
Maio: Parece que temos todo o tempo do mundo – mas não temos
Criamos headlines que se evaporam em segundos, artes que ficam irrelevantes em horas e campanhas que já ninguém se lembra na semana seguinte. Nunca se fez tanto, nunca se sentiu tanta falta de tempo.
Maio é aquele mês traiçoeiro em que a ilusão do tempo joga contra nós. Ainda não é verão, mas já se sente a antecipação das férias. Ainda faltam semanas para o segundo semestre, mas a sensação de “há tempo para tudo” instala-se perigosamente. As agendas parecem mais folgadas, os prazos parecem distantes, os projetos parecem sob controle. Parece.
A publicidade, como qualquer outro setor que vive de prazos, tem um talento especial para acreditar no tempo elástico. Tudo começa com um calendário organizado, com milestones bem definidos e reuniões estratégicas para garantir que “vamos fazer isto com tempo”. Depois, a realidade acontece:
O prazo inicial parecia uma eternidade? Agora é amanhã.
A revisão final seria um mero ajuste? Já vamos na versão 37.
O cliente não tinha pressa? Afinal, precisa “urgentemente para ontem”.
E é assim que maio, esse mês primaveril e aparentemente tranquilo, se torna o grande laboratório do pânico criativo. O ambiente muda de repente: reuniões que antes eram em modo relax agora são sprints de sobrevivência, deadlines que pareciam distantes chegam como um comboio desgovernado e o “estamos bem de tempo” transforma-se num mantra de auto ilusão.
A criação passa por três fases bem conhecidas:
- Fase Zen — Temos dias pela frente, tudo está controlado, podemos explorar ideias e conceitos com calma.
- Fase Desespero Light — Começamos a perceber que os dias passaram num piscar de olhos. Ainda há tempo, mas já ninguém respira tão fundo.
- Fase Pânico Olímpico — Agora é cada um por si. A produtividade dispara, o café triplica e, milagrosamente, algumas das melhores ideias nascem entre um “manda-me isso em alta, já!” e um “confirma se recebeste o Wetransfer, por favor”.
Porque, sejamos honestos: grande parte das melhores ideias nascem exatamente assim, no último minuto. Não porque gostamos de sofrer (embora haja dias em que parece), mas porque a pressão do tempo obriga a um foco brutal. A procrastinação criativa, quando bem utilizada, pode ser um motor genial. Aquela ideia que andava a ser lapidada durante dias às vezes não chega a lado nenhum, enquanto aquela que surge num café cinco minutos antes da apresentação se torna a campanha do ano.
Aliás, hoje os posts de redes sociais são os novos anúncios de imprensa — só que a sair ao minuto. O que antes era pensado e refinado como peça institucional agora nasce, vive e morre na velocidade de um scroll. Criamos headlines que se evaporam em segundos, artes que ficam irrelevantes em horas e campanhas que já ninguém se lembra na semana seguinte. Nunca se fez tanto, tão depressa — e, ironicamente, nunca se sentiu tanta falta de tempo para pensar.
A verdade é que nunca há tempo de sobra — e, paradoxalmente, nunca houve tanto tempo como agora. A publicidade hoje vive num paradoxo: há mais canais, mais formatos, mais possibilidades — e menos tempo para pensar. O imediatismo ganhou, a urgência é o briefing e a ideia “perfeita” é a que dá para executar antes que a tendência morra.
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