O futuro do Cluster AED: onde estamos, que desafios enfrentamos e como poderá estar o setor em 2030

  • José Neves
  • 16:01

O setor encontra-se num momento decisivo, combinando uma base industrial alargada, um corpo académico dinâmico e crescente atratividade para investimento internacional.

O ecossistema português da Aeronáutica, Espaço e Defesa (AED) vive hoje um momento de transformação profunda. A última década consolidou empresas, centros de engenharia, universidades e entidades públicas num cluster que representa milhares de postos de trabalho qualificados e uma capacidade tecnológica com reconhecimento europeu. Portugal deixou de ser apenas um fornecedor periférico para assumir um papel ativo em programas internacionais, destacando-se em domínios como estruturas aeronáuticas avançadas, sistemas críticos, desenvolvimento de software, observação da Terra, segurança e defesa.

No setor aeronáutico, essa evolução tem sido particularmente visível. Portugal afirma-se hoje como país de referência na produção de drones, com empresas que exportam sistemas não tripulados para aplicações civis, industriais e de defesa. Na área das aeroestruturas, consolidou-se como um fornecedor mundial de confiança, combinando engenharia avançada, materiais compósitos e processos de produção altamente qualificados. A construção do LUS-222, a primeira aeronave inteiramente desenvolvida e produzida em Portugal, é um marco simbólico e estratégico na ambição nacional de escalar a indústria aeronáutica.

A par destes avanços, o país está também a reforçar um pilar determinante para o crescimento futuro do setor: o MRO – Maintenance, Repair and Overhaul. Num contexto de forte expansão da aviação comercial e regional, a necessidade global de manutenção altamente especializada cresce exponencialmente. Portugal combina uma localização geográfica privilegiada, mão de obra qualificada e infraestrutura aeroportuária capaz de atrair operadores internacionais.

O ecossistema Espacial nacional cobre atualmente grande parte da cadeia de valor, com participação ativa em programas internacionais e capacidades que vão da integração e teste de satélites ao desenvolvimento de novas constelações. O país tem vindo a consolidar competências em engenharia, propulsão, materiais avançados, instrumentação ou comunicações, demonstrando solidez técnica e capacidade de inovação em múltiplos segmentos da atividade espacial.

Mas estes avanços não escondem os desafios. O setor enfrenta uma dupla pressão: por um lado, a necessidade de responder às exigências de descarbonização e inovação acelerada; por outro, a urgência de reforçar massa crítica, escalar empresas e captar investimento para competir em cadeias de valor cada vez mais integradas.

Consciente dos desafios da próxima década, o Cluster projetou o seu plano estratégico para reforçar a competitividade e sustentabilidade do setor. O plano define prioridades claras: aposta em mobilidade aérea avançada, aviação sustentável, novos sistemas autónomos e eletrificados, e na transição da manutenção preventiva para a preditiva. Estabelece ainda metas robustas de investimento em I&D para duplicar o volume de negócios do setor até 2035.

O ecossistema Espacial nacional cobre atualmente grande parte da cadeia de valor, com participação ativa em programas internacionais e capacidades que vão da integração e teste de satélites ao desenvolvimento de novas constelações. O país tem vindo a consolidar competências em engenharia, propulsão, materiais avançados, instrumentação ou comunicações, demonstrando solidez técnica e capacidade de inovação em múltiplos segmentos da atividade espacial.

Neste percurso, o AED Cluster Portugal reforça que o investimento de Portugal na ESA é essencial para capacitar a indústria e validar tecnicamente e comercialmente os produtos desenvolvidos no país.

O acesso ao espaço ganhou novo impulso com a criação de condições para operações a partir dos Açores, enquanto o ground segment se torna mais robusto com novas infraestruturas, teleportos e centros de controlo. Paralelamente, a operação de satélites nacionais e o crescimento do segmento downstream, apoiado por programas de incubação e por uma rede de centros tecnológicos, têm impulsionado o surgimento de novos serviços e aplicações com impacto em múltiplos setores da economia.

No domínio da Defesa, Portugal não pode perder mais tempo. Num contexto geopolítico volátil, a autonomia estratégica deixou de ser ambição europeia para se tornar necessidade vital. Investir bem na Defesa significa muito mais do que adquirir equipamentos: é mobilizar um ecossistema inteiro de engenharia, eletrónica, software, comunicações, materiais avançados, cibersegurança e sistemas autónomos — incluindo drones e capacidades de guerra eletrónica — com impacto direto na competitividade industrial.

O setor encontra-se num momento decisivo, combinando uma base industrial alargada, um corpo académico dinâmico e crescente atratividade para investimento internacional. Para garantir um desenvolvimento sustentável, será fundamental consolidar a oferta industrial e reforçar a capacidade de integrar sistemas complexos, assegurando competitividade nas cadeias globais de fornecimento.

No domínio da Defesa, Portugal não pode perder mais tempo. Num contexto geopolítico volátil, a autonomia estratégica deixou de ser ambição europeia para se tornar necessidade vital. Investir bem na Defesa significa muito mais do que adquirir equipamentos: é mobilizar um ecossistema inteiro de engenharia, eletrónica, software, comunicações, materiais avançados, cibersegurança e sistemas autónomos — incluindo drones e capacidades de guerra eletrónica — com impacto direto na competitividade industrial. Tal como no setor espacial, cada euro investido multiplica valor, cria emprego altamente qualificado e posiciona Portugal nas cadeias de valor que se estão a reconfigurar à escala europeia.

É por isso crucial negociar de forma assertiva a participação nacional no programa europeu SAFE, destinado a reforçar a produção de munições, capacidades críticas e resiliência industrial. Sem um posicionamento industrial forte, Portugal arrisca ficar na periferia de um dos maiores investimentos industriais de defesa das próximas décadas. Participar ativamente no SAFE significa consolidar competências e garantir que as empresas nacionais têm acesso a importantes cadeias de fornecimento internacionais que irão moldar o futuro da base tecnológica e industrial de defesa europeia.

A Defesa é hoje um motor tecnológico — dos sistemas autónomos à inteligência artificial — e Portugal tem condições para assumir um papel mais relevante, desde que adote uma estratégia de investimento orientada para a indústria, com previsibilidade, continuidade e foco na soberania tecnológica. Não se trata apenas de reforçar capacidades militares, mas de ativar um verdadeiro acelerador industrial para o país.

Os próximos cinco anos serão decisivos. O setor estará marcado por três tendências:

  • Consolidação industrial e crescimento de empresas âncora
    O ecossistema precisará de maior escala para captar investimento direto e assumir projetos tecnológicos mais ambiciosos. Portugal tem condições para criar polos industriais de referência europeia.
  • Aceleração da transição sustentável
    Os combustíveis sustentáveis e a digitalização dos sistemas críticos serão inevitáveis. O Cluster AED ambicionar ser um dos motores da implementação de uma nova sustentabilidade para a aviação, tanto ao nível Nacional como Europeu.
  • Talento e internacionalização como fatores críticos
    Atrair e reter engenheiros será determinante. A participação ativa em programas europeus de referência continuará a ser essencial para garantir competitividade tecnológica.

Se Portugal aproveitar este momento, o setor AED poderá tornar-se um dos mais estratégicos da economia nacional: exportador, inovador, altamente qualificado e capaz de integrar cadeias de valor globais. A próxima década será de escolha: ou crescemos para competir, ou ficamos confinados a nichos. O caminho está aberto — falta agora garantir visão, escala e continuidade. Uma articulação forte, e frutífera, entra todos os atores nacionais, é a fórmula para o sucesso de Portugal.

  • José Neves
  • Presidente do AED Cluster Portugal

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