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A querer criar experiências com a Nespresso, Mafalda Sttau Monteiro, na primeira pessoa

Rafael Ascensão,

Após cinco anos na sede da Nespresso, na Suíça, regressou a Portugal para liderar o marketing da marca. Mãe de três filhos, e à espera do quarto, se não fosse o marketing seria advogada.

O foco da Nespresso em Portugal passa por encontrar as “parcerias certas” para estar perto do consumidor, procurando “trazer experiências mágicas“, descreve Mafalda Sttau Monteiro, diretora de marketing da marca em Portugal.

E este vai ser um ano em que vamos estar mais próximos do consumidor, onde vamos procurar eventos e parcerias, onde possamos transmitir exatamente os valores da marca — obviamente sempre alinhados com a estratégia global e com a campanha de George Clooney e o mistério do comboio — mas tenho a certeza que este mistério, mais do que nunca, vem também para o dia a dia dos portugueses”, refere em conversa com o +M.

Como exemplo deste desígnio, Mafalda Sttau Monteiro aponta o trabalho “excecional” que foi feito pela equipa em Portugal em termos de ecommerce, que reflete a ideia do café desaparecido e que convida à interação com o consumidor. “Todas estas ativações acabam por ser mais de experiência e é aí que vai estar o nosso grande foco da marca“, diz.

A diretora de marketing considera inclusive que a equipa em Portugal faz um “trabalho excelente” numa perspetiva “glocal”, ou seja, em adaptar as grandes estratégias globais e de as tornar relevantes para o consumidor português. “A equipa faz um grande esforço nesse sentido, de aproveitar as mais-valias, os assets –como o George Clooney — que fazem todo o sentido, que ligam com o charme da marca e trazem um grande valor, mas sempre com uma vertente muito local“, diz.

Nesta senda conta com uma equipa de 24 pessoas, que vão desde áreas como identidade e ativação de marca até relações públicas, eventos, produto e dados do consumidor, onde é trabalhada a “consumer experience” e analisados os dados de que a marca dispõe para “ter a certeza de que fala diretamente com o consumidor”. “Para termos a certeza de que é uma comunicação personalizada, pois hoje em dia essa é uma das grandes necessidades do consumidor: não receber spam, mas sim o que é mais adaptado às suas necessidades“, explica Mafalda Sttau Monteiro.

Em Portugal a marca conta ainda com a colaboração das agências Uzina (em termos de criatividade) Burson (relações públicas) e Wavemaker (digital e planeamento de meios).

Mas foi fora do território nacional que Mafalda Sttau Monteiro começou a trilhar o seu percurso na Nespresso, mais concretamente na sede da empresa, na Suíça, para onde se mudou, uma vez que o seu marido tinha ido para lá trabalhar.

Foi o primeiro momento da minha vida em que tive de me confrontar com uma decisão de escolha entre família e trabalho. Não estava nos planos realmente ir para fora, sempre foi uma das questões em que eu dizia que era portuguesa, que nasci em Portugal e que não ia sair do país e de perto da minha família, mas às vezes a vida traz-nos destas oportunidades e faz sentido aproveitar e ganhar novas experiências”, recorda.

Acabou, portanto, por se juntar à equipa de comunicação da Nespresso global, onde o desafio passou “principalmente” por ouvir os mais de 40 mercados com diferentes necessidades, mas também pelo desenvolvimento de campanhas de marketing e comunicação a nível global, em parceria com a estrela de cinema George Clooney, mas também com “grandes equipas de fotógrafos e realizadores”.

O período que esteve na Suíça foi “extremamente desafiante“, reconhece, desde logo porque quando se vai para um país novo é necessária “toda uma adaptação ao próprio país”. Além disso, apanhou também o período complicado da pandemia, cerca de quatro meses depois de ter assumido funções.

Outro desafio foi o de ter encontrado um ambiente muito multinacional. “Acabei por ter uma equipa onde também estavam alguns portugueses, mas com muitas nacionalidades diferentes. Acaba por ser um choque cultural — no bom sentido –, onde temos de nos adaptar a diferentes formas de estar, a diferentes formas de trabalhar. Eu diria que esse foi o meu segundo desafio de adaptação”, explica.

