Governo prepara pacote legislativo para reduzir litigância nos impostos

A secretária de Estado dos Assuntos Fiscais reconhece que não vai eliminar a litigância, mas quer fazer "esse caminho de melhoria" com "propostas legislativas".

O Governo vai preparar um conjunto de propostas legislativas para diminuir a litigância fiscal, anunciou esta terça-feira a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais, Cláudia Reis Duarte, durante a conferência “O Futuro do Contencioso Tributário”, organizada em parceria com a Associação Fiscal Portuguesa, onde foram apresentadas as conclusões do relatório da Comissão para a Revisão do Processo e Procedimento Tributário e das Garantias dos Contribuintes, entregue ao Executivo em maio.

Cláudia Reis Duarte reconheceu que não é possível “eliminar a litigância” tributária, mas o Executivo está empenhado em “fazer esse caminho de melhoria”. “Vamos tentar, com todas as medidas que não se esgotam nas alterações à lei — não é só mudar a lei –, mas vamos tentar fazer esse caminho de melhoria”, insistiu, sem entrar em detalhes quanto às propostas que vão ser desenhadas com base nas 90 propostas Comissão para a Revisão do Processo e Procedimento Tributário e das Garantias dos Contribuintes, liderada por Rogério Fernandes Ferreira.

“Nem a Autoridade Tributária nem os tribunais são um caso perdido, nem o legislador é um caso perdido. Todos podemos ter um contributo para a melhoria do sistema”, defendeu.

A governante resumiu que “as propostas estruturadas” que foram apresentadas visam “a simplificação do sistema tributário com destaque para a digitalização, a inteligência artificial (IA) e a automatização”. Alias, sublinhou, “a introdução de ferramentas de IA é uma inevitabilidade com toda as reservas que nos traz”.

Um contencioso eficiente é parte de um ambiente fiscal competitivo, com menor risco de litigância.

Cláudia Reis Duarte

Secretária de Estado dos Assuntos Fiscais

Mas “a simplificação não é um fim m si mesmo é deve servir para uma Justiça mais clara e mais célere, o contribuinte quer e precisa de saber que meios tem ao seu dispor e em que prazos”, continuou. Além disso, defendeu que “um contencioso eficiente é parte de um ambiente fiscal competitivo, com menor risco de litigância” o que ajuda na “atratividade do país”.

As propostas legislativas que agora vão ser trabalhadas representam uma reforma mas “circunstanciada”. “Não se trata de uma rutura, não vamos rasgar o que temos estruturalmente e redesenharmos tudo, porque não é algo que se faça numa legislatura”, argumentou.

“Por isso, a opção aqui é não uma rutura, mas uma reforma circunstanciada que se pretende que seja eficaz e que torne o sistema mais compreensível, mais previsível”, frisou.

O Governo também está a estudar uma forma alternativa para a resolução de litígios fiscais com as empresas, como anunciou na segunda-feira passada o ministro da Reforma do Estado, Gonçalo Matias, durante a apresentação do relatório da Comissão para a Revisão do Processo e Procedimento Tributário e das Garantias dos Contribuintes, no Ministério das Finanças.

“Para uma Justiça mais célebre e sem entraves, o Governo está a estudar, também através deste relatório, o reforço da obrigatoriedade de resolução alternativa de litígios tributários e fiscais. Queremos procurar introduzir uma cultura de colaboração com as empresas e a administração tributária, incentivando consensos e acordos extrajudiciais“, afirmou.

Além disso, o Executivo pretende alargar a arbitragem a litígios com o Fisco acima dos 10 milhões de euros, valor a partir do qual hoje não é possível recorrer a esta forma alternativa de resolução de conflitos judiciais a não ser via tribunal. Este tecto existe desde 2011 e, salvo alguns períodos extraordinários em que foi levantado para descongestionar as instâncias judiciais, tem-se mantido.

Mas o Executivo está a estudar o aumento daquele limiar de vinculação, segundo fonte oficial do Ministério da Reforma do Estado ao ECO, que cita o programa com que o Governo concorreu às eleições legislativas antecipadas de 18 de maio.

Fisco precisa de comunicar “melhor” com contribuintes

Presente na mesma conferência, a diretora da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), Helena Borges, admitiu que o fisco precisa de comunicar “melhor” com os contribuintes para prevenir litígios e evitar a entrada de processos nos tribunais.

“Temos obrigação de informar melhor. O princípio da cooperação, de que se falava aqui, é evidentemente a nossa prioridade. É aí que se deve jogar uma parte significativa desta fricção ou desta aparente indisponibilidade [percionada] da nossa parte”, afirmou Helena Borges.

A diretora-geral da AT reconheceu que, sendo o fisco um dos impulsionadores dos processos de litigância, tem uma parte da responsabilidade pelo número de processos que chegam aos tribunais. Mas sublinhou que a administração fiscal tem feito um esforço nos últimos anos para reduzir o número de diferendos, incluindo com a aposta na celebração de acordos durante a fase de inspeções aos contribuintes.

A diretora-geral referiu que, neste campo, é preciso ter em consideração a dimensão dos recursos das Finanças, que tem menos trabalhadores do que há uma década e novas exigências na frente internacional, cooperando com outras autoridades.

“Gerimos os recursos que temos, e isso é muito importante”, disse. “Nos últimos dez anos, basta ver os processos executivos passaram de cinco milhões para 25 milhões. Temos um conjunto de obrigações na esfera internacional muito significativa, temos uma transformação expressiva do funcionamento do sistema fiscal e temos menos 14% dos recursos que tínhamos há dez anos – são menos 1400 pessoas. Portanto, temos de garantir que temos bem definidas as nossas prioridades”, afirmou ainda.

(Notícia atualizada às 19h55 com declarações da diretora da AT)

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