Tendência para ser do contra
Proponho a tendência Back to Basics. Muito simplesmente que a tal gente do marketing -- na qual, muito humildemente me incluo -- torne a procurar a curiosidade natural que a fez entrar neste mundo.
Para os mais distraídos, estamos no final do ano. Estou em crer que não era preciso estar a chamar à atenção para esta evidência. Bastava prestarem atenção à publicidade que se faz para aí, para perceberem que os anúncios de milhões de Natal das Telcos ocuparam os ecrãs por todo o lado, deixando pouco espaço para os outros, coitados.
Enfim, chegados aqui, é tão certinho, como eu ter estas duas moscas a chatearem-me tanto enquanto escrevo este texto, que até pareço um burro em Sobreira Formosa por altura do calor, que vai haver uma catadupa de entendidos que vão apresentar-se para discorrer sobre uma ou duas coisas:
- Olhar para o que aconteceu, fazendo análises, balanços ou coisa que o valha para, a partir daí, passarem a ser espetaculares porque são resilientes e aprenderam com os erros. Por uma questão de igualdade de género, como já chamei o burro para conversa, chamo agora a burra para me socorrer do ditado popular que diz que para trás mija a dita. Portanto, tanta letra para assim dizer que se é para isto que ainda estão comigo neste conteúdo, mais vale irem espairecer, porque isso não vai aqui acontecer;
- Depois, há os iluminados que nos trazem o futuro numa bandeja, concretizado em tendências, depois de lerem dois ou três artigos que articularam com outros tantos documentos publicados por uma grande consultora, não sem antes terem passado pelo ChatGPT. Normalmente são cinco ou dez, para ser um número certinho. Mas caramba, aqui também se dá o caso de eu ter a tendência para não gostar de tendências, até pela minha evidente falta de visão e paciência para as mesmas. É que, tendencialmente, amarram-nos.
Ainda assim, com um antecipado pedido de desculpa, atrevo-me a dizer dois ou três disparates.
Em primeiro lugar, uma tendência quer-se em inglês. Toda a gente do marketing sabe disso. Já agora, se fosse há mais de quarenta anos, seria em francês que era também a forma como a nossa grande política se exprimia lá fora. Politiquices à parte, vejam os casos de Soares e de Cunhal. Agora, para sustentar este meu argumento da obrigatoriedade daquele idioma, não me peçam é para usar os exemplos contemporâneos de Guterres, de Costa ou de Montenegro, porque assim este pensamento cairia pela base. Ou não, se disser que são a exceção que confirma a regra.
Portanto, se queremos um wow effect, toca a puxar pela cabeça para sacar uma expressão out-of-the-box que nos ajude, mesmo que não tenhamos nada de verdadeiramente relevante para acrescentar numa reunião.
Assim sendo, e indo straight to the point, proponho a tendência Back to Basics. E o que propõe o Back to Basics? Muito simplesmente que a tal gente do marketing — na qual, muito humildemente me incluo — torne a procurar a curiosidade natural que a fez entrar neste mundo.
Que volte a saber fazer as perguntas certas e, em função das respostas às mesmas, consiga definir um caminho sem estar presa às tais formulações proferidas por um qualquer guru numa conferência com um título pomposo. Que tenha liberdade de pensamento, espírito crítico e ousadia criativa. Que tenha falta de respeito pelo erro e a coragem para não ter abordagens mais do mesmo. Que seja dissonante e relevante. Que seja independente de canais ou outras gavetas, porque antes de tudo vem o problema ou a oportunidade e logo a seguir a ideia. Que seja culta, que leia livros, que veja filmes e que vá ao teatro ou a exposições. Que viaje pelo planeta fora e ganhe esse mundo, seguramente mais inspirador que muitos novos paradigmas que por aí andam.
Que ande de transportes públicos para perceber como é que as pessoas que não têm carro da empresa vivem e consomem produtos e conteúdos. Que considere a “dicotomia” entre o impacto da tecnologia (designadamente no que respeita à Inteligência Artificial (Generativa) e à sua capacidade para amplificar a nossa criatividade e engenho) e a relevância da capacidade das pessoas em perceberem as emoções e o contexto, para assim melhor contar uma história baseada numa “big idea”. “It takes two to tango”, não é verdade?
Enfim, uma tendência que seja independente de tendências. Para ser do contra.
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