“A RTP ganharia em ser uma televisão também privada”
Pedro Loureiro, fundador e CEO da Media Gate, acredita que a RTP ganharia mais em ser privada. A solução para a Cofina é definida como "a mais simpática para o mercado", defende.
“Acho que não faz sentido uma televisão hoje ser propriedade do Estado. É uma visão mais política do que de media, mas acho que a RTP ganharia em ser uma televisão também privada”. A posição é de Pedro Loureiro, fundador e CEO da Media Gate, de acordo com a Media Monitor a maior agência de media nacional.
A compra da Cofina pelos seus quadros, por Cristiano Ronaldo e por três dos anteriores acionistas, é encarada como a “melhor para o mercado, para a Cofina e para as pessoas que lá trabalham”.
Começamos por falar de meios. Nos últimos meses assistimos à disputa pela Cofina Media, que acaba por ser vendida aos atuais gestores e alguns acionistas, em consórcio com Cristiano Ronaldo. Como é que vê esta solução?
Para nós, mercado, parece-nos ser uma solução mais simpática. Quanto mais interlocutores tivermos, melhor também, mais rico fica o panorama dos media. Se fosse a outra solução a vencedora, a Media Capital a comprar a Cofina – como já foi a tentativa de a Cofina comprar a Media Capital e já tinha inclusivamente autorização por parte do regulador –, essa fusão não causaria, digamos, transtorno ao mercado.
Mas, nesta situação, julgo que é a melhor solução para o mercado. E também acho que é uma solução melhor para a Cofina, nomeadamente para as pessoas que lá trabalham.
Porquê?
Porque é uma relação de continuidade. E as pessoas que a compraram, muitas delas, são apaixonados pelo seu trabalho. A começar pelo Luís Santana e pelo Luís Ferreira [diretor-geral e diretor-geral comercial], que acompanho mais de próximo.
Acho que é uma solução muito boa para a Cofina e é também para mercado, porque quanto mais interlocutores, maior a independência e temos soluções mais vastas.
E a consolidação dos media, de que tanto se fala?
Não temos assim tantos media. É natural, em todos os países do mundo, haver três televisões importantes, vários jornais importantes, várias rádios importantes. Em Portugal não temos propriamente uma saturação.
Quando diz três televisões…
Estou a colocar a RTP, que naturalmente é um player.
Ia perguntar se já estava a acrescentar a CMTV.
São situações diferentes – o free-to-air ainda é o free-to-air (FTA). A CMTV comporta-se de alguma forma como um canal FTA, mas é um canal a cabo e tem outras características diferentes, outros públicos e outras formas de estar. A RTP é de facto um player importante no nosso mercado.
Acho que é uma solução muito boa para a Cofina e é também para mercado, porque quanto mais interlocutores, maior a independência e temos soluções mais vastas.
E faz sentido que continue a ter publicidade?
Faz sentido ter publicidade, eventualmente, na minha opinião, não faz sentido ser do Estado. Acho que não faz sentido uma televisão hoje ser propriedade do Estado, mas isso digamos que é uma visão mais política do que de media. Mas acho que a RTP ganharia em ser uma televisão também privada.
Que existisse um processo de privatização?
Sim, penso que faria sentido. Houve alturas em que, de facto, fazia sentido haver televisões estatais. Foram assim que elas nasceram, porque o processo era complicado, era caríssimo fazer uma televisão, só um Estado é que poderia assegurar essa televisão.
A partir do momento em que há a democratização e que há o acesso de todos à televisão, começa a ser difícil ser televisão do Estado. Mas são questões, penso eu, mais políticas do que propriamente de media.
Assistimos também na Global Media, dona da TSF, do Diário de Notícias ou Jornal Notícias, a mudanças na estrutura acionista e na direção de DN e TSF. Como é que olha para este movimento?
É um grupo mais difícil, mais ligado à imprensa. Tem também uma rádio que foi muito importante e que continua a ser muito importante. Vejo sempre como boa possibilidade, digamos, de uma renovação e de uma maior agressividade em termos comerciais.
É o que acredita que vai acontecer?
Acredito que vá acontecer. A entrada de novos acionistas traz sempre, digamos, alguma melhoria. Quando entra um acionista novo existe uma esperança diferente, não é? Para as próprias pessoas que lá trabalham, acho que pode ser importante.
Resumidamente, como vê o setor dos media em Portugal?
Somos um mercado muito pequeno, está inclusive praticamente a encolher, na comparação com o resto do mundo ou o resto da Europa. Um mercado que tem menos dinheiro é um mercado que funciona menos bem, e o mercado dos meios tem sofrido de facto alguma erosão.
Embora esteja agora a fazer alguma recuperação dessa perda de investimento, continuamos a ser um mercado muito pequeno, comparativamente com Espanha.
Perguntava ainda em termos de grupos de comunicação social social e não tanto do investimento publicitário.
Mas o investimento publicitário é fundamental porque é aquilo que garante a independência dos meios e, portanto, é de facto relevante que haja maior investimento. Numa economia que encolhe ou que não tem grandes marcas portuguesas, acaba por ser um mercado mais pequeno.
Basta olharmos aqui para Espanha, que é dez vezes, no mínimo, maior do que nós em termos de investimento publicitário, para percebermos que as capacidades e a independência também dos próprios meios está mais assegurada do que em Portugal.
A independência dos meios está ameaçada em Portugal?
Não, não acho que esteja ameaçada. Acho é que com menos dinheiro a independência é sempre mais difícil. Mas não vejo ainda que exista alguma situação de asfixia democrática.
E em termos de resposta aos anunciantes, às necessidades e às novas necessidades dos anunciantes, de forma geral os meios estão a responder bem?
Acho que sim. Acho que os meios se reinventaram todos eles. Desde a rádio, com os podcasts e não só, já estava no online há muitos anos. Mas a rádio saiu da ideia do rádio e olhamos para ela como áudio e não apenas como emissor. Acabam por ser várias reinvenções.
Os próprios jornais, que são fundamentais para a democracia e para a polaridade, também se reinventaram – com situações que há uns anos eram mal vistas, como os branded content –, mas reinventaram-se com várias fórmulas, com as conferências.
Branded content fala de produtos/textos identificados como sendo publicidade.
É verdade. Mas há de facto uma forma diferente de se relacionar com o mercado. Também há uma forma diferente de fazer publicidade. Hoje a comunicação passa por muitas situações, a televisão não é só breaks, os jornais não são só páginas, a rádio não são só breaks publicitários.
Hoje há muitas formas de as marcas se relacionarem com os seus públicos e os meios foram quem, na realidade, tornou possível essa situação. Os meios têm uma grande capacidade de se adaptar ao mercado, a necessidade faz o engenho, e acho que foi um bocadinho por aí que as coisas foram se desenvolvendo.
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