Exclusivo Ricardo Rio acusa Governo de encaixar verbas municipais de habitação

Autarca de Braga acusa Governo de auferir "receita tão legal quanto ilegítima, à custa das autarquias” ao "coagir" as câmaras a assumirem os encargos do Programa de Intervenção em Habitações.

O presidente da Câmara Municipal de Braga, Ricardo Rio, enviou um ofício à ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, a pedir que “mude completamente as condições que foram definidas de responsabilizar as câmaras por todos os encargos do Programa de Intervenção em Habitações (PIH)”, agora que já foi anunciada para janeiro de 2023 a abertura de um novo aviso deste programa.

O autarca alerta a ministra para o risco de os municípios pagarem uma “fatura de encargos incontroláveis” com possível impacto no orçamento municipal. Ricardo Rio acusa, por isso, o “Estado de estar a encaixar dinheiro, porque está a receber o IVA – não reembolsável – que é pago pelas autarquias e pelos beneficiários”. Mais ainda, aponta Rio na missiva enviada à ministra, a que o ECO Local Online teve acesso, “o Estado não afeta recursos próprios e ainda aufere uma receita tão legal quanto ilegítima, à custa das autarquias”.

O autarca social-democrata está, por isso, preocupado com o anúncio da secretária de Estado da Inclusão da abertura de novo aviso para janeiro de 2023, tendo em conta a forma como o processo decorreu entre julho e setembro deste ano. “Fomos coagidos a financiar o PIH em que o Instituto Nacional de Reabilitação (INR) e o Estado Central não assumem nenhum encargo”, denuncia o presidente da Câmara Municipal de Braga, alertando para o incomportável impacto económico nos cofres das autarquias.

O também líder da Comunidade Intermunicipal do Cávado (CIM Cávado) pede à ministra que altere alguns critérios do aviso, como “a fixação de um teto máximo de comparticipação total e individual, por candidatura, por parte do município”. Assim como “a compensação dos municípios pelo valor do IVA suportado com as candidaturas, por exemplo, através do apoio financeiro à concretização de iniciativas municipais que cumpram o mesmo propósito”.

Na mensagem enviada à ministra, Ricardo Rio avisa, por isso, que “quanto à componente de comparticipação, nada sendo dito no aviso quanto aos limites dos valores das intervenções ou ao número de candidaturas a aceitar em cada município, a mesma assume contornos incontroláveis, confrontando-se cada município com uma fatura final de encargos que não pode de todo antecipar ou controlar”.

O Estado não afeta recursos próprios e ainda aufere uma receita tão legal quanto ilegítima, à custa das autarquias.

Ricardo Rio

Presidente da Câmara Municipal de Braga

As autarquias foram, assim, apanhadas de surpresa em todo este processo. “O que nos merece especial repúdio e suscita o envio da presente missiva é o facto de que, sem qualquer consulta ou adesão prévia, os municípios tenham sido coagidos a assumir-se como protagonista e um relevante financiador da iniciativa, com um impacto potencial não controlável sobre os seus próprios orçamentos”, começa por alertar o social-democrata, no ofício enviado à ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. E que foi dado a conhecer aos Grupos Parlamentares e à Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP).

Entramos no domínio do surreal quando se impõe, de forma unilateral e arbitrária, como consta do aviso e emana da legislação incidente sobre o PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], que terão de ser os mesmos municípios a custear todo e qualquer valor da intervenção ou equipamento acima do montante elegível de dez mil euros por candidatura, e que caberá também a estes custear o valor do IVA (não reembolsável) das intervenções. IVA esse que, recorde-se, reverte como receita final do Estado central”.

Na prática, explica ao ECO Ricardo Rio, “as câmaras municipais, sem qualquer decisão prévia nem qualquer adesão, ficaram obrigadas a ter que custear o IVA das intervenções na casa dos particulares, nomeadamente pessoas com deficiência que carecem de melhores condições de mobilidade”.

Só a Câmara Municipal de Braga validou e submeteu ao programa 11 candidaturas. “A comparticipação do PRR é de 78 mil euros e o investimento da autarquia ronda os 61 mil euros que é quase ela por ela”, assegura Ricardo Rio. As autarquias acabam por ter de desviar verbas para este programa que poderiam custear outras prioridades municipais. “A câmara tem de ir buscar ao orçamento próprio, sendo dinheiro que deixa de gastar noutras coisas porque vai estar a financiar isto”, lamenta.

Entramos no domínio do surreal quando se impõe, de forma unilateral e arbitrária, como consta do aviso e emana da legislação incidente sobre o PRR que terão de ser os mesmos municípios a custear todo e qualquer valor da intervenção ou equipamento acima do montante elegível de dez mil euros por candidatura.

Ricardo Rio

Presidente da Câmara Municipal de Braga

Por tudo isto, esta é “uma situação que causa muita apreensão”. Mais ainda, quando os presidentes de câmara foram apanhados de surpresa por toda a burocracia e critérios que constam deste programa e que Ricardo Rio quer ver corrigidos. “Ninguém falou connosco. O aviso foi lançado e os particulares vinham-se candidatar à câmara e a partir do momento em que se candidatavam, estávamos obrigados a custear esse diferencial”, denuncia.

Por isso mesmo, “não é de surpreender — com a falta de divulgação generalizada do aviso em todo o país –, a existência de apenas 80 candidaturas até ao passado dia 15 de setembro (a 15 dias da data final de submissão). Situação esta que apenas penaliza os potenciais beneficiários deste apoio”.

“Porque não terá sido consumida parte substancial da verba consignada a este programa e a secretária de Estado da Inclusão já assumiu publicamente a abertura de novo aviso para o próximo mês de janeiro“, o autarca de Braga também propõe que “a adesão de qualquer município ao programa esteja sujeita a subscrição de um termo de adesão expresso, em prazo anterior à abertura pública das candidaturas”.

A mudança dos critérios de seleção das candidaturas abrangidas no território é outra das correções solicitadas pelo autarca. Assim como que o “aviso estabeleça, de forma inequívoca, um prazo limite para a manifestação de interesse dos particulares junto do município claramente anterior à data limite de submissão das candidaturas pelo município junto do INR”, ao contrário do que aconteceu e que causou transtornos às autarquias.

Por todas estas razões Ricardo Rio solicita ao Governo que também “atue, de imediato, no que respeita ao reforço da dotação para pagamento de ajudas técnicas para atribuição de produtos de apoio para pessoas com deficiência ou incapacidade, e trate com a celeridade desejável as respostas as muitas candidaturas apresentadas à Segurança Social”. A este propósito, o autarca dá conta da existência de “processos aprovados desde, pelo menos, abril de 2022, para atribuição de ajudas técnicas, que ainda não foram concretizados for falta de dotação financeira“.

Ricardo é perentório ao afirmar que “deliberar atribuir apoios para, posteriormente, invocar falta de dotação financeira para realizar o respetivo pagamento é o mesmo que não apoiar, defraudando expectativas criadas às pessoas e famílias”. Até à data, o autarca não obteve qualquer resposta do Governo.

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