Rebenta a bolha (da informação)!
Vivemos em bolhas de informação, inconscientemente ou por opção. De forma que sim, o mundo mudou, nós não demos por isso e achamo-nos especialistas em alterações climáticas, em pandemias e na guerra.
O mundo mudou, vai continuar a mudar, mas os humanos, ao que parece, não. São por natureza seletivos a absorver informação e não aparentam ter interesse em ver a dimensão real dos temas. Gostam da sua bolha.
Um ponto de partida que densifica com os media a produzirem crescentemente conteúdo sobre o que vende melhor. Como criticar? O negócio vive tempos difíceis e a transição para o digital trouxe para já poucas alegrias aos gestores. Crises, catástrofes naturais, guerras, terrorismo, acidentes vendem, logo, a grelha está feita.
Um exemplo simples da evolução dos tempos. De acordo com a Pordata, a venda de jornais e de outras publicações periódicas em Portugal – exemplares vendidos – passou de 486 mil em 1999 para 108 mil em 2021. Um decréscimo de 78% que não é de todo compensado pela subida dos meios digitais (segmento informação geral contabilizado pela APCT conta com pouco mais de 100 mil assinaturas digitais ao fecho de 2021).
Acrescentemos o digital. O Tik Tok soma e segue por cá com três milhões de utilizadores e dá cada vez mais cor ao mundo, com mais ou menos doses de realidade.
Todos navegamos informação diariamente, mas vamos cada vez menos à “fonte”.
Cruzei-me recentemente com “Factfulness”, um livro de Hans Rosling sobre factos do mundo. Factos simples que não batiam certo com a minha versão construída da realidade. O livro começa com 13 perguntas que nos deixam confortáveis, mas cujas respostas na generalidade não batem certo com a nossa perceção.
Exemplos onde a maioria se espalha ao comprido:
- A maioria da população mundial vive em países de baixo, médio ou alto rendimento?
- A esperança média de vida é de 50, 60 ou 70 anos?
- 20%, 50% ou 80% da população mundial tem algum acesso a eletricidade?
Como os americanos dizem – e muito bem – “ignorance is a bliss” e dizimar uma dezena de mitos que sempre acarinhei e que contribuíram para a minha sapiência em poucas horas de leitura é levar um banho frio de humildade que felizmente aconteceu, mas para a qual não estava preparado.
Na realidade, não é tão mais confortável, ou até mesmo reconfortante, ler aquela capa de jornal, ver aquele vídeo de YouTube, ou simplesmente acreditar na palavra de quem ao jantar nos conta a verdade? E ficarmo-nos por aí?
Vivemos em bolhas de informação, inconscientemente ou por opção. E desta forma, mesmo que exista informação (factos) disponível, esta não chega ao nosso fluxo de informação diário. De forma que sim, o mundo mudou, nós não demos por isso e achamo-nos especialistas em alterações climáticas, em pandemias e na guerra da Ucrânia.
Não é, portanto, de estranhar o crescente sucesso do populismo, do extremismo, do ativismo, dos defensores de abordagens dicotómicas onde só existem dois lados para uma história e onde um dos lados está sempre errado. É fácil pender para o lado que achamos conhecer melhor, particularmente quando pertencemos a um grupo com menor acesso a educação ou a informação.
Quando uma das grandes tendências de comunicação é a entrega de autenticidade e transparência, ou seja, as bases de uma relação de confiança, a narrativa mais convincente ganha. Não está em causa o rigor, os factos, está sim em disputa a nossa atenção.
Mas boas notícias (não resisti ao trocadilho)! Basta rebentar a bolha, aproveitar o bom jornalismo que existe, sair do conforto, questionar e abraçar este grandioso mundo da informação.
Facto a facto.
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