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“Gostava de, em cinco anos, ter um conteúdo produzido por nós na Netflix”, diz Bruno Batista

Carla Borges Ferreira, Hugo Amaral,

Lançar uma agência de publicidade e comprar uma agência de influenciadores são os objetivos que Bruno Batista traçou para este final de ano. O passo seguinte é entrar na produção de ficção.

Bruno Batista, CEO da GCI, em entrevista ao ECO - 24AGO22

Bruno Batista entrou na área da assessoria de imprensa e comunicação em 2019, altura em que comprou a marca GCI. Já durante a pandemia juntou ao grupo a consultora Sustainable Social Iniciative e, no início deste mês, comprou a agência Media Consulting e a produtora Sonomage. O objetivo, afirma, é “criar o maior grupo de comunicação português”.

Até ao final do ano Bruno Batista, que lançou em 2006 a primeira empresa, a agência de eventos WMK, pretende adicionar ao grupo, por aquisição, uma agência de influenciadores e lançar uma agência de publicidade. Entrar na produção de ficção, com formatos distribuídos à escala global em plataformas de streaming, é um sonho que espera conseguir concretizar no espaço de cinco anos.

“Sempre me meti em coisas sem ter dinheiro nenhum e foram acontecendo, porque quando as ideias são boas o dinheiro alguém to empresta e tu pagas. Eu sou um ótimo cliente de bancos, felizmente sempre que precisei da banca, a banca sempre me disse que sim, porque sempre paguei aquilo que devia. E também faço negócio com o meu dinheiro e com o da banca, não com dos fornecedores. Pagamos a tempo e horas a toda a gente”, diz, a propósito do montante que será necessário investir para produzir conteúdos de ficção.

No início do mês, quando foi conhecida a compra da Media Consulting e da Sonomage, dizia que também faria sentido ter publicidade in house. Vamos ter novidades?

Não sei se será em setembro, mas vamos ter. Olhando para a arquitetura de empresas do grupo, faz todo o sentido essa área e não só. Mas a publicidade, tendo marcas fidelizadas no negócio da comunicação, tendo digital, tendo uma produtora interna, faz todo o sentido que consiga criar aqui o conceito publicitário e levá-lo até ao fim. Não só o comunicar nas redes e na assessoria de imprensa, mas conseguir produzir. Se bem que o negócio da produção de spots de 30 segundos também não está por aí além ou não tem o futuro em linha com o que já foi.

Publicidade não é só o spot de 30 segundos.

Exatamente. A publicidade não é só o spot de 30 segundos e a produção de outros conteúdos, da forma como os vejo, fazem sentido tendo uma agência de publicidade ou pelo menos a criatividade melhorada. Não é que não tenhamos dentro do grupo criatividade, mas é diferente pensar conceitos de comunicação que normalmente são para viver estrategicamente a médio e longo prazo, do que pensar conceitos publicitários que são para cumprir um objetivo no curto prazo.

Vamos ter novidades que podem passar para a criação de uma marca nova, em linha com o criarmos uma umbrella para grupo. O grupo GCI, que integrava todas as empresas que tínhamos, neste momento não faz sentido, até porque sentimos que o mercado caminha para a especialização e, portanto, cada uma das agências, que tem a sua estrutura, tem o seu know-how, tem o seu valor acrescentado pelos seus quadros, tem que ser especialista numa área. Vamos desmantelar o grupo GCI e as marcas vão todas existir dentro de uma umbrella que está pensada, não está decidida.

Bruno Batista, CEO da GCI, em entrevista ao ECO - 24AGO22
Bruno Batista, CEO da GCI, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Ainda não tem nome?

Não tem nome definido. Tem um caminho, tem o racional para chegar ao nome. O mais importante é a história que está por trás desse nome. Essa história é só uma, é a de um grupo de comunicação 100% português, que quer continuar a crescer, que quer agregar todos os serviços onde achamos que conseguimos criar valor aos nossos clientes.

