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Vamos evitar a próxima crise de marca?
Desenganem-se os que consideram que a comunicação de crise surge do nada. Costuma-se dizer que a “melhor crise” é aquela que acaba como história interna sobre o que poderia ter sido.
Imagine uma fila compacta de trânsito e uma altercação entre dois condutores. Uma cena habitual num quotidiano impaciente, não fosse o condutor de trás estar fardado e sair da viatura decorada com a mesma marca que enverga para agredir a pessoa da frente — um idoso. A circulação rápida de vídeos, comentários e reações ao episódio mergulha a empresa numa espiral de comunicação de crise, que só estanca dias mais tarde.
Numa superfície comercial, dois funcionários de uma loja incompatibilizam-se e um deles formaliza uma queixa junto da entidade empregadora. É despoletado um processo de averiguação que viria a seguir os moldes internos tradicionais, não fosse um dos envolvidos pertencer à comunidade LGBTQIA+ e escolher usar as redes sociais para expor o caso. Acesa como um rastilho, a divergência tornada pública ganha os contornos de preconceito e desigualdade no trabalho — “rótulos” sensíveis de “descolar” pelas marcas envolvidas.
Para dar a conhecer a sua entrada no mercado português, uma empresa internacional de mediação imobiliária contrata uma rede de mupis outdoor para uma campanha alargada cujo mote envolve o fraseado “com nível”. Bem intencionada, uma vez que aludia aos primeiros profissionais com formação acreditada para apoiar à compra e à venda de casas (e não a clientes de determinada categoria), a campanha gera celeuma e põe, inclusivamente, jornalistas especializados na fileira da construção e do imobiliário de costas voltadas para o lançamento, assim como para as explicações da marca.
Desenganem-se os que consideram que a comunicação de crise surge do nada. As situações reais aqui partilhadas demonstram, aliás, que tendem a assumir muitas formas, sendo comum a todas elas algum tipo de prejuízo para as empresas e organizações. Partam, ou não, das próprias marcas, as crises podem gerar danos de imagem, impactos na confiança e lealdade de clientes, descrédito por parte de stakeholders, desvalorização em bolsa, perda de quota de mercado, desmotivação de colaboradores e dificuldade na sua retenção, processos judiciais… No limite, o fecho da atividade. E contudo, frequentemente, os sinais de alerta estão lá e podem ajudar a evitar problemas.
Costuma-se dizer que a “melhor crise” é aquela que acaba como história interna sobre o que poderia ter sido, conhecida apenas por aqueles que garantiram que um assunto prejudicial à reputação fosse cortado pela raiz. As oportunidades de se atuar de forma decisiva sobre uma crise em potência são tanto maiores quanto mais cedo forem identificadas. Por isso, as marcas devem aproveitar o poder das suas equipas — de comunicação, recursos humanos, legal/jurídica — para analisarem o horizonte e fazerem escuta ativa, no digital e fora dele.
Litígios com colaboradores, más traduções locais de alinhamentos internacionais, comunicações com “zonas cinzentas”, queixas de clientes ou utilizadores, dados sobre rotatividade de funcionários, rumores em redes sociais, todos eles fornecem indícios de situações latentes nas estruturas que podem ser geridas de forma atempada e conveniente, antes de chegarem a ser divulgadas e amplificadas.
Em complemento, existem várias técnicas formais de prevenção que normalmente partem da definição de procedimentos e recursos, com a criação de um Manual de Crise. Estabelecer uma timeline, antecipar diversos cenários, formar porta-vozes, aprovar as bases para um statement de contenção e realizar simulacros são ações que ajudam a identificar lacunas e a definir saídas para a resposta rápida que o multicanal hoje exige – afinal, de que vale seguir atentamente a evolução da crise no Instagram se o/a telefonista não souber o que fazer perante o contacto de um jornalista para a sede?
Aos responsáveis e gestores de comunicação, as palavras de Warren Buffett, empresário e filantropo americano, oferecem a melhor advertência: “São precisos 20 anos para construir uma reputação e cinco minutos para a arruinar”.
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