Aveiro precisa de mais habitação a custos controlados para fixar mão-de-obra
Falta de habitação a custos controlados, escassez de mão-de-obra e formação técnica são os maiores desafios na região de Aveiro, que vale 7,2% das exportações portuguesas de mercadorias.
“O grande desafio da indústria portuguesa e o nosso maior drama — e não é só da minha empresa — é fixar mão-de-obra fabril e formar. E a grande dificuldade não é tanto contratá-los, mas retê-los, pois há um problema gravíssimo de [falta de] habitação a custos controlados que está a afetar a capacidade de fixarmos essas pessoas“. Foi desta forma que Miguel Casal, fundador da Grestel, chamou a atenção para o impacto negativo que o acesso ao mercado residencial está a ter no tecido empresarial aveirense.
A escassez de mão-de-obra, a dificuldade em reter talento e ter pessoas com mais competências foram alertas deixados na conferência ECO Local/Novobanco realizada em Aveiro, repetindo os problemas transversais detetados noutros locais por onde este debate já passou, como Guimarães, Viseu, Faro e Leiria.
A região de Aveiro não é exceção, apesar de representar cerca de 3,6% do PIB nacional, ou seja, cerca 7,75 mil milhões de euros, e a indústria ter um peso superior à média nacional, como destacou o administrador do Novobanco, Luís Ribeiro, num debate moderado pelo diretor do ECO, António Costa. Esta iniciativa está a percorrer o país para analisar a realidade económica e os novos desafios regionais, estando o próximo encontro agendado para dia 16 de junho, no Porto.
No caso de Aveiro, Luís Ribeiro apontou a necessidade de haver “capital humano e conseguir atrair competências e pessoas para o desenvolvimento da região, investimento e produtividade“. Só que existe um entrave à fixação das pessoas e, por consequência, ao desenvolvimento da economia local, que é o difícil acesso ao mercado residencial a custos controlados, segundo os empresários presentes neste debate.
“Queremos continuar a ter indústria competitiva na região. Se não resolvermos o problema da habitação, isto vai ser uma bola de neve”, alertou o fundador da Grestel — recentemente distinguida com o Prémio Inovação em Prevenção. Um problema corroborado por Artur Varum, presidente da construtora Civilria, que retomou um projeto imobiliário de 100 milhões no Nó de Francos, no Porto.
“Não havendo habitação, temos mais dificuldade em captar pessoas, pois não têm onde se instalar”, argumentou o empresário, defendendo menos burocracia nos processos de licenciamento. “Poderia haver mais oferta de habitação se houvesse um sistema de licenciamento ágil. Há muitas exigências que não fazem sentido e a legislação é complexa”, relatou o empresário aveirense.
Poderia haver mais oferta de habitação se houvesse um sistema de licenciamento ágil. Há muitas exigências que não fazem sentido e a legislação é complexa.
Miguel Casal vai mais longe no rol dos entraves ao desenvolvimento do tecido empresarial. “Além da energia, da inflação e dos custos, o grande problema da indústria tradicional é a mão-de-obra. Depois, temos a concorrência de muitas multinacionais, o que está a inflacionar o custo da mão-de-obra; vêm buscar-nos os técnicos médios e isto é um problema grave”, lamentou.
Formação de técnicos é desafio no futuro
Para fundador da Grestel, a “formação de técnicos médios, como eletricistas, vai ser o grande o desafio da indústria no futuro, pois nos dias de hoje não há tanta apetência para trabalhar num ambiente industrial”. Precisamente para não se ver a braços com esse obstáculo, o empresário está a criar uma academia de formação tecnológica. “Tentamos reter as pessoas, dando formação. Por isso, estamos em processo de criação de uma academia e a criar uma bolsa de formadores”, anunciou Miguel Casal.
Ainda assim, o empresário admitiu que é preciso ser uma empresa de dimensão, com escala, para conseguir ter uma academia de formação. “Somos uma indústria tradicional, com mil colaboradores. Crescemos a partir de uma pequena unidade e o drive do nosso crescimento no início foi o mercado americano, quando começámos a exportar”, recordou. O empresário lembrou o arranque com clientes de private label, a que se seguiu o lançamento da própria marca, a Costa Nova, que já representa 50% do volume de negócios.
Em 2017, a Grestel comprou uma empresa nos Estados Unidos da América (EUA), onde mantém a operação de distribuição. “Neste momento, o mercado das marcas representa 54% das vendas e o mercado americano representa cerca de 50% do volume total de negócios”, divulgou o empresário. E destacou a relação com a academia. “A proximidade à Universidade de Aveiro tem sido muito potenciador do nosso sucesso e da fixação de quadros médios e superiores”, sublinhou.
Formar técnicos médios, como eletricista, vai ser o grande o desafio da indústria no futuro, pois nos dias de hoje não há tanta apetência para trabalhar num ambiente industrial.
O administrador do Novobanco referiu, por seu lado, que as empresas têm desafios e oportunidades em mãos. “Estamos numa fase de transição de programas comunitários e é importante as empresas aproveitarem os programas de financiamento que existem”, sustentou. “Estamos no fim do Portugal 2020 — aqui na região foram 4.000 projetos apoiados com o Portugal 2020“, notou.
Luís Ribeiro destacou, por isso, “o desafio de haver uma economia mais sustentável e da digitalização, e de tornar o modelo de negócios mais sustentável”.
Estamos numa fase de transição de programas comunitários e é importante as empresas aproveitarem os programas de financiamento que existem.
Aveiro aposta no turismo cultural
José Pina, assessor cultural do autarca Ribau Esteves, destacou o potencial da cultura na dinamização económica de Aveiro e, por arrasto, o turismo cultural, sobretudo quando a cidade vai ser a Capital Portuguesa da Cultura, em 2024. “Vamos ter um ano marcante, em 2024, não só pela notoriedade que vai trazer ao território de Aveiro, mas também pelo investimento em recursos”. Aliás, reforçou, “Aveiro tem todas as condições para ser uma referência no país de turismo cultural de qualidade e esperamos que o evento seja uma alavancagem para futuro”.
Segundo os dados transmitidos pelo administrador do Novobanco, 65% dos turistas da região de Aveiro são portugueses, 15% são espanhóis e 4% são franceses.
José Pina criticou ainda a falta de investimento na cultura, lamentando que “as políticas públicas, na área do investimento, não olham para a cultura com uma prioridade, mas como um apêndice para se poder chegar a algo mais“. Ainda assim, Aveiro vai ter um “significativo investimento” na cultura. “A dimensão financeira e programática da Capital da Cultura será divulgada em setembro”, referiu.
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