Spinumviva. Deputado do PSD atacou a liberdade de imprensa? A reação dos partidos
Hugo Carneiro sugeriu vigiar o telemóvel de deputados para descobrir quem partilhou informações com a imprensa. Partidos saíram em defesa da liberdade de imprensa e deixaram farpas a Luís Montenegro.
Depois de Luís Montenegro ter submetido junto da Entidade para a Transparência uma nova declaração de interesses relacionados com a empresa Spinumviva e de essa informação ter sido conhecida pouco antes do debate com Pedro Nuno Santos, Montenegro disse não ter difundido nem promovido a difusão do documento e, na quinta-feira, considerou haver indícios de que o PS “tem muito mais a ver” com a divulgação dos clientes da empresa Spinumviva.
O Observador avançou que o deputado socialista Pedro Delgado Alves assumiu, numa reunião no Parlamento, ter acedido à informação que o primeiro-ministro e líder do PSD enviou à Entidade e que partilhou informação com Fabian Figueiredo, do Bloco de Esquerda. Ambos os parlamentares já negaram ter divulgado a informação.
Mas o PSD prometeu ir até “às últimas consequências” para apurar o caso, tendo inclusive Hugo Carneiro, deputado do PSD, pedido ao Grupo de Trabalho do Registo de Interesses no Parlamento que peça à Entidade para a Transparência os registos de quem acedeu aos dados sobre o primeiro-ministro, de forma a descobrir quem partilhou a informação com a imprensa. As reações dos partidos não se fizeram tardar, em defesa da liberdade de imprensa e aproveitando para deixar farpas a Luís Montenegro.
O líder do Partido Socialista acusou desde logo o PSD de desrespeitar a liberdade de imprensa, defendendo que Luís Montenegro já não deveria ser candidato a primeiro-ministro nas eleições legislativas de 18 de maio. “Essa é mais uma razão para que nós não corramos o risco de ter à frente dos destinos do país um partido e pessoas que não têm o respeito pela liberdade de imprensa. É mesmo preocupante, é grave que dirigentes do PSD estejam, neste momento, a tentar atacar aquilo que é o trabalho da comunicação social e dos jornalistas”, afirmou Pedro Nuno Santos.
Além de “não ser a primeira vez” que dirigentes do PSD fazem declarações “que não são abonatórias para a liberdade de imprensa”, Luís Montenegro “faz tudo o que está ao seu alcance, inclusivamente intimidar jornalistas para que não revelem aquilo que é obrigatório ser revelado por lei, aquilo que por lei já havia ter sido declarado há um ano”, defendeu o secretário-geral socialista.
O líder do Chega também lamentou as declarações de Hugo Carneiro. “Percebo que o PSD queira desviar as atenções disto para quem é que acedeu, quem é que não acedeu. Eu vi já pedidos de Polícia Judiciária. A Polícia Judiciária não tem mais que fazer do que agora ir ver quem é que passou uma declaração, não sei para que jornalista? Não há corrupção para combater, não há crimes violentos para combater? Queremos pôr a PJ a parar o que está a fazer e dizer vamos lá ver como é que a declaração de interesses foi parar a um jornal?”, questionou André Ventura.
Rui Rocha, sublinhando que a Iniciativa Liberal defende a liberdade de expressão “sem reservas”, disse que estava “profundamente chocado” que “um deputado da nação ponha sequer a hipótese que há alguma tentativa de perseguição de quem fez o seu trabalho jornalístico”.
“Aquilo que está em causa, fundamentalmente, é informação a que os portugueses têm direito. E o que me parece também é que temos um comportamento ao longo deste processo de Luís Montenegro que atrasa sempre a prestação de informação, o esclarecimento dos portugueses e as questões da transparência. Portanto, a haver alguma condenação política tem de ser essa: que se esclareça tudo para podermos passar às ideias e às propostas e que, no meio disso, em caso algum é admissível atacar-se a liberdade de expressão”, disse o líder da Iniciativa Liberal.
Já a coordenadora do Bloco de Esquerda disse mesmo que o PSD está “de cabeça perdida” após a divulgação da lista de clientes da Spinumviva e acusou Luís Montenegro de violar as suas “obrigações legais e formais”.
“Luís Montenegro escondeu do país, em violação das suas obrigações legais e formais, a lista de clientes da sua empresa, da qual recebeu avenças enquanto era primeiro-ministro. E o PSD agora, perante isto, está de cabeça perdida. É a única forma de avaliarmos o que se tem passado nos últimos dias, com instruções para a Polícia Judiciária vigiar telefones de deputados, de jornalistas. O PSD está de cabeça perdida”, acusou Mariana Mortágua.
“Não podemos desvalorizar essas afirmações de muito mau tom” que servem para “desviar a atenção dos problemas centrais” disse, por sua vez, Paulo Raimundo. O secretário-geral do PCP reiterou também que Luís Montenegro “já se devia ter demitido”.
A porta-voz do PAN também acusou a AD de “desprezo pela liberdade de imprensa” e de “atacar jornalistas” para ocultar que o primeiro-ministro não “acautelou todas as obrigações legais” no seu registo de interesses. Segundo Inês de Sousa Real, à semelhança do que já aconteceu em momentos anteriores, demonstraram “desprezo pela liberdade da imprensa e o direito ao jornalismo” e de optarem por “atacar a imprensa e atacar os jornalistas”.
“Não é a primeira vez que temos episódios relacionados com este Governo, não só a atacar a imprensa, atacar os jornalistas, como estar a utilizar aquilo que é um mecanismo de crítica ao acesso à informação, para ocultar que o problema é, de facto, o primeiro-ministro não ter prestado esta informação à Entidade para a Transparência”, acrescentou.
Por parte do Livre, Rui Tavares disse ser “preciso que Luís Montenegro seja sério e não se concentre no que será investigado a seu tempo mas que é um detalhe”.
“O que não é um detalhe é Luís Montenegro ter escondido os seus clientes. [A ameaça aos jornalistas] também não é obviamente nenhum detalhe porque é evidentemente crime obrigar os jornalistas a divulgar fontes“, disse o líder do partido.
O Sindicato dos Jornalistas (SJ) também condenou as declarações do deputado social-democrata Hugo Carneiro, considerando que “é uma tentativa clara de pressão que ameaça a liberdade de imprensa”. O sindicato argumenta que a legislação prevê que “sem prejuízo do disposto na lei processual penal, os jornalistas não são obrigados a revelar as suas fontes de informação, não sendo o seu silêncio passível de qualquer sanção, directa ou indirecta”.
“O que está sobre sigilo são as fontes de jornalistas ao cobrir temas de inegável interesse público”, condena.
Já o Presidente da República desvalorizou a polémica, atribuindo-a ao “calor” e “lado emocional” da campanha eleitoral. “Estamos num clima eleitoral. No clima eleitoral há sempre um calor, um lado emotivo muito grande. Estamos a 15 dias de eleições, terminaram os debates“, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, em declarações aos jornalistas, transmitidas pela RTP3.
“Isso acontece em clima eleitoral das democracias mais sofisticadas”, considera Marcelo Rebelo de Sousa, acrescentando que “há um lado de luta político-partidária que existe” e é natural surgirem “picardias”.
O Chefe de Estado mostrou-se mais preocupado sobre os esclarecimentos dos partidos sobre a exequibilidade das propostas apresentadas pelos partidos nos programas eleitorais das legislativas de 18 de maio.
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