Primeira obra do Ferrovia 2020 abre buraco na Linha do Norte. Viagem Lisboa-Porto já demora mais de 3 horas
Abatimento de talude entre Souselas e Pampilhosa obriga a mais limitações de velocidade e leva viagem de comboio Porto-Lisboa a demorar mais de três horas.
A linha de comboio em Souselas está presa por arames. O abatimento de um paredão no lugar de Marmeleira, quilómetro 228,150 da Linha do Norte, obrigou a suspender a circulação numa das vias entre as estações de Souselas e Pampilhosa. O problema é que este troço faz parte da primeira obra a ficar concluída do plano de investimentos Ferrovia 2020 mas não sofreu uma intervenção profunda durante o período de obras.
A situação tem consequências na circulação de comboios na mais importante linha ferroviária do país. Por causa das limitações de velocidade, a viagem Lisboa-Porto passa a demorar mais do que três horas e fica menos competitiva face ao autocarro. Além disso, o problema não é de fácil resolução, conforme o ECO apurou junto de dois especialistas em geotecnia, que pediram para não ser identificados.
O problema na linha aconteceu na antevéspera do final do ano. Na manhã de 30 de dezembro, depois de uma noite de chuvada, foi suspensa a circulação de comboios entre Pampilhosa e Souselas na via descendente, para Lisboa. A via ferroviária ficou inundada e desnivelada, ao ponto de parte dos carris e das travessas ter deixado de estar assente na plataforma e sem cobertura de pedra britada (balastro). Houve um abatimento do terreno do aterro colocado debaixo da linha. Sem interromper a circulação, haveria o risco de um comboio tombar à passagem pelo local.
As chuvas vieram agravar uma situação que já estava a ser monitorizada pela Infraestruturas de Portugal (IP). A empresa pública que gere as linhas de comboio estaria mesmo a preparar uma intervenção profunda no local mas não havia sequer projeto de obra nem calendário, segundo documentos disponibilizados na página da IP consultados pelo ECO.
Os problemas no lugar de Marmeleira poderiam ter sido evitados caso as obras neste troço da Linha do Norte tivessem contemplado o tratamento do talude ou mesmo a construção de uma variante no local e que chegou a ser avaliada ainda nos tempos da Refer, antecessora da IP. Em vez disso, a empresa pública preferiu limitar as obras a uma renovação integral de via, que não é mais do que uma operação de manutenção pesada da linha do comboio e que limita-se a mudar balastro, travessas, carris e materiais de fixação e ligação.
Investimento do Ferrovia 2020 começou…em 2014
O local, onde parte do paredão caiu, fica a 2,5 quilómetros da Pampilhosa, estação que liga a Linha do Norte à Linha da Beira Alta. Pampilhosa é um dos extremos do primeiro troço que foi para obras, ao abrigo do programa de investimentos Ferrovia 2020 – apresentado em fevereiro de 2016. A ligação entre Alfarelos e Pampilhosa do Botão foi contemplada com um projeto de modernização no valor de 105,9 milhões de euros, com mais de 70% de financiamento europeu. Estava previsto que as obras decorressem entre março de 2016 e o terceiro trimestre de 2017. No entanto, a obra foi dividida em duas fases.
O concurso público para a primeira fase da obra foi lançado em 25 de março de 2014, ainda como medida do Plano Estratégico dos Transportes e Infraestruturas, elaborado pelo Governo de Pedro Passos Coelho e ainda prévio ao nascimento da IP. O PETI3+, com horizonte de 2015 a 2020, foi o antecessor do programa Ferrovia 2020. O contrato para a obra foi assinado em 29 de outubro de 2015, apesar de só ter sido publicado no portal Base em outubro de 2016.
A primeira fase contemplou, a nível de engenharia civil, “trabalhos de estabilização de vários taludes, de melhoria dos sistemas de drenagem e de instalação de vedações ao longo do troço”, além do “alteamento e prolongamento das plataformas de embarque em 3 estações e 5 apeadeiros”, segundo informação da IP. Esta fase decorreu em 35 quilómetros de via e implicou um investimento de mais de 30 milhões de euros. Os trabalhos apenas ficaram concluídos em junho de 2018, mais de meio ano depois do prazo inicial.
A segunda fase das obras ainda não está concluída e prevê um investimento de mais de 60 milhões de euros. Inclui a construção de várias passagem superiores, a ampliação de linhas de resguardo e a reconversão do edifício de sinalização em edifício de passageiros em Alfarelos.
Já depois das obras do Ferrovia 2020, também houve problemas no quilómetro 229 da Linha do Norte, perto da estação da Pampilhosa: a IP teve de fazer obras, no final de 2021, para estabilizar uma colina com cerca de 17 metros de altura.
Quanto aos problemas no lugar de Botão, a IP está a fazer uma intervenção provisória de estabilização da infraestrutura mas que não resolverá todos os problemas no local. Depois do inverno, será necessário intervir a sério no talude e, no limite, sanear o aterro, trocando os resíduos lá depositados por materiais mais compostos. Só assim a viagem de comboio Porto-Lisboa poderá voltar a demorar menos de três horas.
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