Incentivos à reciclagem sim, mas é preciso mais fiscalização
Na 1ªconferência ECO Cidade, em parceria com a Sociedade Ponto Verde, os vários intervenientes concordaram com a implementação de um sistema de gestão de resíduos assente em incentivos.
A vereadora da câmara de Mafra, Lúcia Bonifácio, considerou que “a Taxa de Gestão de Resíduos (TGR) vai ser uma das grandes impulsionadoras para que os municípios possam fazer mais” pela sustentabilidade ambiental. Mas, além de uma política de incentivo, mediante a aplicação de um sistema de compensação e reembolso, o Governo deve “dar mais poder às câmaras para que possam penalizar quem deposita indevidamente lixo na envolvente dos contentores”. Além de haver mais fiscalização, que “está a ser descurada”.
“Se o município olhar para ela [devolução da TGR] como algo que pode dignificar e implementar no seu território, poderá ser por aí” a solução para o problema da gestão dos resíduos urbanos, assinalou Lúcia Bonifácio, durante a primeira conferência ECO Cidade que aconteceu esta terça-feira, em Mafra. E que resulta de uma parceria entre o ECO, o Local Online e a Sociedade Ponto Verde (SPV) com a sustentabilidade e reciclagem como temas centrais.
Para a vereadora Lúcia Bonifácio, o sistema de gestão de resíduos assente em incentivos “é o caminho para que os cidadãos cooperem” e o município possa cumprir as metas de reciclagem. O concelho já tem trabalho feito nesse sentido, como é o caso do projeto piloto “Mafra Reciclar a Valer + Rua a Rua” que atribui um incentivo aos utilizadores, com recurso à tecnologia Recysmart que está incorporada em 20 ecopontos inteligentes. Os cidadãos que colocarem as embalagens no ecoponto correto ganham pontos no “Cartão Mais” que podem ser depois trocados por descontos no comércio local.
Em três meses de projeto no terreno, a autarquia já recolheu cerca de 150.000 embalagens, contabilizou a autarca. Face aos bons resultados, Lúcia Bonifácio acredita que este programa pode abranger todo o concelho.
A implementação de um sistema de gestão de resíduos assente em incentivos em vez de alicerçado em taxas é igualmente defendida por Ana Isabel Trigo Morais, CEO da SPV, dando como exemplo o projeto de Mafra. “Temos que evoluir para os sistemas dos incentivos económicos. Temos de incentivar e premiar o cidadão e isso já acontece em Mafra”.
Temos que evoluir para os sistemas dos incentivos económicos. Temos de incentivar e premiar o cidadão e isso já acontece em Mafra.
Ana Trigo Morais elogiou, por isso, “o sistema de depósito e reembolso das embalagens que traz altos níveis de cumprimento de metas de reciclagem”. Acresce ainda a vantagem de os resíduos não serem depositados nos aterros e “ganhar-se muita matéria-prima para poder valorizar economicamente”, num processo alicerçado na economia circular. Mas urge, contudo, avançar com “monitorização e recolha de dados” com vista a uma melhor e mais eficaz gestão dos resíduos.
A gestora destacou ainda o papel da SPV como “grande acelerador de inovação, de colaboração e de parcerias no setor dos resíduos da embalagem”. Deu nota de que nos últimos três anos a sociedade desenvolveu o programa Re-source que contou com a participação de mais de 140 parceiros de 49 países.
Ainda assim, há muito caminho a trilhar nesta matéria em Portugal. “Historicamente o país não cumpre as metas de reciclagem de resíduos urbanos”, apontou a CEO da SPV, avisando que as soluções não podem ser iguais para todo o território. “Fazer recolha de recicláveis numa zona de turismo, como é o Algarve, não é igual a fazer, por exemplo, na região de Mafra”, explanou.
Apesar de já haver no terreno bons exemplos de gestão de resíduos, Ana Trigo Morais defendeu que “o país tem de fazer grandes investimentos para que a gestão dos seus resíduos retorne na criação de valor económico e na eliminação de défice ambiental”. Apologista da criação de um observatório nacional para o setor dos resíduos, de modo a haver mais transparência na cadeia de valor, a gestora apontou ainda a necessidade de um hub de inovação com vista a um melhor desempenho ambiental e económico.
Para Ana Trigo Morais, “o setor dos resíduos e da gestão dos resíduos urbanos tem sido o parente muito pobre”, sendo precisa uma “linha clara que oriente todos os intervenientes neste processo da reciclagem”. A CEO da SPV vai mais longe: “Poderíamos estar a aproveitar melhor o potencial da economia verde e da industrialização verde”.
Já para Beatriz Freitas, secretária-geral da AIVE, “não faz qualquer sentido continuarmos a ter uma taxa de gestão de resíduos associada ao consumo de água”. Durante a sua intervenção, a responsável destacou o facto de “Portugal ser o maior produtor per capita de embalagens de vidro da Europa”.
Em vez de pagarmos por aquilo que não separamos, beneficiamos com aquilo que separamos. E isso é um incentivo positivo.
O sistema de incentivos também acolheu a aprovação do presidente da Tratolixo – empresa intermunicipal de tratamento de resíduos em Cascais, Mafra, Oeiras e Sintra. “Em vez de pagarmos por aquilo que não separamos, beneficiamos com aquilo que separamos. E isso é um incentivo positivo”. Nuno Soares disse que existem evidências do sucesso desta estratégia. “Os livros e as experiências demonstram que traz mais resultados.” Para o responsável, não há tempo a perder para colocar a medida no terreno. “Temos um prazo que é curto para, se quisermos aplicá-lo, vermos resultados até 2030 e atingirmos as metas”, assinalou.
Nuno Soares defendeu um sistema sustentável do ponto de vista ambiental e ao nível dos custos inerentes à gestão dos resíduos. “Quem paga somos todos nós e ainda nos falta pagar uma parte, neste caso 15% não são repercutidos no utilizador final”, alertou.
Já antes o presidente da câmara de Mafra, Hugo Moreira Luís, lamentou “não conseguir repercutir no cliente final todo o encargo que a câmara tem na recolha e no tratamento” dos resíduos. “Quer isto dizer que em Mafra nós estamos com 85% da transferência deste gasto para o utente, portanto os outros 15% são compensados pela parte dos impostos”, detalhou.
Voltando à Tratolixo, Nuno Soares referiu que a empresa intermunicipal transforma os biorresíduos recolhidos em energia elétrica a partir do biogás produzido. “Vendemos diariamente para a Rede Elétrica Nacional (REN) o suficiente para abastecer quinze mil pessoas”, detalhou, adiantando que em 2030 deverão atingir os 23 mil utilizadores.
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