ACP entra com providência cautelar contra Câmara de Lisboa, JC Decaux e MOP
A CML de Lisboa diz-se "refém" do contrato e com "reservas e dúvidas sobre as opções assumidas no referido caderno de encargos" mas não avança possíveis soluções. JCDecaux não reage.
O Automóvel Club de Portugal deu esta segunda-feira entrada com uma providência cautelar contra a Câmara Municipal de Lisboa e as empresas JCDecaux e MOP – Multimedia Outdoors Portugal, pela aprovação e instalação de até 125 painéis de publicidade digital de grande formato em toda a cidade.
De acordo com a informação avançada pelo ACP, a providência apresentada no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa pretende impedir o funcionamento de painéis luminosos de grandes dimensões, já instalados, bem como não permitir a instalação de novos painéis desta natureza que, claramente, são um fator de distração à condução e um risco enorme para a segurança de todos, condutores e peões, defende.
“A distração ao volante é uma das principais causas de sinistralidade rodoviária em todo o Mundo e Portugal permanece claramente acima da média europeia em número de mortos e feridos na estrada“, escreve o ACP, salvaguardando que “não está em causa para o ACP a existência de mobiliário urbano com publicidade digital, apenas a sua localização e dimensão, claramente atentatórias da segurança rodoviária“.
Em causa estão os novos painéis de grande dimensão, que estão a ser instalados na sequência do contrato ganho pela JCDecaux para a exploração de publicidade na cidade, que têm vindo a gerar criticas sobretudo nas redes sociais. Contactada pelo +M já no final de agosto a propósito da instalação destes painéis, nomeadamente na Segunda Circular, a autarquia respondeu apenas esta segunda-feira. Diz-se “refém” da situação, mas não avança os passos seguintes.
“A Câmara Municipal de Lisboa esclarece que a atual situação resulta do contrato público para a ‘instalação e exploração publicitária de mobiliário urbano’ e que foi vencido pela empresa JCDecaux em 2017 e que, só no último ano, começou a ser implementado. Na sequência do referido concurso estavam também definidos a instalação de 125 painéis digitais de grande formato. A 2ª circular era uma das vias preferenciais que constava do caderno de encargos e um dos eixos definidos no concurso para a colocação de painéis de grande formato“, começa por referir a autarquia liderada por Carlos Moedas.
“O atual Executivo ficou assim ‘refém’ de um concurso e de opções que foram tidas em 2017 e que só muito mais tarde, na sequência de vários anos em tribunal por processos interpostos por concorrentes, começou finalmente a ser implementado”, prossegue, acrescentando que “sobre os painéis de grande formato, o atual Executivo de Carlos Moedas mantêm reservas e dúvidas sobre as opções assumidas no referido caderno de encargos”.
Apesar de assumir “reservas e dúvidas sobre as opções assumidas no referido caderno de encargos”, a autarquia, novamente questionada, não avança possíveis medidas a levar a cabo.
Também a JCDecaux se mantém em silêncio. Questionada sobre as críticas, possíveis negociações com a CML no sentido de alterar os formatos dos suportes ou a sua localização e ainda sobre as entidades que aprovaram a colocação/dimensão dos suportes, até ao momento a empresa liderada em Portugal por Philippe Infante ainda não reagiu.
A Câmara Municipal de Lisboa, recorde-se, aprovou há dois anos o contrato de concessão à JCDecaux para a instalação e exploração publicitária na cidade, por um prazo de 15 anos, com a empresa a pagar 8,3 milhões de euros por ano.
Quatro anos após a autarquia ter decidido “adjudicar a concessão de utilização de domínio público para instalação e exploração publicitária de mobiliário urbano ao concorrente n.º 5 – JCDecaux Portugal, Mobiliário Urbano e Publicidade, Lda.”, o contrato com esta empresa, escolhida no âmbito do concurso público, foi aprovado pelo executivo camarário, com 15 votos a favor, designadamente sete da liderança PSD/CDS-PP, cinco do PS, dois do PCP e um do BE, e duas abstenções do Livre e da vereadora independente eleita pela coligação PS/Livre, informou esta segunda à Lusa fonte do município.
