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Na publicidade, os mais velhos não entram. Uma oportunidade perdida para as marcas?

Rafael Ascensão,

A população mais velha é uma minoria nos anúncios, embora tenha maior poder de compra e seja um segmento em crescimento. Como devem as marcas agir para cativar este target?

  • Este artigo integra a 14.ª edição do ECO magazine. Pode comprar aqui.

Até 2050, o número de pessoas com mais de 60 anos deverá atingir os 2,1 mil milhões e superar o de crianças com menos de 15 anos. Apesar da dimensão deste público-alvo, há uma sub-representação crónica deste grupo etário na indústria do marketing e publicidade. E mesmo quando surge nos anúncios, é de forma estereotipada. Mas esta pode ser uma oportunidade perdida para as marcas: esta ‘nova geração’ de mais velhos não só tem mais poder de compra, como é cada vez mais digital, e influencia as decisões de compra de gerações mais novas.

O público sénior tem sido negligenciado “por razões estruturais”, acredita Marta Castro. Uma delas passa pela falta de pessoas mais velhas nas equipas de marketing e publicidade, o que “significa que a maior parte das campanhas são criadas por pessoas que dificilmente entendem verdadeiramente as necessidades, desejos e expectativas de um grupo que responde em Portugal por 50% do consumo privado”, afirma a diretora de marca e marketing da Wells.

Visão partilhada por Mónica Chaves. O setor sempre foi “obcecado pela juventude”, com as pessoas mais velhas a representar uma minoria nas agências europeias, com menos de 10% dos trabalhadores com mais de 45 anos. Isto leva a que “a generalidade dos profissionais não se identifiquem com o target, não o compreendam e não percebam as suas necessidades e desejos”, comenta a CEO da Idade Maior, consultora que se foca no segmento sénior.

Existe ainda um “preconceito generalizado” na sociedade em relação ao envelhecimento, que se reflete na indústria da publicidade, onde está “enraizada” a ideia de que “é mais sexy falar para os jovens e mostrar corpos e rostos intocados”, refere Marta Castro. A responsável da Wells aponta ainda para um “medo infundado” de que comunicar para um público mais velho “possa alienar os consumidores mais jovens, o que não é necessariamente verdade”, exemplificando com a campanha da Wells sobre a menopausa, que “não só foi um sucesso como também ressoou entre as mulheres mais jovens”.

E mesmo quando presentes na publicidade, as representações dos mais velhos são “por vezes marcadas por paternalismo e idadismo”, com as quais “o core target não se identifica, não se reconhece, não se inspira e não estabelece uma ligação emocional”. “Não tocam o coração das pessoas mais velhas, pelo que não criam impacto nem engagement com as marcas e, consequentemente, não vendem”, alerta Mónica Chaves.

Mas este “idadismo” das marcas pode não só afastar a população mais velha como também os mais jovens. “A geração Z, por exemplo, é muito mais consciente em relação a questões de preconceito e estereótipo, e espera que as marcas sigam esses valores. Se uma marca insiste em ignorar estes consumidores ou reforçar estereótipos, isso pode ser prejudicial junto dos mais jovens”, indica Marta Castro.

Mais otimista, Alexandra Queirós, responsável de comunicação da Centromarca, acredita que embora haja caminho a percorrer, “as marcas estão a dar passos na direção certa, com a criação de linhas de produtos específicas para atender às necessidades dos mais velhos e na reformulação das estratégias de marketing para uma comunicação mais eficaz”. Mas “ignorar o poder de compra dos séniores, que estão cada vez mais conectados e informados, pode, de facto, ser um erro estratégico”, pois além da dimensão e da sua força de mercado, também influenciam as compras das gerações seguintes.

O que devem as marcas fazer?

A inclusão nas equipas de pessoas mais velhas que se identifiquem e compreendam este target é o primeiro conselho que Mónica Chaves deixa às marcas. É “urgente que as empresas detentoras de marcas adquiram um conhecimento aprofundado destas novas gerações”, diferentes das gerações mais velhas que as precederam, recomenda.

Aprofundar o conhecimento deste tipo de cliente é também o conselho de Marta Castro, que aponta para a necessidade de promover representações mais autênticas, pois “mostrar o consumidor atual é essencial para criar identificação com a marca”. Além de uma reavaliação dos públicos-alvo, Alexandra Queirós recomenda que as marcas “personalizem a oferta, com design acessível, embalagens convenientes e rótulos fáceis de ler” e “simplifiquem a experiência de compra, com tecnologias fáceis de usar, assistência humanizada e comunicação empática”.

Outros conselhos da Centromarca passam por as marcas se “posicionarem como promotoras de bem-estar e qualidade de vida, apoiando uma longevidade ativa e saudável, e adotarem um marketing inclusivo, combatendo estereótipos com imagens positivas e diversificadas do envelhecimento”.

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