Contas das autarquias afundam 93% no espaço de um ano

A Administração Local terá apresentado em 2023 um excedente orçamental de apenas 24 milhões de euros, que compara com os 353 milhões de 2022 e ficado bem abaixo dos 256 milhões previstos pelo Governo.

A Administração Local apresentou em 2023 um excedente orçamental de apenas 24 milhões de euros, uma queda abrupta de 93% face aos 353 milhões alcançados em 2022, revela o mais recente relatório do Conselho das Finanças Públicas (CFP) sobre as finanças das autarquias.

Os resultados alcançados pelos 300 municípios analisados pelo CFP (de um total de 308 existentes) ficaram também 91% abaixou da previsão de 256 milhões de euros que constava do Relatório que acompanhou a proposta do Orçamento do Estado para 2023.

Segundo a análise dos técnicos do CFP, “a diminuição do excedente resulta de um aumento da despesa efetiva em 1,2 mil milhões de euros, superior ao da receita efetiva (900 mil euros)”, lê-se no relatório “Evolução Orçamental da Administração Local em 2023”, publicado esta quinta-feira.

Apesar do emagrecimento substancial do saldo orçamental, os números do CFP revelam que a dívida total (financeira e não-financeira) dos municípios considerada para efeitos do limite legal diminuiu ligeiramente em 2023, passando de 3.570 milhões para 3.549 milhões de euros.

De acordo com cálculos da entidade liderada por Nazaré da Costa Cabral, a receita efetiva dos municípios cresceu 8,7% em 2023, tendo sido impulsionada sobretudo pelo aumento das transferências, nomeadamente as recebidas no âmbito do processo de descentralização de competências. Já a receita fiscal municipal registou um crescimento tímido de apenas 2,5%, depois de no ano anterior ter aumentado 12,5%, muito por conta do “da quebra do IMT [Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis], acompanhado do aumento muito significativo de atribuições for força da transferência de competências”.

O CFP sublinha que esta realidade “sugere que existe o risco de as Administrações Locais se tornarem fortemente dependentes do Estado central, não apenas momentaneamente (para o que servirá o Fundo Financiamento da Descentralização – FFD), mas de forma mais estrutural, elevando de forma permanente o peso das transferências do Estado no financiamento da despesa da Administração Local.”

Do lado da despesa das autarquias, os números do CFP mostram um aumento de 12,3%, quase o dobro do registado no ano anterior. Os autores do relatório destacam que “esta evolução foi impulsionada sobretudo pela despesa corrente primária [que representa 9,3 pontos percentuais dos 12,3% de aumento), mas também pela despesa de capital [que contribui com 2,5 pontos percentuais para esse aumento] e juros [0,5 pontos percentuais]”.

É ainda importante notar que os dados revelados esta quinta-feira pelo CFP distanciam-se significativamente dos números apresentados pela Direção-Geral do Orçamento (DGO) referente à execução ornamental de dezembro de 2023 que, por exemplo, espelham um excedente de 254 milhões de euros em 2023 da Administração Local, menos 36% face aos 399 milhões de euros de 2022.

Questionado pelo ECO, fonte oficial da CFP refere que essa diferença se justifica por “os dados da DGO serem mais provisórios que os do CFP e apresentarem um mix entre estimativas e dados reportados, enquanto os dados utilizados pela CFP neste relatório são apenas dados reportados” pelas autarquias.

Municípios menos endividados

Apesar do emagrecimento substancial do saldo orçamental, os números do CFP revelam que a dívida total (financeira e não-financeira) dos municípios considerada para efeitos do limite legal diminuiu ligeiramente em 2023, passando de 3.570 milhões para 3.549 milhões de euros.

“Com base apenas neste indicador, pelo menos 12 dos 302 municípios para os quais existe informação estavam acima do limite da dívida total em 31 de dezembro de 2023, ou seja, menos três do que no final de 2022”, referem os técnicos do CFP, sublinhando ainda que “esta evolução traduz o decréscimo de dívida observado em 191 municípios (redução de 266 milhões de euros que mais do que compensou o aumento reportado pelas restantes 111 autarquias (245 milhões de euros).

