Na luta renhida à Câmara do Porto, pesos pesados e “underdogs” já estão no terreno

Com o PS ferido, o PSD expectante com a força do movimento de Moreira sem o fundador e o sucessor deste já em campo, a luta no Porto está ao rubro. Quem se sentará na "cadeira de sonho"?

Promete ser renhida a corrida à segunda maior câmara do país nas próximas autárquicas, com quase uma dezena de candidatos já anunciados, quatro deles independentes. Cada um usa os trunfos que tem à mão, e vários reivindicam algum tipo de ligação aos 12 anos de Rui Moreira, o primeiro, e para já único, presidente eleito no concelho fora de uma candidatura partidária.

No xadrez político destacam-se o movimento independente que Moreira criou – mas que por limite de mandatos já não encabeçará –, a dupla do “centrão” que se alternou no poder entre 1976 e 2013 e ainda o Chega, que nas legislativas de 18 de maio foi a terceira força mais votada, com mais votos do que os obtidos pelo PS ou pelo PSD nas autárquicas de 2021.

Do lado do incumbente, Filipe Araújo, número dois de Rui Moreira desde 2017, já se apresentou como candidato, gorando-se a intenção social-democrata de contar consigo nas fileiras da coligação PSD/CDS. Esta apresenta-se com Pedro Duarte, o qual já marcou pontos, ao ver aprovada, na Assembleia Municipal do Porto de segunda-feira, a suspensão do arranque da segunda fase da obra do metrobus na Avenida da Boavista, cuja petição encabeça.

Quase em simultâneo arrancava a campanha de Manuel Pizarro (PS), que, numa luta eleitoral que se prevê emotiva, manifesta “apoio a todos os candidatos com tolerância democrática”.

Nos bastidores das autárquicas, a “luta” começa a aquecer com o PS e o PSD a tentarem recuperar uma autarquia que esteve nas mãos do independente Rui Moreira durante 12 anos. Mas se o PS já leva 24 anos de ausência de poder no edifício do topo da Avenida dos Aliados, para os social-democratas são “apenas” 12.

No arranque da campanha eleitoral do antigo ministro da Saúde Manuel Pizarro, nesta segunda-feira, José Luís Carneiro, candidato a secretário-geral do PS, considerou haver “boas condições” para que o partido volte a conquistar a Câmara do Porto.

Apesar da derrota copiosa em 2021, quando se viu reduzido a 18% com Tiago Barbosa Ribeiro – o rosto que acabou por liderar a corrida dessas autárquicas após uma disputa local que envolveu os nomes de Pizarro e de José Luís Carneiro – o PS teve a pequena compensação de ainda assim ser menos penalizado que o PSD de Vladimiro Feliz, ex-vereador e vice-presidente no consulado de Rui Rio, e que não foi além de 17,2% em 2021. Mesmo sem maioria absoluta, Moreira conseguiu ter mais votos que PS e PSD somados, tal como acontecera em 2017, embora aí tivesse mais vereadores que toda a oposição junta.

Se a vitória sobre o PSD nas anteriores autárquicas — ainda que por menos de 800 votos em mais de 100 mil votantes — pode servir como o copo meio cheio para o PS, a comparação com 2017 é menos benéfica, tendo os socialistas perdido nesses quatro anos mais de 14.000 votos e o PSD ganho mais de 5.000. A ascensão social-democrata é tão mais significativa quanto se sabe que a abstenção superou, pela primeira vez desde 2001, os 50%, o que reduziu o número dos portuenses que foram às urnas.

Manuel Pizarro, candidato pelo Partido Socialista às eleições autárquicas, durante a apresentação da sua candidatura à Câmara Municipal do Porto, no Palácio da Bolsa, no Porto, 02 de junho de 2025. ESTELA SILVA/LUSAESTELA SILVA/LUSA

“O PS sempre contribuiu em diversas responsabilidades para servir a cidade. O Manuel Pizarro conhece muito bem o concelho do Porto, já o serviu também como vereador na equipa de Rui Moreira. Tem vontade de servir e de se colocar ao lado dos cidadãos desta cidade, procurando valorizar áreas que são vitais”, assinalou José Luís Carneiro na apresentação do candidato. E este, que pela terceira concorre à presidência da Câmara portuense, admitiu ao ECO/Local Online estar confiante na “qualidade” das suas propostas eleitorais e das equipas que o vão acompanhar nesta demanda. Acresce o “reconhecimento das pessoas pelo enorme percurso” que tem vindo a fazer na Invicta.

Pizarro irá “sempre defender o Porto à moda do Porto” – o slogan da sua candidatura às autárquicas – e “sem hesitações e sem calculismos, sem estar dependente de nada nem de ninguém, orientado apenas pelo desejo de servir o Porto.”

A propósito da quantidade de adversários que se apresentam à corrida autárquica, o antigo eurodeputado manifestou apoio a “todos os candidatos com tolerância democrática. Se as pessoas se querem candidatar têm legitimidade para o fazer. Sabem ao que vêm”. Mas uma coisa é certa, notou, “merecem ser tratados com respeito”.

O ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, durante o discurso de encerramento da 1.ª edição do ciclo de debates “ECO Local”, Câmara Municipal do Porto, 21 de março de 2025. JOSÉ COELHO/LUSAJOSÉ COELHO/LUSA

Além de Manuel Pizarro e Pedro Duarte (ex-ministro dos Assuntos Parlamentares de Luís Montenegro), os partidos levarão ao boletim de voto outros nomes. Desde logo, o do ex-militante do PSD e líder da bancada parlamentar municipal dos social-democratas até ao ano passado, Miguel Côrte-Real, que agora surge com o logótipo do Chega. Côrte-Real defendeu, aquando das legislativas de 2024, o fim da “cerca sanitária” do PSD ao Chega a nível nacional, colocando o seu nome entre os subscritores do manifesto “Portugal Primeiro”, encabeçado pelo ex-ministro Rui Gomes da Silva.

Confirmados na luta partidária estão ainda a CDU, com Diana Ferreira — depois de duas eleições encabeçadas por llda Figueredo, os comunistas continuam a fazer-se representar por uma mulher, num quadro autárquico que se vai mantendo como um quase feudo de homens –, o Bloco de Esquerda, com o vereador Sérgio Aires, e o Livre, com um candidato ainda por apurar — sairá da disputa interna no partido entre aqueles que se propuseram nas primárias.

Enquanto independentes, e para lá do sucessor de Moreira no movimento por este criado, estão ainda na corrida à Câmara do Porto outros quatro nomes. São eles Nuno Cardoso (antigo autarca pelo PS), o médico António Araújo (diretor do serviço de Oncologia do Hospital de Santo António, fundador do movimento cívico “Porto com Porto”) Vitorino Silva, mais conhecido como Tino de Rans, calceteiro na Invicta, que compromete levar o “Porto a Bom Porto” e o advogado Aníbal Pinto pela Nova Direita.

Filipe Araújo, o número dois de Moreira

Em 2021, PS e PSD estiveram taco a taco a discutir a derrota mais benévola, na casa dos 18%. Já o movimento de Rui Moreira ganhou destacado. Agora, sem este e com alguns dos seus simpatizantes divididos no apoio a Pedro Duarte ou a Manuel Pizarro, será que os ventos estão a favor de Filipe Araújo, que tem trabalho feito na cidade como vice-presidente da autarquia? Será que vai conseguir afirmar-se ao encabeçar o movimento independente “Filipe Araújo, Fazer à Porto”?

Erguendo as bandeiras da habitação, mobilidade e segurança, é o atual presidente da associação cívica Porto, o Nosso Movimento, que ​apoiou as candidaturas autárquicas de Moreira. Em teoria, irá dividir os votos à direita — o CDS-PP, que apoiou Moreira, está agora em coligação com o PSD — e, com isso, acabar a beneficiar a candidatura do socialista Manuel Pizarro.

Filipe Araújo é vice-presidente da Câmara do Porto e vereador com o pelouro da Inovação e do Ambiente.ScaleUp Porto

Para o número dois de Moreira, que recusou o convite do PSD para integrar as listas dos social-democratas, é ponto assente que o Porto tem que se manter “longe dos diretórios partidários”. Da equipa de Moreira, Filipe Araújo é o único que se mantém ao seu lado desde o primeiro mandato (2013-2027) como vereador do pelouro da inovação e ambiente. Cargo que acumula com a vice-presidência desde 2013. Inclusive, já afirmou publicamente que é “o único” que está ao lado de Rui Moreira “desde o início” e que vai “cumprir, com toda a lealdade, o mandato até ao fim”, apesar de não ter o seu apoio formal.

Formalmente, Rui Moreira já garantiu que não vai “tomar partidos”. Contudo, para bom entendedor, estava ao lado de Pedro Duarte e do primeiro-ministro, Luís Montenegro, no Mercado do Bolhão, no dia em que a AD celebrou um ano de Governo e o ministro dos Assuntos Parlamentares anunciou a sua candidatura ao Porto, depois de meses a procrastinar — apesar da clareza com que ia dizendo que o lugar de presidente da Invicta é a sua “cadeira de sonho”.

O candidato do PSD encabeça a petição, que já leva mais de 4.000 assinaturas, para suspender e mudar a segunda fase do metrobus, defendendo igualmente a circulação sem canal dedicado e a salvaguarda de árvores e da atual ciclovia. Duarte anunciou a petição e horas depois Moreira fazia saber da sua concordância.

Entretanto, já nesta terça-feira, Pedro Duarte veio a público regozijar-se por a reivindicação ter sido aprovada pela Assembleia Municipal do Porto, com votos contra do PS e BE, “representando já uma vitória para a cidade do Porto”.

E a machadada final: Pedro Duarte recrutou aquele que foi, até janeiro, chefe de gabinete de Moreira, como responsável de comunicação. Vasco Ribeiro foi diretor de campanha de Moreira em 2021 e também já o foi do atual candidato do PS, Manuel Pizarro, em 2013, quando Moreira se preparava para entrar, pela primeira vez, na corrida às autárquicas.

Também chegou a ser assessor de imprensa do então socialista Nuno Cardoso – que vai agora concorrer como independente – quando este presidiu a Câmara do Porto entre 1999 e 2001 em substituição de Fernando Gomes, o qual saiu da cidade para a capital para assumir um lugar no Governo de Guterres. Este acabaria por regressar para a corrida autárquica de 2001, na qual permitiu a vitória de Rui Rio, ajudando no sismo eleitoral que viria a culminar na demissão de Guterres como primeiro-ministro.

Nuno Cardoso, candidato independente à Câmara do Porto

Mais, Pedro Duarte conta ainda como diretor da campanha eleitoral com o dirigente do PSD-Porto Francisco Ramos, cofundador da associação cívica “Porto, o Nosso Movimento”, criada para apoiar a primeira candidatura de Moreira à Câmara do Porto, em 2013.

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