Na Helexia a “dar palco” aos clientes com uma comunicação B2B, João Guerra, na primeira pessoa
Na Helexia há cinco anos, João Guerra tem como missão mostrar às empresas como a marca as pode ajudar a descarbonizar. É lisboeta mas optou por viver na Chamusca. Adora ciclismo e fazer mergulho.
Depois de cerca de 20 anos no setor das telecomunicações, João Guerra sentiu uma necessidade de mudança, aventurando-se no setor da energia e sustentabilidade e juntando-se à Helexia, empresa que trabalha no desenvolvimento de soluções integradas de energia e descarbonização para um desenvolvimento sustentável das empresas. Há cerca de cinco anos marketing & communication director da Helexia em Portugal, João Guerra explica que a sua comunicação, que é B2B2 (business-to-business), passa por “dar palco” a estas empresas que compõem o seu portefólio de clientes.
“Quem está a fazer a transformação são as empresas. Nós somos um enabler, ajudamos as empresas a descarbonizar, mas são elas que estão a fazer essa transformação. E toda a nossa comunicação vai muito nesse sentido, ou seja, de dar o palco às empresas que são nossas clientes, mostrando porque é que estão a fazer essa transformação e quais são os benefícios“, explica em conversa ao +M.
Ao mesmo tempo a marca quer “ajudar as empresas a perceber porque é que este caminho é importante e o motivo pelo qual esta transformação, até do ponto de vista competitivo, as torna mais capazes de enfrentar o mercado“, desde logo pela redução de custos que advém de uma autossuficiência do ponto vista energético através do autoconsumo solar, por exemplo.
A comunicação da Helexia e encarada por João Guerra como um desafio “muito grande” mas também “fascinante”.
“No B2C eu estou a comunicar diretamente com o consumidor final e, na maior parte das vezes, a decisão deste consumidor é muito emocional e muitas vezes rápida. Já no B2B é completamente diferente, porque não existe apenas um decisor, mas sim vários que fazem parte da cadeia de decisão, a qual é muito racional. Ou seja, não é uma decisão emocional”, refere.
“Ninguém acorda de manhã a dizer que quer autoconsumo solar na sua fábrica e que isso tem de acontecer logo nesse dia. Estas são tomadas de decisão conjuntas e que demoram tempo. O papel do marketing aqui passa muitas vezes por esclarecer quais são os benefícios desta transformação, porque é que é importante e como é que pode ser feita, recorrendo também a muitos casos de estudo e mostrando quem é que já está a fazer este caminho e o que está a beneficiar. No fundo, o marketing acaba por construir um ecossistema para que depois a venda possa acontecer“, acrescenta.
Quanto ao risco de greenwashing no que toca à comunicação das marcas sobre temas relacionados com a sustentabilidade, João Guerra defende que as empresas “têm de ser sempre responsáveis na forma como comunicam“, reconhecendo que “às vezes existe uma tendência para se exagerar o que se está a comunicar“.
“Este é sempre um jogo em que, obviamente temos que arriscar um bocadinho, temos que criar tensão no mercado para que exista a necessidade, mas ao mesmo tempo temos que ser responsáveis e nunca passar dados que não sejam reais ou exagerar benefícios que depois no fundo não são reais“, afirma.
Concedendo que “houve um bocadinho de exagero” por parte das marcas, o marketing & communication director, de 51 anos, considera que o mercado está agora a “corrigir” esse exagero. Para evitar greenwashing, é importante que as marcam tenham dados e factos: “não há nada como ter factos que sustentem a comunicação que se faz“.
Segundo João Guerra, as empresas já estão habituadas a reportar dados financeiros, mas a exigência que é feita agora passa também por reportar outro tipo de dados, nomeadamente aqueles relacionados com a forma “de como o ambiente pode afetar a empresa, mas também como a empresa afeta o ambiente”.
“É o conceito de dupla materialidade. E isto requer olhar para dados e envolver uma série de equipas, que se calhar não eram envolvidas. Mas acima de tudo, temos que basear a nossa comunicação em factos muito concretos. Acho que isso é a melhor forma de as empresas terem uma comunicação responsável“, acrescenta.
“Eu acho que as empresas e marcas que acreditam que é importante descarbonizar têm agora o momento de se mostrarem e defenderem o que realmente acreditam. Acho que há aqui uma boa oportunidade para que isso aconteça sem que seja greenwashing. Quem acredita que a descarbonização e a sustentabilidade são um tema importante, é agora que tem palco para o fazer. Acho que agora vamos começar a separar o trigo do joio“, entende João Guerra, dando até como exemplo o recuo de algumas nações — nomeadamente os EUA, que no final de janeiro anunciaram a saída do acordo climático de Paris — no caminho da sustentabilidade.