Numa perspetiva mais estritamente profissional, o desafio foi “passar da realidade do mercado português, mais operacional, onde se tem o negócio muito mais nas mãos, para um lado bastante mais estratégico, onde o dia a dia passava por ouvir 40 diferentes necessidades dos diferentes diretores de marketing e das suas equipas“.

Após cinco anos por terras helvéticas regressou então a Portugal para assumir a direção de marketing da Nespresso em território nacional. Já tinha os olhos no mercado português e fui mantendo contacto com a equipa, discutindo algumas campanhas locais, para ter a certeza que havia coordenação”, revela.

“Venho com este ângulo de grande entusiasmo, de vir liderar uma equipa fantástica e tão reconhecida. E obviamente que também trago valor e tenho algo a acrescentar”, diz.

Além disso, há também um lado pessoal que torna o regresso a Portugal “agradável”. Mãe de três filhos e grávida de sete meses, “é importante ter uma rede de suporte, que só é possível Portugal, com uma família próxima”. “E uma pessoa também sente sempre falta da nossa comida, do lado social, dos amigos. É mesmo com grande entusiasmo e um grande sorriso que volto a Portugal”, refere.

Antes de se juntar à Nespresso, Mafalda Sttau Monteiro começou por integrar a Central de Cervejas, onde trabalhou as marcas Luso de Fruta e Luso Tea, naquele que foi o seu primeiro contacto com “tudo o que era concorrência, o mundo empresarial e reuniões”.

Foi depois para a Danone Portugal, empresa onde esteve cerca de cinco anos e onde fez “amigos para a vida”. Considera que “teve a sorte” de trabalhar principalmente marcas locais, nomeadamente Corpos Danone.

Em termos pessoais, Mafalda Sttau Monteiro diz que já faz parte das famílias numerosas, uma vez que o seu agregado familiar é composto também pelo marido, pelo filho Tomás (de três anos) e pelas filhas gémeas Luísa e Francisca (um ano e três meses). A caminho vem também a Diana, para definir em seis o número de elementos da família. “Isto para despachar de manhã é uma aventura”, confessa, entre risos.

As três crianças — prestes a serem quatro — e a sua felicidade são o seu foco. “Mas também encontrar este balanço entre a carreira – que também é muito importante e toma obviamente muito do meu tempo -, tendo a certeza que dedico o tempo certo aos meus filhos“, diz.

“E essa é uma das questões que também me têm perguntado. Como consigo balancear esta ambição de carreira, com uma experiência internacional e viagens de trabalho, com criar três filhos, que não sintam a falta da mãe no dia a dia. E isto passa muito, obviamente, por uma grande parceria com o meu marido, por um grande suporte familiar (mais atualmente), mas também por muito pragmatismo”, refere.

Tendo em conta este cenário, o tempo livre é bastante reduzido, pelo que os hobbies de Mafalda Sttau Monteiro se resumem a ver uma série “apenas após as 22h”. Em termos de séries, “Desperate Housewives” sempre foi uma das suas preferidas.

Vindos de Lausanne, a família voltou para Carcavelos, onde Mafalda e o marido — com quem está desde os tempos de escola secundária — sempre viveram. Mafalda, aliás, adora viver perto da praia, sendo que para si “não há nada como a brisa do mar”.

Durante grande parte do seu percurso escolar, Mafalda Sttau Monteiro achou que iria ser advogada, desde logo pelo histórico familiar, avô e tios tinham trabalhado na área da advocacia, mas também pelo facto de a mãe sempre lhe ter dito que gostava de argumentar.

“Toda a vida construi o meu percurso escolar muito mais focada em letras do que em números”, refere. Até que a certa altura, disse à mãe, que curiosamente era psicóloga de orientação escolar, que esta talvez tivesse andado enganada, porque iria afinal para a área da economia. Acabou por tirar uma licenciatura em Gestão no ISCTE e um mestrado em Gestão com especialidade em Marketing na Católica.

