Um overview do Cannes Lions

  • Ivo Purvis
  • 19 Junho 2023

Saliento a quantidade de projetos de causas que continuam a proliferar e a alimentar a discussão do papel das marcas nas causas do mundo.

Este ano tive o privilégio de ser júri no festival de publicidade mais importante do mundo. O Cannes Lions. Apesar de já ter sido júri noutros festivais conceituados do mundo é a primeira vez que tenho a possibilidade de jurar no festival com mais história da criatividade comercial. Cresci neste meio tendo como referência o barómetro de Cannes, ainda numa era sem digital em que apenas uma vez por ano, na Riviera Francesa, tomávamos conhecimento do melhor que se estava a fazer no mundo. Era ali que se alinhavam os eixos e definiam as tendências do que íamos fazer nos anos seguintes. Vi o surgimento do movimento digital, da tendência das campanhas integradas, ditas 360º, dos conteúdos de marca, ditos storytelling, do poder da data, e das causas que ainda perduram. E este ano, o que aí vem?

Fui convidado para avaliar a categoria de outdoor, que é uma categoria tradicional do festival de Cannes, mas que hoje em dia acaba por ser transversal, ou mesmo sustento de vários projetos multidisciplinares que se estendem a outras categorias. Se há 20 anos um outdoor era um simples 8×3, ou um cartaz de rua, agora, e já há alguns anos, pode ser qualquer coisa que seja pensada para nos impactar fora de casa. É um privilegio poder votar numa categoria que acaba por dar um bom overview do festival por ser tão elástica, onde tanto votamos um simples poster como uma nova tecnologia aplicada ao uso de outdoor.

Mas ao avaliar tantos trabalhos acabamos por entender que as ideias que mais se destacam nesta categoria são aquelas que nos tocam e são superiores à própria publicidade. Pois a publicidade já conheceu melhores tempos e a cada dia que passa o seu glamour vai-se desvanecendo, fruto da democratização do conteúdo e da informação por parte dos consumidores. Praticamente, hoje em dia, só vê publicidade quem quer, mas se formos obrigados a vê-la então que seja boa publicidade. Penso que essa é a única forma de avaliar uma boa ideia hoje em dia. Claro que também existem fatores concretos a ter em conta para nos apoiarmos enquanto jurado, como o sentido de oportunidade, a novidade, e a pertinência, mas é bom mantermos o chapéu de consumidor e não apenas o de criativo.

Nos trabalhos deste ano sente-se o crescimento da criatividade moderna, pois existem projetos muito completos e interativos, mas também continuam a existir ideias muito simples e tradicionais, que nos relembram que uma boa ideia pode ser apenas isso mesmo. Por vezes a frase certa e um fundo branco podem ser tudo, desde que nos façam parar e pensar. Ser moderno não é usar a última tecnologia, mas sim o último comportamento das pessoas.

Mas um festival não é só avaliar as melhores ideias. É também escolher os projetos que trazem as melhores discussões para o festival, pois são esses que moldam os novos caminhos. E saliento a quantidade de projetos de causas que continuam a proliferar e a alimentar a discussão do papel das marcas nas causas do mundo.

Mas a Inteligência Artificial acaba por ser o fator novidade. É impossível ficar indiferente aos projetos que abordam essa inovação, e a discussão vai continuar a existir. Do meu ponto de vista, quando avaliamos um projeto com recurso a IA, temos de pensar se há ideia, ou não há ideia. Se a IA faz parte da narrativa é preciso entender se o faz de uma forma inteligente, inovadora e pertinente. Olho para a IA como uma nova ferramenta de trabalho, que deve ser utilizada para favorecer uma boa ideia e não uma má ideia. Penso que os profissionais de comunicação não se devem sentir ameaçados pela evolução. É no mínimo contraditório. Criar é evoluir, e para isso usamos tudo o que existe à disposição. Foi assim com o surgimento dos softwares de edição de imagem, da fotografia digital, dos motores de busca, e de tudo o que nos facilita o processo criativo.

Para fechar, nota-se que o nível da criatividade em Portugal está a crescer. Existem várias agências e estúdios a fazer bom trabalho e a transformar insights locais em ideias internacionais, o que acaba por ser uma aprendizagem face o passado. A internacionalização que Portugal vive tem sido um fator crucial para esta mudança.

  • Ivo Purvis
  • Diretor criativo executivo da Dentsu Creative Portugal; Representante de Portugal no júri do Cannes Lions International Festival of Creativity

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