No entanto, o CFP refere que caso não fossem consideradas as exceções legais e fossem tidos em conta todos os passivos municipais, não se teria observado qualquer redução da dívida em 2023. “Caso fossem incluídas as dívidas que o legislador entendeu excecionar, ter-se-ia registado um ligeiro aumento de 4 milhões de euros”. Esta evolução decorre da dívida excecionada ao abrigo do RFALEI [Regime Financeiro das autarquias Locais e Entidades Intermunicipais] ter aumentado 38 milhões de euros, enquanto a diminuição das dívidas não orçamentais compensou apenas parcialmente este aumento, justificam os técnicos no relatório.

Ao nível dos prazos de pagamento, o relatório do CFP revela uma redução generalizada do número de dias que os municípios demoram a pagar aos seus fornecedores. No entanto há sete autarquias que contabilizam um acréscimo dos prazos de pagamento (sendo que seis já demoram mais de 100 dias para cumprirem com as suas responsabilidade).

Entre os municípios que mais baixaram os seus níveis de endividamento no último ano está Portimão, que baixou em 36 pontos base o seu rácio de dívida, passando de uma dívida equivalente a 179% a sua receita corrente líquida em 2022 para um rácio 142% no final do ano passado.

Destaque ainda para Lagoa (Açores) que foi capaz de reduzir o rácio da dívida total para níveis abaixo do limite legal para 121%, melhorando a sua situação financeira, e ainda para Reguengos de Monsaraz (Alentejo), que também conseguiu reduzir a sua dívida total, saindo da situação de excesso de endividamento em que se encontrava, apresentando no final do ano passado um rácio de dívida de 134%.

No canto oposto persistem as situações de elevado endividamento das autarquias de Vila Franco do Campo, que apesar de registar uma queda de 36 pontos base do seu rácio de dívida fechou 2023 com uma dívida equivalente a 329% as suas receitas correntes, e sobretudo de Vila Real de Santo António.

A autarquia do sotavento algarvio apresentou um acréscimo de 10,9 milhões de euros da sua dívida, fechando no final de 2023 com um nível de endividamento de 473% as suas receitas correntes líquidas. “A reversão, em dezembro de 2023, da internalização da empresa municipal VRSA, Sociedade de Gestão Urbana (SGU) e conclusão da sua liquidação em definitivo em julho de 2022 foi determinante para este aumento”, justifica o CFP.

Ao nível dos prazos de pagamento, o relatório do CFP revela uma redução generalizada do número de dias que os municípios demoram a pagar aos seus fornecedores. No entanto há sete autarquias que contabilizam um acréscimo dos prazos de pagamento (sendo que seis já demoram mais de 100 dias para cumprirem com as suas responsabilidade).

O caso mais dramático é apresentado pelo município de Vila Real de Santo António que passou de um prazo de pagamento de 29 dias para 184 dias. Pior só o município de Freixo de Espada à Cinta, no distrito de Bragança, que demora, em média, 193 dias a pagar aos seus fornecedores (em 2022 demorava, em média, 254 dias, quase nove meses).

O CFP reitera ainda “que para a transparência da evolução orçamental e financeira do subsector é essencial que os municípios com informação em falta (e restantes autarquias locais e entidades) a prestem nos termos legalmente previstos e de forma tempestiva, em particular à DGAL [Direção Geral das Autarquias Locais]”.

A instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral aponta ainda várias dificuldades na elaboração deste relatório, nomeadamente a falta de informação disponível e limitações quanto aos dados reportados, em particular no que diz respeito ao processo de descentralização de competências.

Os técnicos do CFP concluem que “para uma maior transparência do processo de descentralização, afigura-se necessária uma melhor articulação entre as diversas partes interessadas”, sugerindo “providenciar os recursos necessários para que a DGAL, em articulação com os serviços de apoio à Administração Local das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), consiga validar os dados reportados e assegurar a sua qualidade”.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Contas das autarquias afundam 93% no espaço de um ano

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião