“Todos dizem que Código da Contratação Pública não está ao serviço do investimento”

O presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR pede uma "reflexão profunda do Código da Contratação Pública" e defende que este não pode estar "espartilhado" apenas nos fundos europeus.

O presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência (CNA-PRR) pede ao Executivo de Luís Montenegro que faça uma reflexão estratégica sobre o Código de Contratação Pública, nomeadamente ao nível dos montantes, sem pôr em causa a transparência ou o princípio da concorrência.

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“É estranho que tenhamos todas as entidades com quem falamos, todos os ministros dos vários governos responsáveis por esta área, a dizer que o Código da Contratação Pública não é, neste momento, um instrumento que esteja ao serviço do ponto de vista estratégico dos vários investimentos e que não façamos uma reflexão profunda sobre que Código da Contratação Pública, de acordo com a Diretiva Europeia”, diz Pedro Dominguinhos no ECO dos Fundos, o podcast quinzenal do ECO sobre fundos europeus.

Recordando os atrasos na entrega das carruagens para a CP, que ditam a impossibilidade de estas serem financiadas pelo Portugal 2030, Dominguinhos sublinha que em Espanha o mesmo problema é solucionado em meses. “Não acredito, nem posso aceitar, que o sistema espanhol seja mais inteligente que o nosso. Temos de ter instrumentos que, respeitando os princípios básicos da transparência, do combate à corrupção e à fraude e da concorrência, sejam capazes de dirimir os nós górdios que identificamos”, frisa.

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No anterior Governo assistimos a várias medidas que foram implementadas na tentativa de acelerar a execução dos fundos, mas com poucos resultados. O que falta?

Falamos de um processo. Quando temos um novo regime de visto prévio especial ao Tribunal de Contas, não é esse regime que, imediatamente, mete uma casa de pé. Aquilo que faz é reduzir, do ponto de vista do tempo processual, o início da obra. As entidades têm de respeitar o Código da Contratação Pública, com todas as fases processuais. A única coisa, que não é despicienda, e vários autarcas sentiram algum desconforto desse ponto de vista, porque o visto prévio, se fosse recusado, não havia qualquer implicação legal para eles, se for a posteriori pode haver uma implicação legal, o que significou que têm de cumprir todas as regras. Conseguimos começar a construir mais rapidamente, mas há pareceres do próprio Tribunal de Contas, já com a aplicação desta lei, que recomendam que se inclua nas peças processuais, uma cláusula para que a obra apenas se iniciará após a concessão do visto do Tribunal de Contas. Há aqui uma tensão latente mesmo neste novo decreto-lei que precisa de ser trabalhado para que conseguimos acelerar verdadeiramente a execução.

Há também o levantamento do efeito suspensivo automático, mediante uma decisão sumária do juiz.

Na questão de diminuirmos a litigância houve claramente vantagens. Tivemos vários processos anteriormente, por exemplo, a via do Ave Parque é talvez o exemplo mais paradigmático, continua em tribunal a carecer de decisão do mesmo. Por isso é que neste relatório fazemos uma recomendação mais global: o Governo, porque é quem tem competência, possa, de um ponto de vista global, e não apenas como uma medida de execução do PRR, refletir mais estrategicamente sobre o novo Código de Contratação Pública. Nomeadamente sobre os montantes, porque estamos muito abaixo daquilo que é a diretiva comunitária, sem colocar em causa a transparência, o princípio da concorrência. Não é isso que está em causa. Mas é estranho que tenhamos todas as entidades com quem falamos, todos os ministros dos vários governos, responsáveis por esta área a dizer que o Código da Contratação Pública não é, neste momento, um instrumento que esteja ao serviço do ponto de vista estratégico dos vários investimentos e que não façamos uma reflexão profunda sobre que Código da Contratação Pública, de acordo com a Diretiva Europeia.

Fernando Alfaiate disse aqui no ECO dos Fundos que a margem de manobra para se mudar o Código da Contratação Pública não é assim tão grande.

É uma opinião. Acho que há um conjunto significativo de áreas que podem melhorar e acelerar a execução. Por exemplo, ao nível dos limiares de cada um dos procedimentos concorrenciais, estamos muito abaixo daquilo que é a diretiva comunitária ou de outros países. As alterações que foram feitas estão indexadas ao PRR ou aos fundos europeus. Não podemos ter um Código que esteja espartilhado apenas para um conjunto de instrumentos financeiros. Para além dos fundos europeus, as entidades continuam a necessitar de aplicar o Código da Contratação Pública. Devemos fazer uma reflexão muito aprofundada, diminuir interpretações. Basta olharmos para aquilo que são fatores de exclusão. A imaginação criativa que temos visto nos concursos é particularmente relevante, que depois conduz a uma litigância muito grande. Veja-se o exemplo que temos da aquisição de equipamento circulante para a CP. Está parado há vários meses e em Espanha, a mesma situação, resolve-se em poucos meses.

[Temos] todas as entidades com quem falamos, todos os ministros dos vários governos, a dizer que o Código da Contratação Pública não é, neste momento, um instrumento que esteja ao serviço do ponto de vista estratégico dos vários investimentos.

Porquê?

Não acredito, nem posso aceitar, que o sistema espanhol seja mais inteligente que o nosso. Temos de ter instrumentos que, respeitando os princípios básicos da transparência, do combate à corrupção e à fraude e da concorrência, sejam capazes de dirimir os nós górdios que identificamos. Nos vários relatórios da Comissão de Acompanhamento, temos identificado um conjunto de áreas significativas onde toda a gente é consensual a apontar as falhas. O diagnóstico está mais do que feito. Em muitas das situações não precisamos de mais dinheiro para fazer estas implementações.

Precisamos de?

Precisamos de refletir sobre o processo, porque não é passar de um papel para o envio de uma declaração em email que resolvemos o problema da carga administrativa. Apenas mudamos o meio. Temos de olhar numa lógica de criação de valor, para todas as fases dos vários processos e temos de perceber onde é que podemos eliminar sem prejudicar os princípios que referi. Temos de dar mais transparência a todo o processo. Temos exemplos de empresas públicas, já para não falar as privadas, de autarquias onde este processo está resolvido com ganhos claros do ponto de vista da redução do tempo, do aumento da transparência e, acima de tudo, da resolução do problema, quer dos cidadãos, quer das empresas.

Era só adaptar essas boas práticas?

É uma reflexão profunda, não é simples, porque precisamos também de uma outra filosofia de olhar para o cuidado que temos de ter em ser mais eficientes e ser mais eficazes. Estamos a aumentar o PIB fruto de termos mais recursos, mas não estamos a conseguir ter um aumento da produtividade na mesma linha. Há ganhos de eficiência que temos de garantir para prestar um melhor serviço ao cidadão e às empresas, diminuindo os tão famosos custos de contexto.

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