Comunicar não é encenar

  • José Bourbon-Ribeiro
  • 1 Abril 2025

Profissionais e organizações começam a perceber que comunicar bem não é só “controlar a narrativa”, mas contribuir para um espaço público mais honesto, mais dialogante e mais humano.

Nunca se comunicou tanto e, paradoxalmente, nunca foi tão difícil confiar no que vê, lê e ouve. Vivemos imersos numa torrente alucinante de informação, mas também de ruído, manipulação e encenação. Neste contexto, a autenticidade na comunicação deixou de ser uma virtude para se tornar numa urgência estratégica — e ética.

A confiança nas instituições, nos media e até nas marcas está em queda. O barómetro Edelman Trust aponta, ano após ano, para uma erosão preocupante da confiança global, especialmente em contextos de instabilidade política, social e económica. Este não é um problema de quem comunica, mas é, acima de tudo, da forma “como” se comunica. O público desconfia sempre que cheira o oportunismo, o cinismo ou a encenação. E desliga-se.

É por isso que a autenticidade — entendida como a coerência entre o que se diz e o que se faz –, assume um valor central na comunicação. Mais do que slogans bonitos ou campanhas emotivas, o que hoje se exige é verdade, consistência e escuta ativa. Uma organização que proclama valores éticos, mas evita lidar com as suas próprias incoerências, será inevitavelmente desafiada. Um líder que comunica empatia, mas evita assumir responsabilidades em momentos difíceis, perde autoridade. E qualquer instituição que só comunica quando lhe convém contribui para o fosso entre representantes e representados.

Não se trata, por isso, apenas de “dizer a verdade”, mas de recusar a tentação da performance. Comunicar não é representar um papel — é assumir um compromisso com a realidade, com os outros e com o impacto daquilo que se diz. A autenticidade exige vulnerabilidade: a capacidade de assumir falhas, de explicar decisões difíceis, de reconhecer limites. E exige também tempo: num ecossistema mediático que privilegia a rapidez e a emoção, parar para pensar e comunicar com clareza tornou-se, paradoxalmente, um ato de coragem.

Felizmente, começa a ganhar terreno uma visão mais consciente da comunicação, que privilegia relações sustentáveis em vez de gestos teatrais. Profissionais e organizações começam a perceber que comunicar bem não é só “controlar a narrativa”, mas contribuir para um espaço público mais honesto, mais dialogante e mais humano.

Num tempo em que tudo tende a ser um espetáculo — das redes sociais à política –, importa lembrar que comunicar não é encenar. É estar presente por inteiro e com verdade. Porque num mundo saturado de ruído, a autenticidade continua a ser a forma mais poderosa de se fazer ouvir.

  • José Bourbon-Ribeiro
  • Managing partner da Wisdom

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Comunicar não é encenar

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião