Na Porsche a ajudar a “vender sonhos”, Nuno Costa, na primeira pessoa
Ligado há 27 anos ao mundo automóvel, Nuno Costa foi o responsável pela abertura da operação direta da Porsche em Portugal. Apaixonado por cinema, gosta de projetar casas, jogar padel e cozinhar.
Na liderança do marketing da Porsche em Portugal há mais de duas décadas, Nuno Costa acompanhou a evolução da marca automóvel desde que vendia menos de 80 automóveis no país até aos dias de hoje, em que vende cerca de 1.500 veículos. Antes disso esteve na Mercedes, e foi na mudança para a nova marca que percebeu que iria, mais do que vender automóveis, vender sonhos.
Após cerca de três anos a trabalhar como commercial vehicles marketing manager da Mercedes, Nuno Costa foi convidado para ir a Madrid, sede da marca da Porsche Ibérica, onde o CEO lhe disse que o queria contratar para iniciar a operação da Porsche diretamente em Portugal e criar o negócio da marca no país “de uma forma mais profissional”.
E foi esse mesmo CEO, um “tipo bastante disruptivo”, que lhe disse desde logo que a Porsche é “a marca que vende sonhos”. E deixou-lhe o conselho: “Os nossos automóveis não são os mais baratos no mercado, não são os mais económicos, não são os mais eficientes e são para pessoas que procuram outro tipo de emoções na vida e que perseguem os seus sonhos, portanto todas as variáveis que possas ter de pensar o marketing têm que mudar de acordo com os produtos que vendemos”.
E esses produtos, na altura, em que a marca vendia apenas cerca de 80 carros em Portugal, eram os modelos 911 e o Boxter, recorda Nuno Costa. “Só tínhamos dois desportivos de oferta. O que tínhamos que fazer era repensar completamente a forma de abordar o negócio, de forma também disruptiva“, recorda em conversa com o +M.
E foi isso que a marca começou a fazer em Portugal, também em termos de comunicação, incorporando novos modelos de automóveis menos desportivos, como começou por fazer com o modelo Cayenne.
“Foi complicado mudar um pouco essa imagem de sermos uma marca de automóveis desportivos e apenas desportivos. Abrimos um pouco a perceção da marca com o Cayenne, e depois vieram outros modelos, como o Panamera, o Cayman, o Macan, o Taycan. Ou seja, estes automóveis vieram mostrar que a marca poderia continuar a ser de automóveis desportivos de luxo, mas com uma abrangência muito maior”, diz o diretor de marketing de 53 anos.
E esta evolução começou também a transparecer para a comunicação. “Nunca tínhamos feito campanhas de publicidade, não anunciávamos os nossos automóveis, não tínhamos propriamente um canal de comunicação com clientes ou potenciais clientes, era tudo feito de uma forma muito tradicional. Tivemos de mudar um pouco o paradigma“, refere.
Assim, em vez de o cliente ter sempre de encomendar o seu automóvel e ficar quatro, cinco ou seis meses à espera do automóvel, a marca optou por começar a ter mais automóveis nos concessionários para que as pessoas pudessem sentir que estes eram “um bem mais tangível” e “algo a que podem chegar”.
A opção da marca passou assim por encomendar mais automóveis para exposição e para demonstrações. “A nossa matriz é esta. 50% do trabalho é feito se nós conseguirmos encontrar o potencial cliente e ele se sentar atrás do volante. Se nós fizermos isto, temos a certeza de que metade do caminho está feito. O resto acontece com o tempo, connosco a tentar encurtar essa distância“, diz Nuno Costa.
“A pessoa na sua shopping list tem sempre coisas para comprar e nós o que temos de fazer é chegar ao topo dessa shopping list. Começámos a fazer comunicação, a fazer muitos eventos e sobretudo muitos eventos de condução, onde as pessoas experimentam os nossos automóveis. Começámos a falar também com coletivos de alto poder aquisitivo, indo a torneios de golfe, a falar com relojoeiros, com marcas de joias finas e com restaurantes Michelin. Ou seja, começámos a fazer uma abertura da marca para tentarem chegar a esses coletivos”, explica Nuno Costa, sublinhando que esta estratégia trouxe consigo um “êxito fantástico” que permite à marca vender atualmente cerca de 1.500 automóveis por ano.
Quanto à comunicação da Porsche propriamente dita, Nuno Costa refere que hoje em dia a marca continua a “não querer comunicar para toda a gente”. “Não queremos ser elitistas, mas sabemos que apenas algumas pessoas vão poder chegar à nossa marca, e também queremos manter essa exclusividade. Mas já fazemos uma comunicação muito orientada para os clientes e os potenciais clientes da marca“.
Hoje em dia a marca opta por falar de produto diretamente, explicando porque é que ele é diferenciador, mas sobretudo tenta “chegar ao potencial cliente e ao cliente atual, nunca abdicando do nosso ADN de desportividade, que é o que as pessoas procuram”.