Mas cada uma das agências tem o seu posicionamento. Cada uma das marcas tem os seus clientes, como objetivo de grupo queremos obviamente que haja interação entre os clientes de uma agência e de outra, que consigamos criar eventos, ativar marcas, ativar ações para clientes que sejam da área de sustentabilidade, por exemplo, ou que sejam de uma agência ou de outra das agências de comunicação. Temos duas que são concorrentes, preferia ter quatro ou cinco.

Quatro ou cinco? Vai continuar a comprar?

Não, não está nos planos comprar mais agências de comunicação, até porque temos duas que estão bastante bem no mercado e que acho que têm ainda muito potencial para crescer. Mais depressa adquiríamos uma agência de publicidade ou de influenciadores, que é uma área que as duas agências neste momento tratam, mas que continua a fazer sentido.

Já estou em negociações com uma empresa de influenciadores e a agência de publicidade provavelmente será uma criação nova. Será não uma aquisição, mas sim uma agência a criar de novo.

Uma agência de influenciadores?

Sim, representar influenciadores. Parece que está aqui um modelo de negócio igual ao dos anos 90, com as agências de modelos e de atores. Esse modelo existe, temos no mercado agências bastante fortes a fazê-lo. Agora parece-me que é o momento, até porque a nossa necessidade de influencers dentro do grupo subiu, mas sobretudo porque essa área de negócio tem potencial na próxima década. Nos próximos cinco anos continua a ter por onde crescer.

Tanto publicidade como influenciadores são uma prioridade. Já estou em negociações com uma empresa de influenciadores e a agência de publicidade provavelmente será uma criação nova. Será não uma aquisição, mas uma agência a criar de novo, com uma equipa nova e com um posicionamento em cima da criatividade. Gostava de ter este processo fechado até ao final do ano.

Está também a negociar, na área da publicidade?

Pessoas, contratações.

Recuando então até ao início do mês, porquê a compra da Media Consulting e da Sonomage?

Não há outra história que não seja a naturalidade. Jorge Passarinho, com quem comecei a trabalhar há 20 anos como cliente – eu estava na comunicação da Delta quando contratámos a primeira agência de comunicação, que foi a Media Consulting… Estava a almoçar com o Jorge Passarinho, que tem 67 anos, fundou esta casa há 30, e disse-me que era obrigado a reformar-se, não queria parar de trabalhar, mas obviamente olhava para a frente e já não se via a trabalhar daqui a 10 anos.

Falámos sobre uma possível venda, a conversa foi naturalmente parar aqui. Começámos o processo no início do ano, demorou seis meses, houve uma aquisição de 100% do capital e, portanto, foi preciso fazer auditorias e avaliar as empresas. Como empresário, é muito interessante ter recursos internos e não estar a atirar dinheiro ao mercado. Por muito que goste de ter fornecedores satisfeitos, gosto de ser o fornecedor de mim próprio o máximo que conseguir.

Quanto é que gastavam em vídeo?

Duzentos mil euros por ano, em média. É para nós um valor considerável, sendo que o nosso volume de negócios na GCI é de cerca de 2 milhões e qualquer coisa. Este ano vamos passar um bocadinho, mas andamos nisto, num milhão e meio a 2 milhões, portanto são 10 a 15%. É um valor interessante para passar a estar gerido dentro de casa, com margem direta. Mas, por outro lado, não é por aí que acho que vamos crescer ou conseguir aumentar o valor, é porque a produção do audiovisual me entusiasma bastante.

É uma área da qual eu gosto muito, é uma área que não atingiu ainda a maturidade, não sabemos onde é que vai parar este negócio do streaming, não sabemos onde é que vai estabilizar, como é que vai encontrar o seu equilíbrio. A Netflix está a viver este ano, pela primeira vez, um decréscimo de assinantes e vai ter que repensar o modelo de negócio. Não sei o que é que vai acontecer nesse mercado, mas vai acontecer muito em breve. O que acho é que poderá surgir um novo player, ou há espaço para haver um novo player, com serviço gratuito pay per view, onde pagamos pelo conteúdo, que vai abrir potencial às produtoras independentes de conseguir produzir conteúdo e colocá-lo lá. E arriscam um bocadinho, como com a música.

