Compete tenha de executar 530 milhões de euros em 2025, um valor que pode, no entanto, sofrer alterações fruto da reprogramação. Reprogramação que permitirá que “o pré-financiamento da Comissão Europeia, que era 2,5%, pode ir até 30%”.
“Vamos refletir isto nos beneficiários, o que vai aumentar a liquidez das empresas: em vez de terem um adiantamento de 10%, têm um adiantamento de 30%, aumenta a liquidez e aumenta a sua capacidade também de executar”, explica Alexandra Vilela
Esta grande alteração vai absorver 1,2 mil milhões de euros da dotação do Compete, mas ainda não está definido o montante que será alocado ao primeiro concurso. A gestora do Compete 2030 revelou ainda “a abertura de um pedido de auxílio” é uma das hipóteses em cima da mesa para que as empresas possam “dar início aos seus trabalhos sem problemas de elegibilidade do efeito incentivo”.
O que muda no Compete com a reprogramação do Portugal 2030?
A nossa proposta de reprogramação, que foi aprovada pelo Comité de Acompanhamento do Programa, seguiu toda a fase de consulta e de participação dos membros do Comité de Acompanhamento e foi submetida em Bruxelas a 28 dia de fevereiro, até antes do prazo de 31 de março. Agora a Comissão fará a sua avaliação. O processo estava desenhado de acordo com aquilo que eram as orientações da Comissão.
É uma reprogramação que muda bastante. Fomos muito ambiciosos. Ambiciosos em termos de dimensão financeira – alocámos a esta reprogramação cerca de um terço da dotação global do programa –, mas sobretudo em termos de ambição estratégica: o foco, a especialização e a seletividade.
Consideramos muito relevante a iniciativa da Comissão Europeia do STEP, de identificar as tecnologias críticas a nível de posicionamento europeu e para a competitividade deste bloco europeu económico.
Tomámos como muito bom ponto de partida — também para o trazer para o domínio nacional — este foco e maior especialização do programa nestas áreas das tecnologias críticas, que são bastante transversais e não estão fora daquilo que Portugal já tem vindo a desenvolver nos últimos anos, desde logo no biotech.
Temos uma indústria farmacêutica e de investigação biomédica muito avançada. Veja-se o nosso trabalho todo com as vacinas, quando foi do Covid, de grandes empresas como a Bial, que produzem medicamentos tecnologicamente muito avançados e que têm implementação no mercado, nomeadamente no mais exigente, que é o mercado americano.
As energias limpas também, com toda a nossa componente de investimento na descarbonização e nas energias renováveis. E depois naquilo que é o deep tech, que é, no fundo, a digitalização, onde também temos competências muito avançadas e de uma forma transversal a suportar a economia.
Olhámos para estas três dimensões do STEP, destas tecnologias críticas, como algo que podíamos trazer para o programa para nos obrigar a focar exatamente nestas três dimensões da atividade económica e trazer estas tecnologias para a atividade económica das nossas empresas. Esta dimensão corresponde a esta ambição estratégica.
A grande novidade é que agora as grandes empresas vão poder concorrer.
Essas são as vantagens… Uma coisa é a ambição estratégica, que faz sentido no nosso entendimento, fazer acompanhar de um envelope financeiro significativo, que permite dar resposta à ambição, mas também tirar daqui vantagens que para nós são muito importantes.
Desde logo, a primeira, como referiu, que é trazer os apoios para as grandes empresas. Foi algo que no processo negocial do PT2030 e do Compete que ainda assegurei, numa fase muito inicial, foi uma das principais discussões em cima da mesa.
Bruxelas foi intransigente?
Absolutamente intransigente, inclusivamente com leituras mais restritivas do papel das grandes empresas no que dizia respeito à investigação, desenvolvimento e inovação. Na inovação produtiva era claro que o regulamento FEDER não incluía as grandes empresas, ficava nas PME.
