PRR: Realidade ou ficção na execução das metas até 2026?

  • João Carvalho
  • 25 Novembro 2025

Portugal deveria ter apostado mais nas contribuições para o Programa Europeu para a Indústria da Defesa (EDIP) e para os programas comunitários por comunicação de satélite.

Uma análise do documento emitido pelo Governo a propósito do necessário aproveitamento do PRR leva-nos a duvidar de muitas das metas apontadas, por serem, em si mesmas, irrealistas, ou porque sabemos que os objetivos, com a ambição com que são apresentados, raramente se concretizam em Portugal, em tempo útil.

Assim, a Revisão para a Simplificação do PRR, datada de 31 de outubro de 2025, e enviada para aprovação na União Europeia, tem por base a “Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho “NextGenerationEU – Rumo a 2026”, de 4 de junho de 2025, que visava detalhar um conjunto de orientações que pudessem garantir a execução plena do PRR. Estas recomendações apontavam 8 opções para esta reprogramação, sendo que Portugal já teria utilizado, em anteriores reprogramações as primeiras 6 das 8 referidas, a saber: (1) Reforço das medidas existentes; (2) Redução da dotação de empréstimos; (3) Faseamento de projetos do PRR para continuação com fundos nacionais ou outros fundos da União Europeia; (4) Instrumentos financeiros e regimes de subvenção; (5) Transferências para o InvestEU; (6) Injeções de capital em bancos e instituições de fomento nacionais (IBPN); (7) Contribuições para o Programa Europeu para a Indústria da Defesa (EDIP); e (8) Contribuições para os programas comunitários por comunicação de satélite.

Assim, parece evidente que Portugal deveria ter apostado mais nestas duas últimas alternativas. No entanto, o acréscimo de novos investimentos parece já não ser possível, mas tão só uma simplificação do que estava previsto. Acrescentamos que os investimentos nestas áreas, de elevado valor acrescentado, ajudariam Portugal a contribuir para a defesa europeia, com maior incorporação nacional de bens e serviços militares, bem como poderiam colocar Portugal numa posição de maior destaque no desenvolvimento de atividades ligadas às comunicações por satélite. Num país que tem tantos candidatos, e a média mais elevada de entrada no ensino superior, nos cursos de Engenharia Aeroespacial, seria de esperar que fossem aparecendo resultados desse investimento em educação superior de elevado potencial tecnológico e científico, evitando a suspeita de que continuamos a preparar “cérebros” para exportação. O apoio ao empreendedorismo nestas e noutras áreas de valor acrescentado é o que falta em Portugal ou, quando existe, não tem dado os resultados que se esperariam. É neste apoio diferenciado que o Governo deve apostar, fomentando estas e outras áreas nucleares para o nosso desenvolvimento e crescimento económico.

Obviamente, não está em causa a necessidade, apontada nesta proposta, de reduzir o número de Marcos e Metas (M&M) do PRR, bem como de aumentar a ambição em alguns M&M com maior probabilidade de concretização e de reduzir investimentos quando a possibilidade de concretização é menor. Acresce a boa intenção de ampliar o financiamento às empresas, pois estas são capazes de gerar mais riqueza transacionável, promovendo a “reprodução” dos investimentos. Mas quando olhamos a alguns dos objetivos apontados, a experiência diz-nos que temos de temer que não sejam exequíveis no curto e médio prazo, tais como, por exemplo, a construção de 106 novos centros de saúde; a disponibilização de 18.000 lugares de alojamento estudantil a custos acessíveis; a constituição de 278 equipas de intervenção social; a criação de 28.000 lugares em equipamentos sociais para crianças, idosos, pessoas com deficiência e outras pessoas vulneráveis; ou a acreditação ou registo de 200 cursos do ensino superior em CTEAM.

A propósito deste último objetivo, verificamos que existem 121 instituições de ensino superior em Portugal, num contexto em que há um decréscimo do número total de candidatos ao ensino superior, e em que os nossos estudantes apresentam resultados confrangedores em disciplinas nucleares, como são o português e a matemática, o que é verificável na evolução mais recente dos testes PISA. Claro que é importante a aposta nas áreas CTEAM (ciências, tecnologia, engenharia, artes e matemática), mas há áreas não-CTEAM no ensino superior que também são cruciais para o nosso desenvolvimento e bem-estar social, como as áreas de Saúde, Serviços Sociais, Serviços de Transporte, Proteção do Ambiente e Serviços de Segurança. Ter objetivos ambiciosos é bom, mas, mais do que tudo, é preciso apostar na forma de os atingir, isto é, num planeamento realista e exequível, que seja devidamente escrutinado e avaliado. Assim, fazer a acreditação de 200 novos cursos CTEAM, que se supõe acrescentarem valor à enorme oferta de ensino que já existe, parece ser uma ambição bem-intencionada, mas, com certeza, irrealista. Cá estaremos para ver os resultados em dezembro de 2026.

  • João Carvalho
  • Diretor do Departamento de Economia e Gestão da Universidade Portucalense

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