O contrato de concessão entre a CML e a JCDecaux para uso privativo do domínio público do município de Lisboa para a instalação e exploração publicitária refere-se ao lote 3, que abrange as peças de mobiliário urbano dos lotes 1 e 2, que inclui “900 mupis, dos quais pelo menos 10% devem ser de natureza digital”, 2.000 abrigos e 75 sanitários públicos dos quais, no mínimo 10%, terão de estar preparados para receber utilizadores com mobilidade condicionada, nomeadamente em cadeira de rodas.
Outros dos dispositivos previstos no contrato são “40 mupis amovíveis, para publicidade institucional; um número de painéis digitais de grande formato não superior a 125 e que, no seu conjunto, compreenda uma área total de faces publicitárias entre 2.500 m2 [metros quadrados] e 3.000 m2; e 20 mupis de natureza digital e cinco painéis digitais (4×3 metros), a utilizar exclusivamente como equipamento informativo municipal”, lê-se no contrato, a que a Lusa teve acesso.
Como contrapartida da atribuição da concessão, a JCDecaux obriga-se a pagar à CML “a remuneração anual de 8,3 milhões de euros”, segundo o contrato, que determina que esse valor é atualizado anualmente de acordo com a taxa de variação média anual do Índice de Preços no Consumidor nos últimos 12 meses.
A empresa tem de comunicar à CML, até 15 dias após o início do contrato, os locais onde pretende instalar as peças de mobiliário urbano e, após aprovação, tem que apresentar um plano de instalação.
“O prazo de exploração publicitária do mobiliário urbano é de 15 anos a contar do termo do terceiro mês após a data da aprovação pelo primeiro outorgante [a CML] do plano de instalação relativo a todas as peças do mobiliário urbano, sem prejuízo da possibilidade de início de exploração publicitária imediata à medida que as peças de mobiliário urbano sejam aceites”, de acordo com o contrato.
Neste âmbito, a CML autoriza a JCDecaux a “subcontratar, parcialmente, os direitos e obrigações, decorrentes do presente contrato à MOP – Multimédia Outdoors Portugal – Publicidade, S.A.”.
Em junho de 2018, a CML aprovou a adjudicação da exploração da publicidade no mobiliário urbano à JCDecaux, por 15 anos, após um processo polémico que gerou contestação de empresas concorrentes, que suscitou a intervenção da Autoridade da Concorrência para determinar “se a transação em causa consubstanciaria uma operação de concentração”, o que culminou, passados quatro anos, com a apresentação da proposta de contrato.
A JCDecaux apresentou depois “uma proposta formal de compromissos”, envolvendo a subcontratação à MOP de 40% do lote 1 (mupis, abrigos e sanitários públicos) do contrato de concessão, e sete painéis médios digitais de dupla face (12 m2) do lote 2, a qual foi submetida a teste de mercado, para permitir que as entidades do setor se pronunciassem quanto ao potencial impacto jusconcorrencial e, “após audiência prévia em que intervieram vários dos contrainteressados, a Autoridade da Concorrência emitiu decisão de não oposição à concentração, com aposição de condições e obrigações”.
De acordo com a proposta do atual executivo camarário, apresentada pelo vereador da Economia e Inovação, Diogo Moura (CDS-PP), a decisão da Autoridade da Concorrência de não oposição ficou condicionada à celebração de contrato de subcontratação com a MOP.
No início do processo, a JCDecaux enviou à CML os documentos de habilitação e entregou o comprovativo de subscrição de caução por garantia bancária, a favor do município de Lisboa, no valor de 2,49 milhões de euros, uma vez que a aprovação do contrato só podia acontecer depois da prestação da caução pelo adjudicatário.
Em 2015, terminaram os contratos para a publicidade exterior de Lisboa que o município tinha celebrado com a JCDecaux e com a Cemusa em 1995 e, desde aí, a autarquia tem vindo a fazer aditamentos. Em causa estavam abrigos em paragens de transportes públicos, colunas de informação, painéis de divulgação de informação institucional do município de Lisboa e de outras entidades com as quais colabora e sanitários públicos.
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