Mas acho que nunca perdi este meu lado de querer ser advogada. Gosto de uma boa argumentação, de ser desafiada e de construir histórias. Mesmo em termos de séries, as que são relacionadas com advocacia estão sempre no meu top, porque acho que faz todo o sentido contar uma boa história, ter argumentos sólidos, para depois poder defender um ponto. Por isso digo também que a advocacia não é assim tão diferente do marketing“, afirma.

Mafalda Sttau Monteiro em discurso direto

1 – Que campanhas gostava de ter feito/aprovado? Porquê?

A saga de filmes do Chanel N°5 é um verdadeiro ícone da publicidade. O que me fascina é a capacidade de criar histórias intemporais, onde a sofisticação e a emoção se cruzam, elevando um simples perfume a um símbolo de desejo e mistério. Já em termos nacionais, as campanhas de amizade de algumas marcas de cerveja são brilhantes, porque tocam num insight universal: o poder dos laços humanos. A melhor publicidade não impõe, ela reflete quem somos – e essas campanhas fazem isso de forma memorável.

2 – Qual é a decisão mais difícil para um marketeer?

Saber quando deixar ir. Às vezes, a ideia mais apaixonante, o produto mais inovador, simplesmente não encontra o seu espaço. Aceitar que algo não funciona e tomar decisões difíceis – seja cortar um orçamento, descontinuar um produto ou reformular uma estratégia – exige coragem.

3 – No (seu) top of mind está sempre?

“Cuidar”. O cuidado é o ingrediente secreto de qualquer grande marca. Cuidar da experiência do consumidor, do impacto que deixamos no mundo, das pessoas que trabalham connosco. Porque marcas que cuidam, criam relações que duram.

4 – O briefing ideal deve…

Ser um desafio claro e estimulante. Deve caber numa folha e começar com uma pergunta poderosa: qual o problema que queremos resolver? Um bom briefing não deixa espaço para ambiguidades, mas abre caminho para ideias brilhantes.

5 – E a agência ideal é aquela que…

Não tem medo de desafiar. Que não faz apenas o que lhe é pedido, mas propõe aquilo que ninguém esperava – e que faz todo o sentido. Uma agência ideal vê mais longe e consegue traduzir a essência da marca de formas inesperadas.

6 – Em publicidade é mais importante jogar pelo seguro ou arriscar?

Uma marca forte sabe quando inovar e quando reforçar a sua essência. O segredo está no equilíbrio: há momentos para surpreender e há momentos para lembrar ao consumidor porque ele confia em nós. Aquele Arpeggio da manhã? Ele nunca falha. Mas talvez possamos encontrar uma nova forma de lhe contar essa história.

7 – O que faria se tivesse um orçamento ilimitado?

Criaria uma experiência que fizesse cada pessoa sentir o que significa realmente a marca. Não apenas ver, mas sentir. Uma campanha que invadisse a cidade, os sentidos e as conversas. Que criasse momentos que se tornassem memórias. Porque, no final, é disso que se trata – ser lembrado.

8 – A publicidade em Portugal, numa frase?

Um talento imenso, que merecia um palco maior. Criamos campanhas que são autênticas joias criativas, mas muitas vezes não chegam onde deviam. O mundo devia conhecer melhor a publicidade portuguesa.

9 – Construção de marca é?

A soma de cada detalhe. Desde a forma como um colaborador atende um cliente até ao tom de voz numa campanha, tudo comunica. A experiência Nespresso não é apenas um café – é o ritual, o toque, a estética, a promessa de um momento especial. Construir uma marca é garantir que essa promessa se cumpre, todos os dias.

10 – Que profissão teria, se não trabalhasse em marketing?

Advogada – porque há poucas coisas tão estimulantes como uma boa argumentação. No fundo, contar uma boa história, convencer e emocionar… talvez marketing e advocacia não sejam assim tão diferentes.

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