Sim, há mais vida para além do Governo
Portugal é muito mais do que o Estado e, sem dúvida, é muito mais do que os Governos. Estes passam e o país fica. Os clientes do mercado de media, felizmente, dependem pouco do Governo.
Quero acreditar que a atual situação política não terá, por si, influência relevante no atual contexto do mercado de media em Portugal. Este é mais influenciado por questões estruturais de (falta de) competitividade da nossa economia e pela conjuntura internacional marcada por uma inflação ainda demasiado elevada e por alguns fatores de incerteza e de instabilidade, do que propriamente pelo anúncio de demissão do Governo, de dissolução do Parlamento e da convocação de eleições para o próximo dia 10 de março.
É evidente que os negócios mais dependentes do Estado ficarão, inevitavelmente, numa situação mais complexa, uma vez que mesmo não havendo vazios formais de poder, haverá um aumento do vazio decisório.
Essa é uma contingência de um país excessivamente estatizado, no qual muitas decisões meramente administrativas ganham contornos políticos e tudo tem que ser visto e aprovado por membros do Governo.
A burocracia, a complexidade legislativa, a ausência de articulação entre organismos públicos e a falta de motivação e de incentivo dos funcionários públicos fazem muito mais dano à economia do que a situação conjuntural de “crise política”. O peso dos custos de contexto, a que se junta uma carga fiscal desproporcional que não é amiga do capital ou do investimento, são fatores que pesam na evolução e no dinamismo do mercado.
O Governo que até ao momento esteve em funções não fez por resolver, ao longo deste turno que durou oito anos, estes nós górdios que travam o nosso desenvolvimento e que castram o nosso crescimento económico.
Por isso, no que respeita ao mercado de media – e com a salvaguarda de que noutras áreas e para outros setores a situação possa ser diferente, e sabemos que é – a situação de Governo demitido e em funções de mera gestão de intendência nos próximos meses, até que haja um novo Parlamento e uma nova solução governativa, deverão contar pouco, ou mesmo nada, para o mercado de media em Portugal.
Ao dia de hoje, e com os dados que se conhecem, esse crescimento será anémico em 2024, ou mesmo ligeiramente negativo.
Apenas dois fatores conjugados poderiam fazer inverter este cenário e transformar o panorama de anémico para enérgico.
O primeiro fator seria haver um boost de confiança nos mercados internacionais. Para tanto (simplificando em excesso) teriam que ter fim a guerra na Europa, o conflito em curso do médio oriente, a estabilização global dos preços da energia e dos combustíveis e um contágio positivo às principais economias globais por via do combate com sucesso à inflação.
O segundo fator (também simplificando em excesso) seria termos uma solução governativa estável, reformista e dinâmica, capaz de aplicar no curtíssimo prazo um programa generalizado de redução de impostos e de transformação e de abertura da nossa economia.
Ora, estes dois cenários são altamente improváveis, mas levam-nos a uma conclusão que é a seguinte: quanto mais governamentalizadas são as economias, mais as crises políticas afetam os negócios.
A ausência de Governo, por si, não é um problema: veja-se Espanha, aqui ao lado, que em 2016 esteve 10 meses sem Governo e cresceu 3%. Ou a Bélgica, que esteve sem governo 652 dias entre dezembro de 2018 e outubro de 2020, o ano da pandemia, quebrando o seu próprio recorde anterior de 541 dias sem Governo durante os quais cresceu 2% ao ano e superou os resultados económicos do Reino Unido, Alemanha, França, Itália, Espanha, Países Baixos, Finlândia e Suíça.
Portugal é muito mais do que o Estado e, sem dúvida, é muito mais do que os Governos. Estes passam e o país fica. Quanto menos os Governos influenciarem a vidas das empresas e das pessoas e quanto mais se aterem a funções de soberania – Justiça, Negócios Estrangeiros, Segurança e Defesa – menos as crises políticas impactarão as nossas vidas.
Os clientes do mercado de media, felizmente, dependem pouco do Governo.
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