Redes Sociais

Marcas portuguesas cada vez mais em força no TikTok

Rafael Ascensão,

Dos vídeos 'improvisados' aos desafios virais, são cada vez mais as marcas portuguesas que estão a descobrir no TikTok um território fértil para comunicar e chegar a novas gerações.

Se há poucos anos o TikTok era visto como uma plataforma de dança para adolescentes, atualmente tem vindo a ser encarado pelas marcas como um poderoso canal de comunicação. Em Portugal, são cada vez mais as marcas que estão a investir nesta rede social para conquistar novos públicos e reforçar a relação e proximidade com a audiência, em particular com as novas gerações.

Uma destas marcas é a EDP, que se estreou no TikTok na semana passada com o objetivo de aproximar a marca de novas audiências e de fortalecer a sua ligação com os mais jovens. Mas muitas outras, de todos os setores, já estão presentes na rede social. Em março também o Millennium BCP alargou a sua presença nas redes sociais ao TikTok e, no início do ano, até o Governo se rendeu à rede social de origem chinesa, lançando a sua conta oficial no TikTok como parte de uma estratégia de modernização da comunicação governamental e de reforço da proximidade aos jovens.

Entre memes, trends e campanhas, cada vez mais marcas têm vindo assim a encontrar espaço no TikTok, onde tentam desenvolver uma personalidade própria, adotando inclusive um tom diferente em relação ao que usam noutras redes.

Para a Associação Portuguesa de Anunciantes (APAN), o crescimento da presença de marcas portuguesas nesta rede reflete uma “evolução natural do ecossistema digital no país“, uma vez que a plataforma conta com cerca de 3,9 milhões de utilizadores em Portugal, o que representa mais de um terço da população. A maioria destes utilizadores pertence às gerações mais jovens, embora a faixa etária entre os 25 e os 44 anos também esteja a crescer, aponta a associação.

“Este número coloca uma pressão positiva sobre as marcas, que veem nesta rede uma oportunidade estratégica para alcançar públicos mais jovens, nativos digitais e altamente participativos. O TikTok proporciona um ambiente propício à experimentação criativa, com formatos inovadores, linguagem direta e elevada taxa de interação”, diz Ricardo Torres Assunção, secretário-geral da APAN, que entende que a tendência de crescimento consiste numa “adaptação coerente à nova lógica da comunicação digital em Portugal“.

Segundo o responsável, o movimento das marcas para o TikTok é motivado desde logo pelo “potencial de descoberta orgânica muito elevado” da plataforma, onde o algoritmo “promove conteúdos com base em interesses e comportamentos, independentemente do número de seguidores, o que permite que marcas pequenas ou emergentes alcancem grande visibilidade“.

Além disso, o TikTok é uma rede “orientada para o storytelling e para a autenticidade”, pelo que as marcas “podem criar conteúdos que fogem ao tradicional formato publicitário“, o que permite gerar uma “maior proximidade emocional com o público” e ter acesso a ferramentas de criação disponíveis [incluindo assistentes de inteligência artificial, editores de imagem, bibliotecas sonoras e modelos criativos] que “facilitam a produção de conteúdos envolventes mesmo com recursos reduzidos“, aponta Ricardo Torres Assunção.

Tiago Strecht, growth managing director da Samy, concorda que se tem assistido a uma adesão “crescente e cada vez mais estratégica” de marcas portuguesas ao TikTok, num movimento que considera ser “não só natural, mas essencial num momento em que o consumo de vídeo curto, autêntico e dinâmico dita novos comportamentos”, sobretudo entre a Geração Z e os Millennials.

As marcas estão a ir cada vez mais para esta rede social também por uma questão de brand awareness e relevância, uma vez que a plataforma permite “chegar a milhões de utilizadores através de conteúdos com alto potencial viral, muitas vezes com orçamentos inferiores aos exigidos noutras plataformas“.

Mas também o “engajamento autêntico“, uma vez que o TikTok “privilegia formatos descontraídos e participativos, incentivando o utilizador a interagir ativamente com a marca”, assim como a “performance e conversão” — com vertentes da plataforma direcionadas para ecommerce que, embora ainda em fase de crescimento, permite às marcas atrair tráfego qualificado e testar novos produtos — são fatores que levam as marcas para o TikTok, afirma Tiago Strecht.

As razões para as marcas irem para o TikTok, segundo as mesmas

Recém-chegada ao TikTok, a EDP justifica esta aposta com o facto de esta ser “uma das plataformas mais influentes a nível global, com uma penetração bastante significativa no mercado nacional“, bem como aquela “onde os utilizadores passam mais tempo“.

“Com uma presença já consolidada no Instagram e no LinkedIn, a EDP decidiu reforçar a sua estratégia digital ao lançar o seu canal oficial no TikTok, direcionado sobretudo às novas gerações, iniciando assim uma nova fase da sua comunicação digital”, diz fonte oficial da marca ao +M.

Com esta aposta, e apresentando-se como uma marca “atual, criativa e acessível”, a EDP pretende “reforçar a relação e a proximidade com a audiência“, em particular com as novas gerações. “Os conteúdos serão adaptados à linguagem e às tendências próprias da plataforma e a literacia será também um dos pilares desta estratégia, tirando partido do interesse crescente das novas gerações por temas como as energias renováveis e a sustentabilidade”, avança a marca.

Por parte do Pingo Doce, a sua presença nesta rede social surgiu da vontade de estar onde estão os clientes, “especialmente as gerações mais jovens, que valorizam autenticidade, criatividade e proximidade“.

