“O lóbi é exatamente o oposto da corrupção”, reforça Rita Serrabulho
Rita Serrabulho, vice-presidente da Associação Public Affairs Portugal, faz o balanço destes primeiros quase três meses da entidade que pretende reunir empresas e profissionais de lóbi.
A necessidade de regulamentação do lóbi tem vindo ganhar adeptos em Portugal e já é apresentada uma das medidas do pacote anticorrupção apresentado pelo Governo em junho. No setor da comunicação, esta é uma batalha antiga da APECOM (Associação Portuguesa das Empresas de Conselho em Comunicação e Relações-Públicas), que inclusive lançou um código de conduta para autorregulação do lobbying, num microsite que lançado também com o objetivo de contar o tempo durante o qual o país vai permanecer sem legislação específica para a regulação desta atividade.
Também em maio foi lançada a Associação Public Affairs Portugal (PAPT), associação que pretende representar o setor de public affairs e representação de interesses em Portugal, e tem como membros fundadores a Atrevia, a Lift Consulting, a Loyal Ecosystem e a Political Intelligence Portugal, bem como os profissionais individuais Gonçalo Almeida Simões e Luís Rhodes Baião. O lançamento do seu site, no final de julho, é o ponto de partida para um primeiro balanço, com Rita Serrabulho, vice-presidente da associação.
A PAPT foi lançada em meados de maio. Qual o balanço destes primeiros meses?
Não podia ser mais positivo. Diria até que excedeu as expectativas, no sentido em que as interações que temos tido, quer com os stakeholders públicos quer privados, têm sido no sentido de muito reconhecerem a importância do nascimento de uma associação que represente o setor, e que tem como missão não apenas contribuir para a sua valorização, mas também para a sua literacia e regulamentação.
No que aos decisores públicos diz respeito, em dois meses reunimos com os grupos parlamentares e temos também já agendadas audiências com o Governo. Sem exceção, fomos recebidos com entusiasmo e, de uma forma geral, encontrámos um amplo consenso politico para avançar com a regulamentação.
Para esse fim, a Public Affairs Portugal partilhou também os seus contributos com estes decisores, que têm como objetivo enriquecer os diferentes projetos de lei de cada partido, que foram também muito bem acolhidos.
Relativamente às empresas e profissionais individuais, a Public Affairs Portugal tem sido encarada como uma organização que era há muito desejada, uma vez que permitirá às organizações terem uma representação de uma área muito relevante na atividade das empresas, e que muito pode contribuir quer para a sua transparência, quer para a sua profissionalização em Portugal.
A PAPT pretende juntar os profissionais a título individual e as organizações que se dedicam à atividade em representação própria ou de terceiros. Ou seja, profissionais, empresas e agências. Porquê esta opção?
Porque a atividade profissional de public affairs é desenvolvida por diferentes organizações, e os seus profissionais – independentemente de estarem a trabalhar na representação de interesses próprios ou de terceiros, – devem ter esse reconhecimento profissional. É incontestável que esta atividade existe há muitos anos em Portugal. Creio ser também incontestável o valor que acrescenta às empresas e sociedade civil, mas também ao país, quer em termos democráticos, económicos e sociais.
Falta efetivamente regular, para que esse valor seja reconhecido e possa ocorrer de forma transparente, evitando assim que vivamos num ambiente de desconfiança continua sobre as atividades quer dos atores públicos, quer privados. Com esta abrangência – agencias, empresas e sócios profissionais individuais, – ou seja, todos aqueles que praticam a atividade profissional de public affairs, estarão representados.
Pretendem, de acordo com o site, “desenvolver iniciativas de literacia direcionadas à sociedade civil e outros stakeholders sobre a gestão de Assuntos Públicos e a Representação de Interesses”. Que ações estão planeadas?
Um dos constrangimentos identificados relativamente à representação de interesses, é precisamente o elevado desconhecimento do que isso significa. Acresce a este fator, a forte perceção negativa que o lóbi tem em si, por ser muito associado – erradamente – a casos de corrupção. Ora, o lóbi é exatamente o oposto da corrupção. O lóbi é uma prática necessária em qualquer sociedade evoluída e democraticamente amadurecida, porque é o que vai permitir uma maior participação da sociedade civil na definição de políticas públicas.
Se esta relação não existir, como podem os legisladores construir e desenvolver leis que estejam próximas da realidade da vida das pessoas e da economia real? Como podem os investidores dar a conhecer os projetos que querem desenvolver em Portugal, se muitos destes projetos passam obrigatoriamente por mercados que são regulados por organismos públicos?
Dito isto, se os cidadãos, empresas e organismos públicos não entenderem esta realidade, estas relações continuarão a ocorrer num clima de desconfiança, de medo e de insegurança. Não é bom para ninguém.
Neste sentido, a Public Affairs Portugal definiu como uma das prioridades para este primeiro triénio, desenvolver um conjunto de atividades de literacia, que passam por construir protocolos com a academia, de forma a que os public affairs passem a ser parte também dos seus programas.
Por outro lado, iremos fomentar debates entre sociedade civil e decisores públicos, promover conferências nacionais e internacionais sobre a atividade e os seus diferentes players, promover estudos, práticas e tendências internacionais que enquanto associados da PACE temos acesso, entre outras ações.
Quantos associados têm neste momento e quais os objetivos em termos de número de associados?
Em apenas dois meses temos já 15 associados, e mais dez empresas a analisar a sua adesão.
No site têm os membros fundadores mas não os associados. Vão ser públicos?
Nesta primeira versão do site quisemos privilegiar a informação de base da Public Affairs Portugal e a adesão de novos sócios. Tornar públicos os membros associados não foi agora uma prioridade , mas é uma decisão que tomaremos em conjunto mais à frente, quando tivermos já uma maior massa associativa.
A regulamentação do lóbi faz parte do pacote anticorrupção aprovado no último mês em Conselho de Ministros. Quais as expectativas em relação a esta decisão?
A regulamentação tem que ser uma prioridade politica. Ninguém compreenderá, que depois de todos os acontecimentos recentes e que se repetem no nosso país, dos quais a maioria poderiam ser esclarecidos com a existência de registos e pegada legislativa, que este tema – com tão largo consenso politico, – não seja realmente uma discussão para ocorrer ainda em 2024. A sociedade civil não pode continuar a não confiar nas instituições que nos governam e o país não pode continuar a ser olhado com uma desconfiança permanente. A nossa expectativa é que até ao final do primeiro semestre de 2025, a lei que venha a ser aprovada esteja em vigor.
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