Media

“Hoje é um dia histórico”, diz Francisco Pedro Balsemão

+ M, Lusa,

Gestores dos principais grupos de media avaliam plano de ação para os media apresentado esta terça-feira e alertam para a transferência das receitas dos media para as grandes plataformas digitais.

Os responsáveis dos principais grupos de media do país aplaudem a existência do plano de ação para os media, apresentado na manhã desta terça-feira por Luís Montenegro e Pedro Duarte. “Hoje é um dia histórico, pelo fim da publicidade na RTP. É uma reivindicação antiga dos privados. É só na RTP, devia ser em todos os canais e digital“, resume Francisco Pedro Balsemão.

Ainda há, no entanto, muito por esclarecer, começou por realçar o CEO da Impresa, num debate que juntou também a Media Capital, a Medialivre, o grupo Renascença Multimédia, o Público e a RTP, lembrando que no caso da diminuição progressiva da publicidade no operador público, uma das principais medidas, não está claro se o Governo se refere apenas à RTP1 ou ao universo RTP, questão que acabou por ser esclarecida por Nicolau Santos, presidente da RTP. “O corte é só na RTP1, o resto é residual“, afirmou no debate.

Analisando os quatro eixos das medidas, Francisco Pedro Balsemão destaca também que, no campo da regulação e da legislação, era importante pensar-se que “já existem leis que devem ser aplicadas, implementadas, reforçadas, como as relacionadas com o combate à pirataria, por exemplo. “Estamos expectantes para ver o que vai ser feito em relação à ERC, é uma entidade que deve ter um propósito de regular o setor e a transparência de propriedade e não deve servir para censurar e interferir em conteúdos”, afirmou o responsável, apontando que também ao Governo não cabe o papel de qualificar a informação. “Compete aos jornalistas e às redações fazer essa avaliação e decidir o que é ou não é notícia ou tem relevância editorial“, concretizou numa alusão ao discurso de Luís Montenegro, no qual o primeiro-ministro criticou a forma como se faz jornalismo. “Não nos podem dizer que não é assim que se faz jornalismo”, reforçou.

Sobre o fim da publicidade comercial na RTP, Pedro Morais Leitão, CEO Grupo Media Capital, alertou que a medida não significa que esse investimento publicitário venha a reverter em benefício direto de outros players do setor e chamou a atenção para a transferência das receitas para as plataformas digitais.

“A RTP já tem uma quota reduzida no mercado de publicidade e não é certo que o estarmos a reduzir, isto venha reverter em favor de outros concorrentes, […] há claramente uma transferência de publicidade para as plataformas digitais, haverá possivelmente uma transferência de publicidade para meios mais fragmentados, mas não é evidente que esses seis milhões venham a reverter totalmente a favor das televisões existentes”, defendeu Pedro Morais Leitão.

Enquanto ponto em falta no plano apresentado, Pedro Morais Leitão evidenciou também a questão da TDT (televisão digital terrestre), um “tema caro” à Media Capital. “Há ainda muitas pessoas cuja janela para o mundo é a TDT, cerca de 150.000 lares, é complicado o que é que se lhes vai propor como alternativa, mas acho que é um tema que, neste momento, está a afetar seriamente o que é a distribuição de televisão em Portugal, cria distorções entre as relações que existem entre os produtores de televisão e os seus distribuidores e são essas distorções que importa abordar”, apontou.

Luís Santana, da Medialivre, apontou também estar em falta no plano uma “intervenção mais musculada” junto das grandes plataformas digitais que “lapidam” a fonte de receitas oriunda da publicidade digital, apelando à ação não só a nível nacional mas também europeu.

O CEO do grupo dono da CMTV e Correio da Manhã destacou ainda a importância do combate à desinformação e defendeu que este deve evoluir até ao ponto de penalizar criminalmente quem usa os conteúdos de outros de forma lesiva. Sublinhou também a situação “muito crítica” de haver quatro concelhos e “largas dezenas de freguesias” que não têm acesso a pontos de venda de jornais ou revistas.

Relativamente à imprensa, Cristina Soares, do Público, alertou para a crise profunda que afeta este setor e chamou uma vez mais a atenção para as grandes plataformas digitais. “Nós hoje temos os custos, as redações e as obrigações regulatórias e as plataformas digitais têm as receitas e continuam desreguladas”, lamentou a responsável.

Quanto à rádio, o presidente do Conselho de Administração do Grupo Renascença, o cónego Paulo Franco – a quem uma das medidas do plano que agrada profundamente é a da revisão da legislação que está “completamente obsoleta” – lembrou que a RTP não é só televisão e que tem também as três antenas com cobertura nacional de rádio.

“O tema da publicidade pode pensar-se que não se coloca na rádio, no entanto, às vezes, há outras formas dissimuladas de publicidade, em formato de patrocínios […] e também é importante que a regulação não feche os olhos a estas formas dissimuladas de publicidade com o título de patrocínio”, realçou.

Concordante com a ideia da necessidade de se tomarem ações em relação às grandes plataformas digitais e de que é “urgente” a regulação desta matéria – em termos de publicidade e da utilização dos conteúdos de media “de forma abusiva onde peca a retribuição” – o responsável da Renascença pediu ainda uma “atenção especial” aos conteúdos dos privados que são de serviço público e a um possível “benefício fiscal”.

Na sua intervenção, Nicolau Santos sublinhou que o setor da comunicação social, em particular o setor privado, está a “passar por sérias dificuldades”. “Se queremos ter uma democracia forte, que funcione, temos de ter diversidade dos órgãos de comunicação social e temos de ter, sobretudo, sustentabilidade dos órgãos de comunicação social”, defendeu o presidente do Conselho de Administração da RTP. “Aprendi muitas vezes a ouvir esta frase do dr. Francisco Pinto Balsemão: que não há independência editorial se não houver independência financeira“, prosseguiu.

Nicolau Santos alertou ainda que as “Netflix estão a entrar” no negócio das televisões, pelo que faz “mais sentido ter entendimento a nível nacional para defender os media nacionais para fazer face a este avanço”, reitereando a necessidade de as empresas de media se entenderem e trabalharem em conjunto, porque não é a RTP que ameaça os privados, mas antes as grandes plataformas internacionais. Os operadores privados sabem muito bem que a RTP muitas vezes tem servido de estabilizador no mercado publicitário“, sublinhou.

A saída da RTP do mercado publicitário também significa uma perda de relevância da RTP“, independentemente de se conseguir a solvabilidade e ter um serviço público “mais fraco” é ter também “uma democracia mais fraca”, advertiu, defendendo também “além do Governo, é fundamental que a sociedade civil e os empresários se envolvam” para preservar um ecossistema nos media privados.

(notícia atualizada às 15h37)

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