Uma das grandes apostas em termos de comunicação em Portugal passa também pela associação ao Millennium Estoril Open, que é “a plataforma de ativação de marcas de luxo que faz melhor matching com a marca“. Isto “tem a ver com esta dinâmica de desportividade, e com os valores e características do ténis, como a aceleração, a derrapagem em terra batida, as constantes mudanças de velocidade”, sendo que, tendo estas características em conta “poderíamos estar a falar de um Porsche”, diz Nuno Costa.
Mas depois há também “toda uma parte de network à volta do evento” que permite ativar toda a sua rede de concessionários, sendo que é feita também uma “brandizagem” de todos os concessionários da marca com as cores do Estoril Open e que todos os concessionários têm o seu camarote no torneio, onde levam os seus clientes e potenciais clientes. Além disso, a Porsche faz também uma ativação com cerca de 12 automóveis, que fazem os shuttle service dos VIP, dos jogadores, de clientes no Estoril Open. “Para nós o Estoril Open é incontornável”, conclui o diretor de marketing, que conta no seu trabalho com o apoio das agência Prime Promotion, termos de eventos e comunicação, e com a PHD, no que diz respeito a planeamento de meios.
Com quase três décadas no meio automóvel, Nuno Costa entende também que os maiores desafios do setor na atualidade se prendem com a desinformação, com as “notícias falhadas” e com “uma certa agenda de certos grupos económicos, ou mesmo de marcas automóveis, que veiculam notícias que não diria serem falsas, mas que são sobretudo desinformação”.
“De repente houve uma histeria completa com os veículos elétricos e a eletrificação. Depois houve uma reação de um lado do ecossistema a dizer que os veículos elétricos são todos maus e que não há condições em Portugal (ou noutro mercado que seja) para os carregar. Há sempre essa diabolização. Há sempre informação e desinformação, é o 8 e o 80. Toda a gente fala e toda a gente diz uma coisa e o seu contrário. Há muita desinformação e as pessoas às vezes sentem-se confundidas. E com o advento das redes sociais, parece que todas as pessoas têm que ter uma opinião, um ponto de vista e o seu contrário, de acordo com a rede social“, aponta.
“E há muita desinformação porque as pessoas, de repente, parece que têm que tomar um partido. Parece que há um certo clubismo em dizer que se é a favor da combustão, da hibridização ou da eletrificação. E se calhar as pessoas não tinham de pensar assim, tinham era pensar em qual é o automóvel que faz sentido para si e, até, se faz se quer sentido terem um automóvel”, acrescenta.
Este é assim um dos maiores desafios, segundo Nuno Costa, que diz ser necessário um “esforço tremendo” para tentar combater essa desinformação.
Nuno Costa começou por se formar em Relações Públicas e Publicidade no Instituto Superior de Novas Profissões em Lisboa, enviando depois currículos “para todo o lado e para todas as grandes agências”, mas “só levava sopa”.
“Isto foi complicado, mas eu comecei a trabalhar desde muito cedo, trabalhava no verão e nas férias, arranjava outros trabalhos. Eu queria mesmo começar e então comecei a trabalhar como responsável de marketing na Gel Peixe Alimentos Congelados, em Loures”, relembra.
Tratando-se de grande consumo e comparando com o mundo automóvel onde entrou depois, Nuno Costa diz que aquela era “uma dinâmica completamente diferente, porque ia ao supermercado, às peixarias, às lojas de alimentos congelados. Essencialmente vendíamos peixe congelado, mas também outras categorias de produto, como sobremesas, frutas congeladas, pré-cozinhados… para mim, foi uma grande primeira escola”, diz.
Acabou por estar lá cerca de um ano, até que foi trabalhar para a Mercedes Benz Portugal. “Tinha acabado de sair da universidade e entrado no grande consumo, mas precisava era de aprender e que me ensinassem. E estar numa multinacional como a Mercedes foi fantástico, trabalhava como responsável de marketing dos veículos comerciais, que tinham “componentes de compra completamente diferentes”.
Na nova marca, no arranque da operação em Portugal, foi-lhe dado um Porsche Boxster, com o qual ficou “maravilhado”, computador e telemóvel espanhóis. O diretor de marketing, no entanto, explicou que “não fazia sentido nenhum” estar a ligar em roaming para os funcionários, parceiros de negócios, vendedores e clientes nem a escrever em português num teclado de computador espanhol.
“Então só me deixaram com o Boxter, desejaram-me boa sorte e que fosse à luta. Ou seja, não havia escritório, não havia sequências de trabalho, não havia nada. Nem sequer havia um estacionário para um fax, que era o que se usava na altura. Foi mesmo começar do zero, num co-work, e arrancar com esta experiência, que já vai com 23 anos”, diz.
