Marketing

No marketing, “a inteligência artificial sem estratégia é um brinquedo”, defende Bruno Oliveira

Rafael Ascensão,

A ideia foi defendida na conferência "Disruption 2024 - Como a IA está a mudar a indústria da publicidade", do IAB. O tema do risco de homogeneização da criatividade também esteve em destaque.

Bruno Oliveira, head of digital hub & e-Business da Sumol+Compal

“Está a haver uma adoção acelerada desta ferramenta, mas não se pode ir porque os outros estão a ir. A inteligência artificial sem estratégia é um brinquedo. A inteligência artificial é estratégica porque pode ter muito impacto em casos de produtividade, otimização de tarefas, capacidade de trabalhar dados de forma mais rápida e criar insights para desenvolver a área de negócio e de inovação” da marca, afirmou Bruno Oliveira, head of digital hub & e-Business da Sumol Compal.

A ideia foi defendida na conferência “Disruption 2024 – Como a IA está a mudar a indústria da publicidade”, organizada pelo IAB com o objetivo de colocar em discussão as inovações, estratégias disruptivas e tendências que estão a moldar o futuro da inteligência artificial na publicidade.

Bruno Oliveira chamou ainda à atenção para o facto de a IA dever ser encarada como uma ferramenta ou um ponto de partida e não como um fim. “A IA vai permitir poupar muito em pitchs e na fase da idealização, porque permite esquematizar e tangibilizar melhor o que está tanto na cabeça do cliente como da agência”, disse.

No entanto, “é preciso focar na curadoria. O que a IA vai permitir é que sejamos menos executantes mas mais curadores“, disse, explicando que é preciso ir afinando os resultados gerados pela inteligência artificial, ferramenta que “valoriza o conhecimento”. “Quem tem mais conhecimento vai conseguir utilizar muito melhor a ferramenta, porque lhe vai também aplicar mais conhecimento”, acrescentou.

“Arriscando” que 50% do marketing já é automatizado atualmente, nas mais diversas áreas, desde a personalização de conteúdos à otimização de processos ou gestão de informação, Bernardo Rodo afirmou que esta automação “existe porque há o objetivo de padronizar comportamentos e personalizar respostas”, algo que se tenta fazer da maneira mais eficiente possível.

Bernardo Rodo, managing director da OMD Portugal.

O managing director da OMD Portugal alertou também para o problema da aplicação generalizada da IA no marketing, uma vez que esta tecnologia assenta num “sistema de imitação” que recorre ao que já foi feito, não tendo propriamente ideias novas.

Bernardo Rodo mostrou-se ainda “surpreendido” pelo facto de a tecnologia de IA estar a ser bastante aplicada no campo da criatividade.

“O nosso cérebro tem problemas muito complexos – é dado a distrações, a erros, a fadiga – e nós não conseguimos executar algumas tarefas. Mas conseguimos sobrepor tarefas e conseguimos compreender e interpretar contextualmente tarefas ambíguas. Portanto, é com muita surpresa que vejo que hoje metade da atividade que é pedida nos sistemas generativos são tarefas criativas“, referiu.

Quero uma IA que lave a loiça para que eu tenha ideias, possa pintar e escrever. Não quero que uma IA que tenha ideias, pinte ou escreva, para eu lavar a loiça“, afirmou ainda.

O mesmo alerta, quanto ao risco de homogeneização das marcas e da sua criatividade, também foi feito por Daniel Knapp, chief economist do IAB Europe. Embora a IA possa conduzir a uma maior eficiência, se todos usarem os mesmos modelos de IA, corre-se o risco de as marcas não se distinguirem e de não haver diferenciação entre concorrentes, argumentou.

Esta ideia foi ainda partilhada por Bruno Oliveira, que defendeu que se as marcas começarem a fazer a sua criatividade de igual forma, “vai ser tudo igual”, algo que já é sentido em algumas indústrias específicas, afirmou sem especificar.

Daniel Knapp, chief economist do IAB Europe

A ideia de que a IA já integra as estratégias dos anunciantes foi defendida na intervenção de Daniel Knapp, lembrando que acontece através de várias formas, desde a personalização ao business planning, a previsões, criatividade, aumento da eficiência ou análise de quando devem ser lançadas promoções.

Segundo Knapp, as próprias plataformas – como a Meta – estão a lançar ferramentas criativas de IA para ajudar os anunciantes. Estas plataformas, explicou, conseguem assim ter acesso ao conteúdo dos anunciantes, ao mesmo tempo que “aprendem” com ele para melhorar o processo e as suas ferramentas, estabelecendo-se assim um ciclo.

As agências também estão a apresentar projetos que apontam para a adoção da IA na publicidade e no marketing, refere. Estas agências, que atualmente estão a ser pior remuneradas pelo seu serviço, segundo Knapp, podem também ser beneficiadas com a IA, que ajudará a otimizar o trabalho.

Em relação ao impacto da IA nos empregos, Daniel Knapp sublinhou desde logo que este é inegável, mas que são sempre feitas extrapolações em momentos de revolução tecnológica – à semelhança do que já aconteceu no passado -, embora esteja comprovado que os períodos de automação têm tido como consequência um crescimento do número de empregos.

Segundo Knapp, muitos estudos e projeções incorrem no erro de dar um emprego como substituível por IA só por usar esta ferramenta. Na verdade, em muitos empregos, a IA pode de facto ser uma ferramenta auxiliar, mas não uma substituta, argumentou.

Sobre esta questão, Bruno Oliveira defendeu a ideia de que “a IA não vai matar trabalhos“. “O que vai mudar é a complexidade ou a forma como vamos valorizar a força de trabalho. Vai ser muito mais importante o sentido crítico“, afirmou.

Ainda na perspetiva de recursos humanos, o head of digital hub & e-Business da Sumol+Compal disse considerar que as empresas vão precisar de dar uma formação base aos colaboradores, desde logo para potenciar a utilização da IA, fazendo uma analogia com a condução de um carro: “É completamente diferente quando nos dão um carro para a mão e explicam como conduzi-lo. Muitas pessoas andam com as ferramentas de IA em segunda, quando dá para andar em quarta ou quinta“, disse.

Bruno Oliveira defendeu ainda um trabalho de autoaprendizagem e que os profissionais, principalmente na área do marketing, “têm de ser mais autodidatas”. Além disso, a implementação de ferramentas na IA – que é mais difícil de acontecer em empresas grandes do que pequenas – deve ser feita numa “lógica de top-down“, ou seja, começando no topo da hierarquia e replicando-se em sentido descendente.

Esta ideia parece já estar em prática, uma vez que Bernardo Rodo apresentou dados que indicavam que quem mais usa ferramentas de IA nas organizações são os seus líderes e que quanto mais alto o nível de liderança, maior é a utilização destas tecnologias.

Eleanor Drage, investigadora da Universidade de Cambridge.

Já Eleanor Drage, investigadora da Universidade de Cambridge, considerou que a IA tanto pode trazer coisas boas como más. “É o veneno e a cura“, disse numa abordagem aos efeitos sociais da inteligência artificial, onde defendeu que a questão essencial não está no facto de a IA se poder “virar contra” a sociedade, mas sim o facto de esta estar a ser mal programada por não se ouvir a população.

A investidora considerou ainda que é necessário um aumento da literacia da sociedade no que diz respeito a esta matéria, e que para se fazer uso deste tipo de tecnologia deve haver conhecimento, principalmente dentro das empresas que trabalham com IA, desde logo pelas questões éticas que são levantadas.

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