Graves ou caricatas, fraudes e irregularidades com fundos da UE
Portugal é um bom aluno na utilização dos fundos comunitários. A par da Suécia, foi o único país que teve um contrato de confiança com Bruxelas. Mas há sempre casos condenáveis.
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A “Operação Maestro” é o mais recente caso suspeito de fraude com fundos europeus. O Ministério Público (MP) está a investigar, há seis anos, Manuel Serrão e várias pessoas com quem se relaciona, pessoal e profissionalmente, por uma alegada fraude que terá lesado o Estado português em 39 milhões de euros por apropriação indevida de fundos europeus através de faturas falsas e despesas inflacionadas.
A comprovar-se não será caso único, ainda que Portugal tenha um dos melhores registos a nível europeu em termos de fraudes. A comissária europeia, Elisa Ferreira, não se cansa de sublinhar que Portugal tem “um desempenho que, globalmente, é positivo”, sendo exemplo de várias “boas práticas, de reforço de capacidade administrativa e de cultura antifraude que merecem ser lembradas”.
No período de programação 2007-2013 (QREN), foram reportados 2.709 casos suspeitos de irregularidades ou fraude na utilização de fundos europeus. Mas, até agora há apenas dois casos de fraude comprovada, envolvendo 200 mil euros de apoios agrícolas, segundo o estudo do Think Tank | Risco de Fraude, Recursos Financeiros da União Europeia, criado em 2021, pela Procuradoria-Geral da República. E no Portugal 2020 (2014-2020) há 1.320 casos suspeitos e nenhum comprovado. Mas, “a fraude ocorre de forma escamoteada e escondida e os números de fraude reportada não correspondem à fraude real”, lembra a procuradora Ana Carla Almeida.
Basta um minuto para recordar casos como o das golas anti-fumo, que levou à demissão do ex-secretário de Estado da Proteção Civil, o socialista José Artur Neves, por suspeitas de fraude que terão lesado o Estado em 364.900 euros. A “Operação Chave Mestra” que investiga um desvio de 2,5 milhões de euros, no âmbito de 21 projetos do QREN e do Modcom. Ou ainda a “Operação Rota Final”, na qual o ex-eurodeputado social-democrata, Álvaro Amaro, é arguido num alegado esquema fraudulento de viciação de procedimentos de contratação pública em 18 municípios, entre os quais a Câmara da Guarda, centrada no Grupo Transdev. Todos casos cujo desfecho ainda não é conhecido.
Mas há muitos casos graves e caricatos de fraudes ou irregularidades com fundos europeus. Aqui ficam alguns.
Caso AIMinho
É talvez o que mais semelhanças tem com a “Operação Maestro”. Há 120 arguidos (pessoas e empresas), incluindo o antigo presidente da associação, António Marques, a serem julgados por associação criminosa, fraude na obtenção de subsídios, burla qualificada, branqueamento, falsificação e fraude fiscal qualificada, crimes cometidos entre 2008 e 2013. A fraude terá atingido 9,7 milhões de euros do Fundo Social Europeu (FSE). Foram investigadas 109 operações distintas cofinanciadas por fundos europeus e pelo Orçamento do Estado. A AIminho foi alvo de um processo de execução fiscal para a devolução do dinheiro obtido ilegalmente.
Caso UGT
É considerado um dos casos mais graves e delicados pela sua dimensão política e financeira. Levou cerca de 30 anos a ficar resolvido e levou ao banco dos réus três antigos dirigentes da central sindical: Torres Couto, João Proença e Rui Oliveira e Costa. Depois dos alertas da Comissão Europeia, o MP investigou e deduziu acusação contra 36 arguidos por fraude na obtenção de subsídio para formação profissional (financiada pelo FSE), num valor superior a 358 mil contos (1,8 milhões de euros). Todos foram absolvidos por falta de provas. Mas a Comissão Europeia exigiu a devolução das verbas. Assim, desde 2017, e ao longo de 25 anos, a UGT pagará 7.500 euros por mês até saldar a dívida.
Reforma do parcelário
Portugal não fez a revisão do parcelário das ajudas a tempo o que levou a um desvio de 3,6% nas áreas elegíveis. Bruxelas exigiu a Portugal a demolição de 143,4 milhões de euros de pagamentos irregulares aos agricultores entre 2009, 2010 e 2011. Depois de muitas negociações, e de uma revisão “à pressa” do parcelário com recurso à fotografia aérea, Portugal conseguiu que a Comissão perdoasse a multa e libertasse os 600 milhões de euros que, entretanto, reteve destinados aos pagamentos aos agricultores nesse ano.
Túnel do Rossio
Nas obras do túnel do Rossio, houve um alerta de risco de aluimento. Dado o risco da situação, a Refer foi autorizada pelo Governo a contratar, por ajuste direto, os trabalhos, prestações de serviços e fornecimentos para se proceder às obras do túnel ferroviário do Rossio, por se tratar de um imprevisto — uma deficiência estrutural numa extensão de 40 metros. Um ano depois, a obra sequer tinha começado. A empreitada só foi adjudicada em julho de 2005 e previa-se que ficasse concluída no final de agosto, princípio de setembro de 2006. A Refer teve de devolver os apoios.
Remodelação hoteleira
Não foi uma fraude, mas uma irregularidade em termos de despesas apoiadas. Remonta ao início de 2014 e foi tratado com a máxima descrição. A construção de hotéis novos ou a remodelação de unidades já existentes sempre que tivessem apoios superiores a cinco milhões de euros tinham de seguir as regras da contratação pública. Mas isso não aconteceu em múltiplos casos. Em causa estavam 82 milhões de euros. A IGF obrigou à elaboração de um plano e o Compete teve de verificar, nos vários casos, se as regras da concorrência foram cumpridas e se houve prejuízo público. O Turismo de Portugal teve de responder financeiramente por 70 milhões, dos apoios pagos. Os restantes 12 milhões foram responsabilidade das empresas.
Caso do Matadouro
O Matador da Guarda foi totalmente realizado financeiramente, a despesa paga na totalidade, mas nunca passou de algumas fundações e paredes. O caso terminou com a prisão do então presidente da Câmara de Braga, Abílio Curto, “o autarca modelo do PS”, como era conhecido. Foi condenado, a 8 de novembro de 2002, a três anos e seis meses, pelo crime de fraude na obtenção de subsídio, mas a pena foi reduzida. Com ele só foi condenado mais um dos quatro arguidos, o fiscal da obra. Foram obrigados a devolver 625 mil e 455 mil euros, respetivamente, de projeto que custou um milhão de contos (cinco milhões de euros). Abílio Curto tinha sido eleito em 1976 presidente da Câmara da Guarda e exerceu o cargo ininterruptamente até dezembro de 1995, data em que foi detido e suspenso de funções.
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