O caminho que acho que vai acontecer com o audiovisual, com o conteúdo de entretenimento, é o que aconteceu com a música, onde o conteúdo está no Spotify ou no Apple Music e o autor é remunerado em função da qualidade do seu trabalho, conforme tem ou não muitos views. Isto abre um potencial de negócio no qual quero estar, quero estar preparado para sermos dos primeiros a ter bom conteúdo, produzido em Portugal mas a pensar numa distribuição global, para conseguirmos estar lá.

Que, pessoalmente, gostava de fazer séries e filmes? Isso posso fazer a brincar. Agora, que dá para ganhar dinheiro com séries bem feitas, com um modelo de negócio que aposta numa distribuição global, essa é a vantagem da era que estamos a viver.

Distribuição global para a língua portuguesa?

Não. Pode ser produzida em português, mas neste momento somos inundados com séries coreanas de qualidade, legendadas, e isto é perfeitamente possível para Portugal. Não só seremos cerca de 300 milhões a falar a língua portuguesa, como podemos perfeitamente legendá-lo e estar a falar de uma distribuição global através de uma Netflix. Estou a fazer futurologia, mas os negócios são estratégia.

Fala de “uma Netflix” que venha a ser criada, uma forma de distribuição…

De um modelo de negócio que pode mudar uma Netflix ou de um outro player que pode aparecer.

Nas atuais plataformas de streaming nós, portugueses, quase não conseguimos entrar.

Tivemos duas séries nos últimos tempos, que me lembre, e um formato de humor do Salvador Martinha. O meu objetivo, claro, eu gostava de, em cinco anos, ter um conteúdo produzido por nós, aqui Sonomage, na Netflix. Se vamos conseguir ou não, não depende só de nós, porque estamos dependentes de terceiros que veem o nosso trabalho.

Nós temos histórias made in Portugal capazes de produzir coisas… Olho para o House of Cards, de que gosto bastante, e quase que vejo ali a figura de um presidente que pode ser preso ou que podia estar a ser detido no aeroporto quando chega de não sei onde. Ou vejo um banqueiro que vai pedir a um Presidente da República para salvar o seu negócio…. Há aqui histórias, políticas ou sociais…

Fátima também dava uma bela ficção, com uma trama metida à volta de como é que aquilo foi engendrado e comunicado e aconteceu. Já foram feitos muitos trabalhos sobre Fátima, não me parece que seja por aí, mas há sempre novos enquadramentos a dar às histórias. Mas olhando até para a nossa história recente, temos casos que davam belas séries, capazes de ser distribuídas pelo mundo, se foram bem produzidas. E olhando para o mercado do audiovisual, acho que vamos chegar a este ponto, igual ou muito semelhante ao que aconteceu na música. Estou a falar de entretenimento puro e duro, que é o meu objetivo a cinco anos. Até lá vou pagar contas a fazer publicidade.

Está a falar de ficção.

De ficção, completamente.

Nem sequer é entretenimento puro e duro, é produção de ficção.

Sim. Entretenimento também pode ser uma saída, e aí é mais fácil colocar marcas. É mais fácil começar pelo entretenimento, porque consigo criar produtos um bocadinho à medida do que a marca precisa para comunicar. Mas aí estamos a falar de uma distribuição mais tradicional, não através do streaming e provavelmente através do formato televisivo, da compra de espaço para introduzir conteúdo ou outro tipo de colaborações.

Agora o que eu gostava… Sou empresário, mas estou nas áreas onde acredito que consigo acrescentar algum valor, por serem as áreas onde tenho algum skill, mas também pelo que me dá gosto fazer. Ter uma série, ter ficção produzida em Portugal e chegar a uma distribuição global, aquilo que aconteceu com La Casa de Papel é para mim um excelente exemplo daquilo que é possível aqui ao lado.

Vivi e cresci ao lado da fronteira e vejo Espanha de muito perto e vejo como não há medo de arriscar. Adquirir empresas é pouco habitual nesta área da comunicação. Admiro muita gente nesta área, algumas pessoas são referências, tenho estima e amizade por algumas pessoas, mas acho que as empresas são sobretudo geridas por consultores de comunicação.

