Bruxelas obrigou Portugal a introduzir no PRR mecanismos de controlo do duplo financiamento
Portugal já tem em funcionamento a plataforma que permite identificar se existe duplo financiamento de projetos. Duas suspeitas de duplo financiamento na UE não envolvem Portugal.
Portugal foi um dos sete países cuja bazuca sofreu ajustamentos para incluir metas e marcos para evitar o duplo financiamento de projetos por fundos europeus. O Tribunal de Contas Europeu, no relatório publicado esta segunda-feira, alerta que as verbas da bazuca podem estar a cobrir os mesmos custos que outros fundos da União Europeia. Para reduzir este risco, a instituição liderada por Tony Murphy sugere que sejam criados mecanismos de controlo.
“Após a reavaliação dos sistemas de controlo dos Estados-membros no contexto da revisão dos PRR para integrar os capítulos REPowerEU e, em relação a alguns Estados-membros, tendo em conta as conclusões das suas auditorias, a Comissão introduziu marcos adicionais ou ajustou marcos existentes relacionados com o duplo financiamento para sete Estados-membros – Bélgica, Irlanda, Chipre, Áustria, Portugal, Finlândia e Suécia”, revela o Tribunal de Contas europeu.
De acordo com as regras, até que sejam cumpridas estas metas e marcos, mantém-se “as insuficiências conexas nos sistemas de controlo do duplo financiamento e os futuros pagamentos serão bloqueados”. Ou seja, não há lugar a pagamentos parciais.
Portugal já tem em funcionamento o cruzamento de dados entre fundos europeus. Foi um marco colocado pela Comissão Europeia aquando da reprogramação do PRR. Foi assinado um protocolo de partilha de dados entre a estrutura de Missão Recuperar Portugal, a Agência para o Desenvolvimento e Coesão, as várias autoridades de gestão e o IFAP para centralizar a informação e evitar situações de duplo financiamento, anunciou o presidente da Recuperar, Fernando Alfaiate no encontro anual do PRR em maio.
Fonte oficial da Recuperar Portugal confirmou ao ECO que a interoperabilidade de dados já está a funcionar, através da plataforma FinDup, mas não existem ainda dados sobre situações de duplo financiamento. A plataforma permite fazer análises específica a uma determinada entidade para detetar se tem operações apoiadas com outros programas. E as análises sistemáticas são feitas de seis em seis meses, explicou ainda Alfaite, sendo que os beneficiários intermediários, antes de tomarem decisões podem consultar ex-ante projetos que essa entidade tem noutros fundos”.
O Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) foi criado em resposta à pandemia de Covid-19 e, pela primeira vez, foi concedido apoio financeiro da UE em grande escala sem associação aos custos reais o que aumentou o risco de duplo financiamento dos mesmos resultados, segundo o Tribunal de Contas.
A auditoria do Tribunal aos sistemas criados pela Comissão Europeia e pelos Estados-membros para prevenir, detetar e corrigir situações de duplo financiamento entre o MRR e os fundos de coesão e o Mecanismo Interligar a Europa concluiu que “ainda não são suficientes para atenuar de forma adequada o risco acrescido de duplo financiamento”. “Tendo em conta as insuficiências do ambiente de controlo, dificilmente se detetará o duplo financiamento”, conclui o tribunal.
Mas, na verdade, já foram identificadas duas suspeitas de duplo financiamento, que estão sob sigilo. Mas o Tribunal de Contas Europeu garantiu ao ECO que não envolvem Portugal.
A preocupação do Tribunal de Contas Europeu reside no facto de haver “ângulos mortos”. O facto de alguns pagamentos da bazuca estarem associados a reformas, que não têm custos, leva a Comissão a ignorá-los por não correm o risco de duplo financiamento. Mas, o Tribunal identificou casos que nem sempre é assim. Malta tinha uma reforma que consistia em promover o trabalho à distância na Função Pública em todas as ilhas. Apesar de ser tida como uma medida de custo zero, a reforma exigiu operacionalizar pelo menos 140 postos de trabalho, “um investimento subjacente que implicava custos concretos, substanciais e facilmente mensuráveis”. Mas, de acordo com as autoridades maltesas, estes postos de trabalho foram financiados por fundos nacionais.
Num momento em que a parte mais “pesada” da bazuca ainda está por executar – ainda só foram executados 37% dos fundos – o tribunal alerta que é preciso agir para evitar erros como os detetados, por exemplo, ao nível da Política de Coesão.
Apesar de reconhecer que a Comissão teve muito pouco tempo para implementar um sistema de resposta à pandemia e que o objetivo era simplificar o a atribuição de fundos, a verdade é que as autoridades de gestão dizem ao tribunal que têm os mesmos custos administrativos com a bazuca como têm com os fundos estruturais. E para a entidade liderada por Tony Murphy a simplificação não pode ser feita à custa da verificação.
Para detetar os casos de duplo financiamento, o tribunal defende que é necessário adaptar a definição de duplo financiamento às especificidades do modelo de financiamento não associado aos custos, além de reforçar os controlos das medidas de custo zero. Ou seja, aquelas para as quais os Estados-membros não apresentaram estimativas de custos.
O Tribunal defende ainda a necessidade de “clarificar e ampliar os requisitos de controlo do duplo financiamento no âmbito dos programas e instrumentos que utilizam o modelo não associado aos custos”, isto porque os Estados auditados revelaram “um panorama informático fragmentado, que impede a realização de verificações cruzadas eficazes para detetar o duplo financiamento”; uma “reduzida utilização da Arachne ou de outras ferramentas de exploração de dados, bem como de bases de dados dos projetos; e à dificuldade de intercâmbio e correspondência de dados”. Os sistemas não falam entre si, lamenta o Tribunal.
Melhorar a coordenação entre os programas e instrumentos de financiamento, criar e utilizar sistemas informáticos integrados e interoperáveis e ferramentas de exploração de dados para todos os programas e instrumentos de financiamento e reforçar da garantia da ausência de duplo financiamento quando da utilização do modelo de financiamento não associado aos custos, são algumas das sugestões do Tribunal, sobretudo numa altura em se discute o novo modelo de funcionamento dos fundos a atribuir no pós-2027.
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