Mas na nossa leitura, em termos de investigação e desenvolvimento e inovação (I&D&I), poderíamos ter apoios para as grandes empresas sem necessidade de serem em copromoção com PME.
Isto porque as grandes empresas têm um efeito de arrastamento que não é de somenos. Não podemos negar o papel que uma Bosch, que uma Hovione, que uma Bial têm a trazer para si um conjunto de PME que são, no fundo, os seus parceiros depois muito relevantes.
Nesta nova arquitetura as empresas podem ir sozinhas ou continuam a ter de ir com PME associadas?
Sozinhas. O que o STEP vem permitir é trazer para cima da mesa a elegibilidade das grandes empresas. Depois os instrumentos que escolhemos é que as podem obrigar ou não a ter copromoções com PME. O que é que isto permite fazer? Permite ter apoio para a inovação produtiva STEP (biotech, cleantech e digital) para as grandes empresas sozinhas. É uma enorme mais-valia que tínhamos no PT2020 e deixámos de ter no 2030.
Depois optámos por ter um instrumento também no STEP, que já temos e que o Vox Populi batizou das mini-agendas. No fundo é a tal copromoção das grandes com as PME e com os centros de investigação. Vamos manter este formato também no STEP. Não vamos ter I&D apenas com grandes empresas. Se aparecerem são elegíveis, mas temos um grande foco neste instrumento das mini-agendas.

Um modelo bem conseguido no âmbito do PRR?
O que queremos para as mini-agendas é que sejam spin-offs das dinâmicas das agendas do PRR. Não queremos, com certeza, consórcios tão grandes, com uma dimensão tão pesada como aquele que temos no PRR.
Há quem aponte esse erro e que impede uma melhor execução das agendas.
Teve efeitos negativos. Tem muitos efeitos positivos, mas também tem este peso administrativo mais difícil... este dinamismo até nos resultados. É uma coisa mais contida, porque é apenas I&D e inovação produtiva. É trazer para o mercado produtos que nascem de processos de I&D.
A investigação e desenvolvimento têm de começar em estágios mais elevados. TRL mais altos, para que no espaço de 36 meses consigamos ter provas de conceito, pilotos e mercado. É isso que queremos com as mini-agendas.
Voltando ao STEP, vamos ter inovação produtiva, PME naturalmente, são sempre elegíveis, mas passamos a ter a elegibilidade plena das grandes empresas e este instrumento das mini-agendas em cada uma destas três áreas STEP. É aqui o nosso foco.
Quando será possível lançar os primeiros concursos?
No plano de avisos, que foi aprovado para o segundo quadrimestre, está previsto ser lançado no segundo semestre. Isto tem a ver com a formalização do processo de reprogramação, com o desenvolvimento dos instrumentos, da regulamentação específica.
No segundo semestre também vamos passar o período das férias, que não é bom para a atividade económica, mas queríamos que antes das férias já ter cá fora as regras para que as empresas tenham conhecimento e possam preparar os seus projetos para setembro começarmos a dar fogo à peça.
Haverá a possibilidade de as empresas manifestarem o interesse em candidatar-se para poderem ir avançando logo com os investimentos?
Sim, essa é uma das hipóteses, que é a abertura de um pedido de auxílio para poderem dar início aos seus trabalhos sem problemas de elegibilidade do efeito incentivo. A reintrodução das grandes empresas no âmbito do Compete 2030 é uma das vantagens, mas não é a única.
Qual é a outra?
O STEP permite ter uma majoração das taxas de apoio de mais 10% para todas as dimensões empresariais. Temos um mapa de auxílios regionais que limita os apoios às grandes empresas, quando elas são elegíveis, a 30%, vamos poder dar 40. E as PME que têm 50 vão poder ter 60.
Esta majoração de mais dez pontos percentuais é para todas as empresas que tenham projetos STEP. Portanto, os eixos STEP que vamos introduzir no Compete são eixos com financiamento acrescido em termos dos valores de incentivo a conceder, o que é um enorme incentivo ao investimento. É isso que queremos: promover o investimento.