“O TikTok oferece-nos uma oportunidade única de comunicar de forma mais leve e informal, sem perder a essência da marca. O nosso principal objetivo é reforçar a ligação emocional com os consumidores, através de conteúdos que informam, inspiram e entretêm — incluindo a partilha de novidades sobre os nossos produtos. Queremos mostrar que o Pingo Doce está presente no dia a dia das pessoas, não só nas suas compras, mas também nos seus momentos de lazer”, aponta fonte oficial da marca.

Para isso a marca retalhista portuguesa aposta numa estratégia que assenta em três pilares principais: relevância [através da criação de conteúdos que acompanham tendências, desafios e temas do momento, adaptando-os ao universo do Pingo Doce], proximidade e humanização [ao dar rosto à marca através de colaboradores, criadores de conteúdo e da mascote] e valor acrescentado [com a aposta em conteúdos úteis e inspiradores — desde receitas rápidas a dicas de beleza ou limpeza].

Para a Worten, a presença no TikTok é uma “extensão natural” da sua estratégia de proximidade aos públicos mais jovens, procurando “reforçar a notoriedade e a relevância cultural da marca junto deste público”.

A plataforma permite também “explorar formatos criativos diferentes e nativos da plataforma, como os desafios, o conteúdo humorístico ou o conteúdo orgânico”, que permitem “mostrar uma faceta mais e descontraída da marca e mais próxima da audiência” que a marca pretende alcançar. “Além disso, é um espaço onde conseguimos testar novos formatos criativos que podemos depois escalar para outras redes ou campanhas“, diz Andreia Vaz, head of brand & CX da Worten.

A estratégia da marca do grupo Sonae no TikTok assenta numa “abordagem nativa, criativa e próxima do público, mas sempre com a flexibilidade necessária para reagir ao ritmo das tendências”, explica a responsável.

“Fazemos isto através da criação de conteúdos nativos e espontâneos, pensados especificamente para o ambiente e linguagem do TikTok, e da consistência na publicação. Para isso, contamos com um planeamento semanal e uma equipa dedicada à criação de conteúdo que garante a presença regular e relevante. Além disso, apostamos na participação em trends da plataforma e na utilização de áudios populares que nos ajudam a maximizar o alcance, assim como em colaboração com criadores de conteúdo, sejam influenciadores Worten ou externos, para garantir a autenticidade dos nossos conteúdos”, detalha Andreia Vaz.

No fundo, apostamos em conteúdo relacionado com a nossa área core, tecnologia, mas também em conteúdo de bastidores e de cultura pop, sempre com humor e com o tom leve e divertido que nos distingue. As campanhas e produtos são integrados de forma orgânica e natural, com foco em entreter as nossas audiências e promover a interação”, conclui.

Origem chinesa e constrangimentos na UE e EUA não afastam as marcas

A origem chinesa do TikTok, propriedade da ByteDance, tem originado debate político e regulatório, sobretudo no que se refere à proteção de dados, à transparência dos algoritmos, à possibilidade de influência em processos democráticos e à privacidade de dados e segurança nacional, especialmente no contexto do Digital Services Act (DSA) na União Europeia e de potenciais restrições nos EUA.

Nos Estados Unidos, a administração democrata de Joe Biden aprovou inclusive uma lei que exigia que o TikTok se desfizesse da sua empresa-mãe e encontrasse um investidor de um país que não fosse considerado um “adversário” nacional antes de 20 de janeiro. Trump tem vindo a adiar esta data e a tentar encontrar um comprador para a plataforma, de forma a permitir que a mesma continue a operar nos Estados Unidos.

Apesar destes desafios, as marcas contactadas pelo +M não identificam que estes tenham impacto na sua decisão de estar presentes na plataforma ou que possam trazer implicações.

Para isso contribuem alguns fatores atenuantes, identificados pela Samy Portugal, como o facto de o TikTok ter vindo a reforçar a sua presença na Europa, “com centros de dados e equipas de compliance que respondem às exigências do DSA” ou de as marcas continuarem a apostar numa estratégia multicanal, pelo que, apesar do crescimento do TikTok, mantêm a sua presença noutras plataformas como no Instagram, YouTube, Facebook ou LinkedIn. “Isto garante uma presença equilibrada, onde cada canal reforça o storytelling dos outros“, diz Tiago Strecht.

Além disso, é feita uma “avaliação contínua“. “Monitorizamos permanentemente as evoluções legislativas, garantindo que qualquer medida drástica (bloqueio ou limitação de funcionalidades) possa ser antecipada. Se necessário, ajustamos orçamentos e criatividades para canais alternativos”, explica o growth managing director da Samy, agência que apoia as marcas nas suas estratégias nas redes sociais.

Ricardo Torres Assunção também evidencia que as autoridades, tanto nos Estados Unidos como na União Europeia, têm reforçado o escrutínio sobre a plataforma, que tem procurado responder a essas preocupações com “medidas concretas”. Em Portugal, exemplifica o responsável da APAN, a plataforma conta com cerca de 160 moderadores que dominam o português europeu e implementou nas últimas eleições legislativas um centro eleitoral dedicado à deteção e remoção de desinformação.

Estas medidas visam aumentar a confiança dos utilizadores, instituições e marcas. Ainda assim, é importante que as empresas mantenham atenção ao enquadramento legal europeu, nomeadamente em matéria de proteção de dados pessoais (GDPR), obrigações de transparência impostas pelo Digital Services Act, e boas práticas de responsabilidade social na comunicação”, diz Ricardo Torres Assunção.

No fundo, apesar dos desafios, as marcas continuam a investir na plataforma, “reconhecendo que os benefícios em termos de alcance e interação superam, neste momento, os riscos, desde que haja uma gestão responsável da presença digital“, acrescenta.

“Em última análise, acreditamos que o risco regulatório deve ser gerido com inteligência — não temido. A agilidade das marcas (e das agências) será sempre a melhor resposta a um contexto em constante mudança“, conclui Tiago Strecht, growth managing director da Samy.

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