Estará o streaming a redefinir o consumo de eventos ao vivo?

  • Filipe Neves
  • 11:21

O streaming traz uma democratização evidente: já não é preciso estar fisicamente presente para assistir a eventos e vivê-los de forma intensa. No entanto, também levanta as suas reflexões.

Assistir aos concertos dos nossos artistas favoritos sempre teve um feeling quase de ritual: comprar o bilhete com meses de antecedência, muitas vezes enfrentando filas intermináveis ou dando incessantemente refresh nas páginas das bilheteiras online, deslocarmo-nos até ao recinto horas antes e viver intensamente cada segundo da espera.

No entanto, a forma como consumimos esses momentos está a mudar e rapidamente. O caso recente do concerto do Bad Bunny em Porto Rico, que foi transmitido em exclusivo através da Amazon Prime no passado dia 20, quebrou o record de audiências e tornou-se a performance mais vista de um solo artist na Amazon Music.

E estas transmissões de concerto não são novidade — também em Portugal já há uns anos que vemos sinais claros desta tendência, com festivais como o Nos Alive, o Vodafone Paredes de Coura ou o Rock in Rio a permitirem a transmissão de concertos em canais de televisão e nas rádios.

Voltando às novas plataformas, esta tendência de transmissões alarga-se a outros eventos, principalmente desportivos, se já podemos acompanhar os jogos olímpicos “a la carte” na HBO Max (entre outras provas desportivas), pela primeira na história vez as finais da NBA serão transmitidas de forma exclusiva pela Amazon Prime Video. Será o ano do I Stream this game.

O streaming traz uma democratização evidente: já não é preciso estar fisicamente presente para assistir a eventos e vivê-los de forma intensa. No entanto, também levanta as suas reflexões:

Será que assistir a um evento através de um ecrã transmite a mesma intensidade? Muitos argumentam que nada substitui a experiência coletiva, o som vibrante, a energia da multidão. Outros defendem que o streaming abre novas formas de consumo, permitindo viver em direto um momento à distância, partilhar uma experiência diferente e até, possivelmente, mais intimista, o que enriquece a ligação com a música.

E, se olharmos do ponto de vista dos artistas e promotores, é certo que o streaming abre novas portas para outros formatos de negócio, com os concertos apoderem ser monetizados para uma audiência global, muito para lá da capacidade física de qualquer recinto. Mas tal mudança também exige repensar estratégias, por exemplo, como valorizar quem compra bilhetes para estar presente fisicamente, quando o mesmo concerto é transmitido em direto e, em alguns casos, gratuitamente?

Pode argumentar-se que, por um lado, quem não perde por nada a sensação dos batimentos cardíacos a alinharem com a vibração das colunas de som continuará a preferir o consumo ao vivo e não o substituirá por estas opções. E que, por outro lado, quem não tem meios financeiros, disponibilidade ou proximidade geográfica — ou, simplesmente, não gosta de grandes multidões — pode, ainda assim, sentir-se mais perto de fazer parte do acontecimento.

Mas a verdade é que, mesmo não sendo uma prática recente, a chegada de grandes plataformas de streaming pode alterar a balança, levando os espetáculos para um patamar de globalização onde Lisboa, Porto ou qualquer outro palco podem ser vistos por milhões de pessoas em simultâneo, em qualquer parte do mundo.

Estamos, portanto, perante uma transformação cultura onde os eventos ao vivo começam a coexistir entre duas realidades: a experiência física, insubstituível, e a experiência digital, cada vez mais valorizada. O desafio passa por reencontrar o equilíbrio entre ambas, garantindo que o streaming não desvirtua a magia do “estar lá”, mas sim que amplifica e prolonga essa experiência. É a ideia de que um palco já não conhece fronteiras, mas continua a viver da emoção partilhada entre artistas e público — seja numa arena ou através de um ecrã.

A decisão de décadas entre assistir a um jogo de futebol no estádio, ou ver o jogo em casa (porque é longe, não há bilhete, é caro ou é mais cómodo) está a ser democratizada para novas áreas e novos eventos, graças a estas novas plataformas.

Talvez o futuro esteja precisamente nessa dualidade: reinventar os eventos como momentos únicos e inigualáveis ao vivo, mas acessíveis a todos através da tecnologia — que, é importante ter em mente, será, só por si, cada vez mais imersiva. Eu por cá vou consumindo os dois.

  • Filipe Neves
  • Managing director da Arena Media

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