Temos um mapa de auxílios regionais que limita os apoios às grandes empresas, quando elas são elegíveis, a 30%, vamos poder dar 40. E as PME que têm 50 vão poder ter 60.
Qual será a dotação do primeiro concurso?
Ainda não temos as dotações. Temos valores muito elevados…
A iniciativa em si é de 1,2 mil milhões de euros.
Sim, 1,2 mil milhões no conjunto. Ainda não temos a afetação por instrumento, nem por… Temos uma primeira camada de instrumentos que estão no eixo 1.6, que são os dedicados à biotecnologia e ao quântico, e depois temos um eixo que está no OP2, na parte da descarbonização ligada às energias limpas. São muito diferentes.
As dinâmicas das empresas são muito diferentes. Temos muitas intenções de investimento, por exemplo, nos setores estratégicos, que é uma linha de financiamento da AICEP, com verbas nacionais que já podem ser trazidas para financiamento comunitário, que é altamente vantajoso. São menos projetos, mas são projetos de maior envergadura financeira.
De que forma é que isto se conjuga com o apelo da Comissão Europeia, já em abril, de que gostaria que os Estados-membros dedicassem parte das suas verbas da coesão a investimento de defesa e também de habitação acessível?
Essa foi a perplexidade, porque foi a 1 de abril, no dia seguinte ao limite regulamentar, que tínhamos de cumprir, para apresentar a reprogramação até 31 de março. Se não o fizéssemos estávamos em incumprimento, a opção do Estado-membro, e bem, foi cumprir o regulamento que conhecemos hoje. Foi com alguma surpresa que a 1 de abril, o vice-presidente Vito publicou uma comunicação com estas orientações e já com um protótipo de regulamento que ainda tem de ir ao Conselho.
Portanto, não sabemos quanto desta nova orientação da Comissão Europeia vai ganhar vida regulamentarmente e se passa nestes exatos termos, porque ainda terá que ser discutida em Conselho Europeu. Portanto, não temos muita certeza do que vai acontecer. A Comissão, no protótipo de regulamento que publicou no dia 1, permite que os Estados-membros retirem a sua reprogramação apresentada e submetam uma nova. Mas ainda é muito prematuro porque não conhecemos exatamente os termos daquilo que vai ser elegível na defesa e na habitação.
A defesa é um caso muito paradigmático, porque Portugal tem uma excelente tradição de financiar a defesa – não na compra de equipamento militar, naturalmente essa não é elegível – mas, por exemplo, em projetos de investigação, tecnologias que são de duplo uso e que têm sido muito bem aproveitadas para o setor da defesa.
O caso mais conhecido são os drones da Tekever, que nascem de projetos investimento produtivo que depois permitiram, de facto, hoje ter uma produção de drones que são aplicados hoje em dia na guerra da Ucrânia. Hoje a Tekever é uma small mid cap, cresceu. Ainda bem. É isso que queremos que as empresas façam: crescer.
Portanto, ainda temos de estudar muito bem quais são as alterações regulamentares que a Comissão Europeia vai introduzir. É um anúncio, tem uma proposta de regulamento, mas ainda estamos muito longe de podermos transpor para a ordem interna. Quando chegar, temos de analisar, de facto, o que vamos fazer nesta reprogramação.
Poderá ajudar a cumprir o objetivo que o primeiro-ministro anunciou de antecipar a meta de dedicar 2% do PIB à defesa. E também ajudar a resolver parte do problema da habitação, que não será tanto no âmbito do Compete.
Não será tanto no Compete, mas será muito importante ser endereçado pelos fundos estruturais.
Temos muitas intenções de investimento nos setores estratégicos, que é uma linha de financiamento da AICEP, com verbas nacionais que já podem ser trazidas para financiamento comunitário, que é altamente vantajoso. São menos projetos, mas são projetos de maior envergadura financeira.
A reprogramação do Compete permite-se também responder a um outro problema, que é acelerar a execução do programa.
Essa é a terceira vantagem. A primeira é as grandes empresas, a majoração da taxa de incentivo e depois o pré-financiamento que passa de 10 para 30%. Sobretudo o pré-financiamento da Comissão Europeia, que era 2,5% e pode ir até 30%. Vamos refletir isto nos beneficiários, o que vai aumentar a liquidez das empresas: em vez de terem um adiantamento de 10%, têm um adiantamento de 30%, aumenta a liquidez e aumenta a sua capacidade também de executar.
Se combinarmos isto com a possibilidade de terem adiantamentos garantidos, que é outra medida que vamos lançar nos próximos dias com o Banco de Fomento, então aí temos condições de gerar liquidez muito significativa para a execução do 2030 que é de facto este o problema neste momento, até pela regra N+3.
Quanto é que o Compete tem de executar neste ano de 2025 para não perder nenhum euro em virtude da aplicação da regra da guilhotina?
Depende da reprogramação, ou seja, depende desta reafetação. Na atual programação, tínhamos uma regra muito exigente de 530 milhões de euros.
Em 2025?
Em 2025, no atual contexto. Temos de ter consciência de que a programação 21/27 teve programação em 21 e 22 e o programa só arrancou, na realidade, em 23. A decisão é de 2022. Temos dois anos orçamentais que contam decisivamente para o N+3, que não existiram na realidade.
Essa é uma das questões que está em estudo pela Comissão Europeia, que é a duração deste período de programação poder ser arrastada até 28, tomando em conta que nenhum país europeu executou nada em 2021. Esta regra que ainda não saiu do papel, ainda está na regulamentação, nestes termos, põe-nos esta fasquia de 530 milhões de euros, o que é elevadíssimo.
É manifestamente impossível?
Não diria que é manifestamente impossível, porque estamos a fazer todos os possíveis para a tornar possível. Seja com a reprogramação, seja com os adiantamentos garantidos. Sim, os adiantamentos garantidos de 40% são uma forte alavanca para a execução, quer seja através do lançamento de instrumentos financeiros, que também vamos lançar muito em breve com o Banco de Fomento.
Nos instrumentos financeiros, por exemplo, o modelo híbrido, combina subvenção com grant. O próximo aviso de inovação produtiva vai ter este modelo já obrigatoriamente, e os instrumentos financeiros também aumentam a percentagem de adiantamento certificável como execução.
Temos aqui um conjunto, um mix, de instrumentos que vão permitir aumentar a execução, para além da própria execução efetiva das empresas, que também já está a acontecer.
Depende da reprogramação, ou seja, depende desta reafetação. Na atual programação tínhamos uma regra muito exigente de 530 milhões de euros.
Receia que esta guerra comercial que estamos a viver com os Estados Unidos introduza um stress adicional na capacidade de execução das empresas?
Claro que receamos, por isso é que hoje [quinta-feira] foi lançado um programa de estímulos muito significativo, sendo que a maior parte é subvenção. Não vou entrar em detalhes porque foi anunciado hoje pelo sr. primeiro-ministro e pelo ministro da Economia, e os detalhes serão depois divulgados.
O que vamos tentar é contrariar a tendência natural de quem investe em ambiente menos seguro, investe menos. Nós reagimos assim.
Fiquei com a perceção de que o dinheiro é exatamente o mesmo, sobretudo ao nível do PT2030, e só é antecipada a sua disponibilização no terreno.
O PT2030 terá uma colaboração muito marginal neste plano, porque a maior parte são instrumentos do Banco de Fomento. Mas não vou aprofundar, porque ainda não temos estes detalhes e não sou a pessoa certa.
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Grandes empresas vão ter apoios do PT2030 para investir em biotech, cleantech e digital
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