Quando se tem na mão um produto que tem valor, se faz contas, se apresenta projetos e planos de negócio sérios e se cumpre, e já se cumpriu no passado, acho que o problema nunca é o dinheiro. O problema é ter um bom conteúdo na mão e depois ter mãozinhas para o fazer acontecer e cumprir com toda a gente a tempo e horas.

E não empresários?

E não por empresários, é esse o meu ponto. Estou muito afastado das operações, porque quero pensar como empresário. Quero pensar na rentabilidade, em planos de negócios, em como é que reinvisto o dinheiro e como é que cresço. Que, pessoalmente, gostava de fazer séries e filmes? Isso posso fazer a brincar. Agora, que dá para ganhar dinheiro com séries bem feitas, com um modelo de negócio que aposta numa distribuição global, essa é a vantagem da era que estamos a viver.

Temos as desvantagens da poluição, porque andamos todos a viajar muito e andamos todos a transportar muitas mercadorias. A vantagem boa é que posso estar aqui a fazer um conteúdo e a pensá-lo e trabalhar tão bem como um miúdo qualquer em Brooklyn, cheio de talento, mas eu tenho acesso à mesma plataforma para o distribuir.

Posso ter mais dificuldade por ser português, parecendo que não aquele entusiasmo todo dos Descobrimentos já passou, 500 anos depois. Mas podemos continuar a sonhar e a trabalhar para os concretizar. E, portanto, que eu gostava de ganhar dinheiro com uma produção bem feita e que nos posicionasse, como Ronaldo ganhou a Bola de Ouro e nos posicionou no futebol… Embora fazer isso no audiovisual!

Quanto é que está disposto a investir para que esse sonho se torne realidade?

Depende da qualidade do que tiver na mão. Se olhar para um produto… A profissão que eu mais invejo é de guionista, porque acho que os tipos são geniais, a criar histórias e a conseguir passar-me a emoção que faz com que passe uma noite toda a ver uma série sem me dar sono, nem que tenha que ir trabalhar no outro dia de direta às 7h da manhã.

Esta minha aventura começou nos eventos, o que sempre procure foi as emoções, como as levar às pessoas. Mas nos eventos estamos ali, com as pessoas. Através de um ecrã, com um guião? É genial. Tendo um bom guião… Eu não sei, sempre me meti em coisas sem ter dinheiro nenhum e as coisas foram acontecendo, porque quando as ideias são boas o dinheiro alguém to empresta e tu pagas. Eu sou um ótimo cliente de bancos, felizmente sempre que precisei da banca – e esta operação foi feita praticamente metade com a banca –, a banca sempre me disse que sim, porque sempre que lá fui paguei aquilo que devia.

E também faço negócio com o meu dinheiro e com o da banca, não com dos fornecedores. Pagamos a tempo e horas a toda a gente, não faço negócios com dinheiro do fornecedor. Quando se tem na mão um produto que tem valor, se faz contas, se apresenta projetos e planos de negócio sérios e se cumpre, e já se cumpriu no passado, acho que o problema nunca é o dinheiro. O problema é ter um bom conteúdo na mão e depois ter mãozinhas para o fazer acontecer e cumprir com toda a gente a tempo e horas. Já recorri muitas vezes à banca e nunca me disseram que não.

E até lá?

Até lá, temos que trabalhar. A produtora vive até hoje da produção de conteúdos publicitários e vai continuar a viver nos próximos tempos.

A Sonomage tem 30 anos.

Tem 30 anos, tem um histórico de produção de publicidade e de conteúdos para marcas e para instituições, e os vídeos institucionais e os spots, e os trabalhos agora no digital para os influencers e os podcasts e videocast. Isso vamos continuar a fazer agora. Agora, a ambição que tenho, ao entrar neste negócio, é maior, é entrar na ficção.

Produzem também publicidade?

Sim. Não sendo uma produtora tão conhecida quanto isso, também faz. O principal trabalho agora está na produção de conteúdos para espaço comprado em televisão. E a Sonomage vai continuar a trabalhar para outras agências. Eu estou cada vez mais distanciado da operação, porque cada agência tem os seus líderes, têm os seus clientes, e eu quero gerir o grupo como se gerem uma série de outros negócios, de forma empresarial. A minha ambição é criar o maior grupo de comunicação português.

 

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