No desenvolvimento do seu trabalho, o marketing & communication director da Helexia conta com outras três pessoas, duas designers e uma pessoa de gestão de marca. No entanto, a empresa trabalha também com dois freelancers (em termos de vídeo e fotografia), bem como com duas agências, que são uma “extensão da equipa”, a The Square (comunicação) e a Bardo (marketing).
Nascido em Lisboa, João Guerra morou durante os seus primeiros cinco anos de vida em Troia, uma vez que o pai trabalhava no complexo petroquímico de Sines, onde brincou muito na rua e no campo. Com seis anos mudou-se com a família para Lisboa, com o profissional a considerar ter tido a “sorte” de ir morar para o bairro de Alvalade.
“Na altura que eu morei lá, havia muitas crianças e como aquilo eram ruas sem saída e com pouco trânsito, acabei por conviver muito também com crianças da minha idade, a brincar na rua. Esta parte social sempre me influenciou muito e acho que isso depois teve muita influência na minha forma de ser“, refere.
E tal veio a verificar-se com a sua opção de ir viver para a vila ribatejana da Chamusca, no distrito de Santarém, terra natal da mulher e onde mora há 25 anos, numa mudança que considera que lhe trouxe uma qualidade de vida “muito, muito grande”.
“Eu tenho dois filhos, a Maria de 23 anos e o Vasco de 15 anos. E na Chamusca eles puderam crescer num ambiente que é seguro e que lhes proporcionou um contacto social muito grande. Cresceram a brincar e a conviver na rua, e isso é possível nestes sítios onde ainda sentimos segurança e onde as pessoas se conhecem. Foi uma opção de vida de que não estou nada arrependido e estou super contente“, refere.
De início, no entanto, a mudança foi difícil, uma vez que continuou sempre a trabalhar em Lisboa o que implicou muitas vezes passar algumas semanas ou grande parte da semana em Lisboa. No entanto, atualmente, com a tecnologia, “mas acima de tudo com a mudança de mentalidade”, já reparte os seus dias de trabalho entre casa e Lisboa.
“Mas eu gosto deste modelo híbrido porque gosto de sentir a calma do campo, mas também preciso da adrenalina da cidade. Não consigo cortar com a adrenalina da cidade, também sabe bem“, refere.
Além de gostar muito de andar de bicicleta, tanto de estrada como BTT, faz trekking, principalmente de montanha, e mergulho. “Vou alternando essencialmente aqui entre estes desportos, mas gosto muito de tudo o que são desportos de natureza”, diz.
“Entretanto a minha mulher deixou de mergulhar, mas eu continuei e adoro. Adoro mergulhar e agora é engraçado porque até o meu filho também já mergulha comigo. É a sensação mais perto que temos de estar no espaço, mas também é fantástico ver o que existe no oceano e isso também acaba por ser uma motivação muito grande para preservar o planeta e fazer a ligação ao setor onde estou”, afirma sobre uma paixão que o leva inclusive a dizer que, se não fosse o marketing e comunicação, seria biólogo marinho.
Mas, verdade seja dita, que o seu percurso não começou nem pela comunicação e marketing nem pela biologia, sendo a sua formação de base tecnológica. Depois de se formar em informática de gestão e de trabalhar na área, acabou por ser desafiado para ir para marketing. “Isto porque estava a tomar conta de uma equipa que fazia suporte ao cliente e passava a vida a fazer sugestões às equipas de marketing que tomavam conta dos produtos a um ponto tal que me disseram para ir trabalhar para essa área. E foi aí que mudei a minha carreira e descobri uma paixão“, recorda.
Quando acabou os estudos, em 1996, as empresas de telecomunicações estavam em revolução, com a possibilidade de mobilidade das comunicações, tendo João Guerra iniciado a sua carreira na Telecel (hoje em dia Vodafone), permanecendo no setor das comunicações móveis durante cerca de 20 anos. “Acompanhei desde o início até o mercado ficar bastante maduro“, refere.
Na Telecel ainda trabalhou em Espanha durante dois anos, regressando em 2000 a Portugal “quando estava a haver toda aquela liberalização das comunicações móveis”, tendo trabalhado na Oni Comunicações e depois na Optimus, onde esteve durante 15 anos, acompanhando também o processo de fusão que deu origem à Nos.