Nascido na capital moçambicana, quando a mesma ainda se chamava Lourenço Marques, Nuno Costa logo foi para Lisboa, onde ainda hoje reside com a mulher e os dois filhos.
Além de viajar — fazendo todos os anos duas ou três grandes viagens, sendo que há duas semanas quem o quisesse encontrar teria de ir ao México — uma das coisas que mais dá prazer a Nuno Costa é a de “desenhar projetos, pensar e idealizar casas”, já tendo tirado algumas do papel, construindo-as.
Embora não tenha jeito para desenhos, considera ter jeito para fazer projetos, sendo isso algo que hoje em dia cultiva “com algum sucesso, felizmente”. No entanto, enveredar pela arquitetura ou engenharia nunca foi algo que lhe tenha passado pela cabeça. “Quando uma pessoa pensa numa casa, pensa na forma mas é preciso também pensar na função. E depois se conseguir melhorar isso com a ajuda de arquitetos, que tenham essa competência de projetar o nosso sonho, é espetacular, é uma coisa que me realiza imenso“, aponta.
Entre as suas paixões, encontra-se também o padel. Além da dimensão estratégia e técnica, o padel conta ainda com um outro aspeto que Nuno Costa entende ser “muito compensatório”. É que “uma pessoa começa a conhecer imensas pessoas novas que não estavam no seu meio. Começa a entrar em grupos de padel, a entrar em torneio, a jogar regularmente com um ou outro e a desenvolver um network e um círculo de amizades novo, o que às vezes não é muito fácil quando uma pessoa tem 40, 45 ou 50 anos”, diz.
“Um jogo pode ser mais ou menos bem conseguido, de acordo com o resultado, mas depois acaba-se sempre por beber uma ou duas cervejas, descontrair, conhecer pessoas novas e falar de outros assuntos. E eu acho isso super proveitoso. Sinto-me eternamente grato ao padel, porque deu-me outros amigos, que posso chamar amigos”, acrescenta.
Nuno Costa gosta também imenso de cozinhar, o que o leva também a adorar “comer e experimentar vinhos” e é ainda um “apaixonado por cinema“, vendo cerca de quatro filmes por semana. Atualmente vive numa fase em que anda a ver filmes com mais de 30 anos, numa “espécie de regresso à juventude”.
Considera-se uma pessoa “super extrovertida e um networker“, também porque as circunstâncias “assim o fizeram”. “Trabalhar nesta marca é um privilégio tremendo, é a oportunidade de uma vida e isso fez-me também desenvolver uma cultura de networking, socialização e de sair da zona de conforto”, diz Nuno Costa, que entende que o grande desafio “é ser feliz”.
“Apenas isso, o que já por si só, é muito. Não me interessa propriamente ganhar muito dinheiro, não me interessa ter bens materiais. É ter saúde, ser feliz e que os meus filhos e a minha família estejam bem. Porque tudo o resto é bastante efémero. As pessoas podem dizer, ‘bom, mas anda montado num Porsche ou tem uma duas ou três casas, e agora diz que quer ser feliz’. Mas a vida é tão rápida e acelerada, que se não formos felizes naquilo que fazemos, e em todos os momentos em que podemos estar, a única coisa que levamos é sofrimento”, acrescenta.
Nuno Costa em discurso direto
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1 – Que campanhas gostava de ter feito/aprovado? Porquê?Em termos nacionais destaco a Missa do Galo by Azeite Gallo, em 1995, porque representa a essência e tradição de Portugal e transporta para um legado de um povo.
Já internacional, gosto muito da campanha da Rolex de agradecimento pela carreira do Roger Federer porque mostra gratidão e presta homenagem ao legado de um tenista único que está totalmente alinhado aos valores da própria marca.
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2 – Qual é a decisão mais difícil para um marketeer?
Tomar decisões contra a corrente e seguir os instintos.
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3 – No (seu) top of mind está sempre?Vender. Vender. Vender.
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4 – O briefing ideal deve…Ser de meia página com informação concisa e objetiva.
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5 – E a agência ideal é aquela que…Entrega resultados com métricas e interpreta as necessidades do cliente de forma natural.
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6 – Em publicidade é mais importante jogar pelo seguro ou arriscar?Ainda que prefira jogar pelo seguro, arriscamos sempre que podemos.
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7 – O que faria se tivesse um orçamento ilimitado?Essa realidade nunca será a nossa, mas se esse cenário fosse possível investia numa exposição sobre a publicidade no mundo Porsche.
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8 – A publicidade em Portugal, numa frase?Do melhor que se faz num mundo para um mercado tão limitado.
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9 – Construção de marca é?Acrescentar personalidade, criar uma relação e gerar valor.
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10 – Que profissão teria, se não trabalhasse em marketing?Treinador de futebol.
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