Passados 20 anos nas telecomunicações, e estando já “um bocadinho cansado do setor” quis mudar. “E tive sorte porque apanhei um setor, que estava também em transformação, que é este setor da energia. Na minha carreira tive essa sorte de acompanhar dois setores numa fase inicial e de grande transformação e de impacto no mundo“, refere.
No setor da sustentabilidade trabalhou primeiro na ZEEV, que “foi pioneira na mobilidade elétrica”, passando depois pela Magnum Cap — que produzia carregadores para a mobilidade e que foi depois comprada pela italiana Scame Parre — até chegar à Helexia, onde está há já cinco anos.
A fazer um mestrado em Gestão de Impacto e Sustentabilidade na Católica, João Guerra defende a aprendizagem em contínuo a importância de se ser curioso, “principalmente para quem trabalha em marketing”. “Temos que ser curiosos, temos que continuar a aprender, temos que ser humildes“, refere.
Numa fase mais avançada na sua carreira gostava inclusive de transmitir, de alguma forma, um pouco da experiência e conhecimentos que foi adquirindo. “Vejo-me a terminar a minha carreira a dar formação ou eventualmente a colaborar com universidades. Fascina-me muito o ensinar, porque o ensinar é também enriquecermo-nos muito, uma vez que estamos a transmitir conhecimento mas, ao mesmo tempo, também estamos a absorver conhecimento”, diz.
“Esse é um desafio que eu tenho. Não para agora, acho que ainda tenho uma vida ativa pela frente , mas mais tarde, quando tiver perto da reforma, gostava de ligar-me ao ensino de alguma forma“, acrescenta.
João Guerra em discurso direto
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1 – Que campanhas gostava de ter feito/aprovado? Porquê?
Em termos nacionais, uma das primeiras campanhas da Telecel, o famoso “Tou xim;” com o pastor a atender o telemóvel (na altura, uma novidade). Foi a junção perfeita entre tecnologia e ruralidade, numa clara mensagem de que a inovação é para todos, independentemente do contexto. Já a nível internacional, a campanha “Think Different” da Apple, por colocar o propósito das marcas em primeiro plano. Não se tratava apenas de vender produtos, mas de desafiar o status quo e celebrar aqueles que mudam o mundo com a sua visão. Uma campanha intemporal, que reforçou a identidade da Apple e inspirou gerações.
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2 – No (seu) top of mind está sempre?
A competitividade. Para sermos competitivos, temos de compreender as necessidades do mercado e antecipar soluções, sempre com excelência. Significa identificar os fatores críticos de sucesso e responder com inovação, qualidade e agilidade.
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3 – O briefing ideal deve…
Ter informação sobre o contexto, sobre o que se pretende atingir mas que deixe muita liberdade à criatividade. Deve inspirar, orientar e desafiar, garantindo que há espaço para inovação e soluções inesperadas.
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4 – E as agências ideais são aquelas que…
São aquelas que caminham connosco, atuando como uma extensão da equipa. Desafiam-nos a ver além do óbvio, trazem novas perspetivas e, quando necessário, têm coragem para colocar o dedo na ferida. Mais do que prestar um serviço, são parceiros essenciais para a evolução e melhoria contínua.
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5 – Em comunicação é mais importante jogar pelo seguro ou arriscar?
O equilíbrio é essencial, mas arriscar tem de fazer parte do jogo. A comunicação que realmente marca é aquela que desafia convenções, gera conversa e cria impacto. Jogar pelo seguro pode evitar erros, mas também impede grandes conquistas.
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6 – Como um profissional de comunicação deve lidar e gerir crises?
Vou cair num chavão mas tenho que mencionar, encara-las sempre como uma oportunidade. Depois da “tempestade” passar, existem sempre lições que nos ajudam a crescer e melhorar.
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7 – O que faria se tivesse um orçamento ilimitado?
Não era para mim. Eu gosto de orçamentos limitados, obriga-me a utilizar a “massa cinzenta” e a decidir prioridades.
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8 – A comunicação/publicidade em Portugal, numa frase?
Forte na narrativa e na emoção.
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9 – Construção de marca é?
É um privilégio. A marca é um ativo da empresa e ajudar na construção do seu propósito, é um desafio continuo que exige coerência, visão e capacidade de criar conexões autenticas, tanto internamente, como no mercado.
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10 – Que profissão teria, se não trabalhasse em comunicação/marketing?
Eu adoro mergulhar, é entrar em outra dimensão, é o mais parecido a estar no espaço. Talvez fosse biólogo marinho.
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